Processo nº 52877289620228090168
Número do Processo:
5287728-96.2022.8.09.0168
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJGO
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Águas Lindas de Goiás - 1ª Vara Cível
Última atualização encontrada em
27 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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27/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Águas Lindas de Goiás - 1ª Vara Cível | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELComarca de Águas Lindas de Goiás1ª Vara CívelNúcleo de Aceleração de Julgamentos e Cumprimento de Metas de 1ª Instância Processo nº.: 5287728-96.2022.8.09.0168Polo Ativo: Lauana Oliveira Strini SilvaPolo Passivo: Banco Crefisa S.A. Crédito Financiamento E InvestimentosNatureza da ação: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento Comum Cível SENTENÇA Tratam-se dos autos de ação de revisão contratual c/c revisão do indébito e danos morais proposta por Lauana Oliveira Strini Silva em face de Crefisa S.A. Crédito, Financiamento e Investimento, ambos qualificados nos autos. A parte autora informa que contratou empréstimo pessoal não consignado junto à requerida (contrato de nº 041820018219), sendo-lhe concedido R$ 10.952,72 (dez mil, novecentos e cinquenta e dois reais e setenta e dois centavos) em 12 (doze) parcelas de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Relata ainda que o contrato apresenta abusividade, com a aplicação de juros acima da média do mercado: 22% a.m. (vinte e dois por cento ao mês) e 987% a.a. (novecentos e oitenta e sete por cento ao ano). Por fim, pleiteia a revisão dos juros com base na média do mercado, inversão do ônus da prova e repetição em dobro do indébito, além de indenização por danos morais. Recebida a inicial, e indeferida a gratuidade de justiça (mov. 09). Concedida a gratuidade de justiça em sede de agravo de instrumento (mov. 12). Contestação na mov. 29, na qual a parte ré alegou, preliminarmente, advocacia predatória, conexão, ausência de interesse de agir, inépcia da inicial, litigância de má fé e impugnou a concessão da gratuidade de justiça. No mérito, requereu a improcedência da ação sob a alegação de legalidade das taxas aplicadas. Réplica na mov. 34. Proferida sentença parcialmente procedente na mov. 41. Ambas as partes interpuseram apelação (mov. 44 e 45) Sentença cassada (mov. 65). Decisão na mov. 100 afastou a preliminar de conexão e intimou as partes para apresentarem suas alegações finais. Ambas as partes apresentares alegações finais (mov. 103 e 104). Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. Partes bem representadas e causa madura para julgamento, nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC. DAS PRELIMINARES Advocacia Predatória No tocante a chamada “advocacia predatória”, que é uma prática que consiste no ajuizamento de ações em massa, através de petições padronizadas, artificiais e recheadas de teses genéricas, em nome de pessoas vulneráveis e com o propósito de enriquecimento ilícito. Antecipo que tal preliminar não merece respaldo. Isso porque não é passível de conhecimento, em sede de preliminares, alegações de prática de advocacia predatória, em razão de ajuizamento de ações, por lote, e com captação de clientes, uma vez que, nesta oportunidade processual, as matérias arguíveis devem corresponder à eventuais existências de irregularidade e/ou nulidades. Nesta senda, impede ressaltar que ilações imputadas ao advogado da parte adversa, em tese, configura infração disciplinar descrita no Estatuto da OAB, dessa forma, deverá ser representada pelo interessado na Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, e eventual dano deverá ser objeto de ação própria. A propósito, colaciono a jurisprudência: “(...) 1. Não incumbe a esta Corte sindicar acerca da conduta do causídico que representa uma das partes, no contexto do alegado ajuizamento de multiplicidade de ações em prática de advocacia predatória, devendo o interessado, se o desejar, questionar a sua conduta, em eventual desacordo com o código de ética, perante a entidade de classe que o representa. 2. (...). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quinta Turma Julgadora de sua Quarta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em CONHECER DA APELAÇÃO CÍVEL, MAS DESPROVÊ-LA, tudo nos termos do voto do Relator.(TJ-GO - AC: 55194422920198090093 JATAÍ, Relator: Des(a). DESEMBARGADOR DELINTRO BELO DE ALMEIDA FILHO, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 28/11/2022) – destaquei. Por essas razões, indefiro o pedido de reconhecimento de advocacia predatória neste feito. Ausência de interesse de agir O interesse de agir subdivide-se em dois elementos: o binômio necessidade e adequação, cuja presença mútua é obrigatória, sob pena de inexistência de interesse. A necessidade diz respeito à razão fundamental pela qual se busca a tutela de direito subjetivo da parte, representado pela hipótese abstrata ou concreta de sua lesão. Sem a tutela do Estado, em outras palavras, o direito da parte correria o risco de perecer, demandando imediata movimentação da jurisdição para protegê-lo. A adequação, por outro lado, diz respeito à via eleita pela parte, por meio da qual se concretizará a necessidade da tutela do direito subjetivo lesado. Se inadequada a via, por equivocada, impossível ou inexistente, carece o peticionante de interesse em acionar a atuação do Estado-juiz. No caso dos autos, verifica-se que a esfera de direitos patrimoniais da autora encontrava-se em risco, na data da propositura da ação, havendo necessidade de intervenção do Estado-Juiz para que cesse a lesão; ainda, a via eleita é adequada, qual seja, a ação cível de rito ordinário. Por fim, não há que se falar em inexistir pretensão resistida, pois, uma vez contestado o feito de maneira a apresentar fatos desconstitutivos, modificativos ou impeditivos do direito da autora, torna-se evidente a existência de resistência, por parte da ré. Sem mais questões preliminares, passo a análise do mérito. Impugnação a concessão da gratuidade de justiça Também não merece prosperar a preliminar arguida com relação à justiça gratuita, visto que o réu não carreou ao feito prova capaz de comprovar suas alegações, ou seja, que o autor detém condições de arcar com as despesas processuais. Assim, a improcedência da impugnação é medida que se impõe. Inépcia da inicial Quanto a preliminar de inépcia da inicial, apesar de a autora ter cumprido em parte a regra do art. 330, § 2º do CPC, não vejo motivo plausível para acolhê-la, pois é impossível a autora saber de antemão qual seria o valor justo que, em tese, seria adequado. Ademais, a petição inicial só deve ser indeferida por inépcia quando o vício verificado apresentar gravidade tal que impossibilite a defesa do réu, ou a própria prestação jurisdicional. Ora, a parte ré contestou de forma específica o pedido inicial e, portanto, não há que falar em inépcia da peça de ingresso, o que implicaria na violação do princípio da inafastabilidade da jurisdição, prevista no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. Sem mais questões preliminares a serem dirimas, passo ao exame do mérito da demanda. DO MÉRITO Verifica-se dos autos que as partes celebraram o contrato de empréstimo pessoal não consignado (contrato de nº 041820018219), no dia 11/11/2019, para ser pago em 12 (doze) parcelas de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Conforme documentação juntada por ambas às partes, a taxa de juros aplicada foi de 22% (vinte e dois por cento) ao mês e 987,22% (novecentos e oitenta e sete, vírgula vinte e dois por cento) ao ano. Percebe-se, de fato, que a taxa de juros prevista no contrato em testilha é abusiva, razão pela qual, neste ponto, a demanda deve ser julgada procedente. Explico. Em contratos de empréstimo pessoal, a taxa de juros pode ser considerada abusiva quando excedem, de forma desproporcional, os padrões médios de mercado, configurando onerosidade excessiva ao consumidor. O Código de Defesa do Consumidor (art. 6º, V) estabelece a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem, sobretudo quando os juros aplicados violam o princípio da boa-fé objetiva e o equilíbrio contratual. A análise de abusividade deve considerar, entre outros fatores, as taxas médias divulgadas pelo Banco Central, além das circunstâncias específicas do contrato e da condição financeira do consumidor. Em relação à comparação com a média de mercado, o STJ, no julgamento do REsp. nº 1.061.530/RS, ponderou que não basta que os juros remuneratórios avençados sejam superiores à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central, faz-se necessário aferir sua efetiva abusividade. Veja-se: “[...] A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos." (REsp nº 1.061.530, Ministra Nancy "DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. INOVAÇÃO RECURSAL. INVIABILIDADE. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO BANCÁRIO. LIMITAÇÃO DE JUROS. SELIC. IMPOSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. TAXA MENSAL. DUODÉCUPLO. TAXA ANUAL. [...] 2. Reconhecida na origem pequena diferença entre a taxa contratada de juros remuneratórios e a taxa média de mercado, a alteração é inviável, nos termos das Súmulas n. 5 e 7/STJ. [...] ( AgInt no REsp 1420977/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 05/10/2017) – [sem destaque no original]. O mesmo entendimento é trazido por este Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO LIMINAR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGULAR CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO RECEBIDA NO ENDEREÇO INFORMADO NO CONTRATO. VALIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. MANTIDOS. TARIFAS DE AVALIAÇÃO E REGISTRO DO CONTRATO. SEGURO PRESTAMISTA. POSSIBILIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO COMPROVADO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA. (...) 4. A abusividade das taxas de juros remuneratórios somente ocorrerá quando o percentual contratado for superior a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da taxa média de mercado. No caso, a taxa de juros aplicada ao contrato não destoa das praticadas pelo mercado, razão pela qual não é abusiva, pelo que deve ser mantida. Precedentes do STJ. 5. (...) APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA MAS DESPROVIDA. (TJGO, Apelação Cível 5190603-13.2022.8.09.0174, Rel. Des (a). DESEMBARGADOR SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, 7a Câmara Cível, julgado em 30/01/2023, DJe de 30/01/2023) – [sem destaque no original] Nesse sentido, ao se verificar que a taxa de juros aplicada supera de maneira desarrazoada a média praticada no mercado, cabe ao Judiciário intervir, readequando os encargos financeiros à realidade econômica vigente e ajustando o contrato às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Assim, evita-se a perpetuação de contratos com cláusulas abusivas, resguardando o equilíbrio e a proporcionalidade nas relações jurídicas. Ademais, a redução dos percentuais fixados a título de juros remuneratórios só é possível quando estes destoarem da Taxa Média de Mercado prevista para o período em operações da mesma espécie, devendo ser aferida considerável dissonância ou desequilíbrio contratual. Isso porque a cláusula não pode ser considerada abusiva apenas por fixar taxas superiores a 12% (doze por cento) ao ano, nos termos da súmula 382 do STJ, dependendo de comprovação inequívoca de abusividade. Assim, de acordo com o contrato firmado entre as partes, da jurisprudência vinculante do STJ e do índice divulgado pelo Banco Central do Brasil, verifica-se que a taxa média de juros das operações de crédito para pessoa física não foi respeitada. Em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais no site do Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub), inserindo-se o código 25464 (referente à “Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado), verifico que a taxa média praticada pelo mercado em novembro de 2019 era de 6,05% (seis, vírgula zero cinco por cento) ao mês. Já, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais no site do Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub), inserindo-se o código 20742 (referente à “Taxa média anual de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado), verifico que a taxa média praticada pelo mercado em novembro de 2019 era 102,31% (cento e dois, vírgula trinta e um por cento) ao ano. Assim, não se verifica que a taxa oferecida pelo autor ao réu está na “média de mercado”. Por todo o exposto, merece ser julgado procedente o pedido de readequação dos juros para média de 6,05% a.m. (seis, vírgula zero cinco por cento ao mês) e 102,31% a.a (cento e dois, vírgula trinta e um por cento ao ano), uma vez que se vislumbra abusividade na forma como contratada. Tendo em vista o pagamento das parcelas com a inclusão de juros abusivos, caberá, à parte ré, a devolução simples ao autor da diferença despendida, acrescido de correção monetária e juros legais, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do CDC. Frisa-se que deixo de determinar a devolução em dobro por ausência de comprovação de má-fé por parte da instituição financeira. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, sabe-se que não é qualquer dissabor que deve ser alçado ao patamar de dano moral, de sorte que este deve ser visto e entendido como uma dor, vexame, sofrimento ou humilhação que fuja à normalidade e interfira intensamente no comportamento psicológico da pessoa, de modo a lhe causar sofrimento, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar e a sua integralidade psíquica. No caso em análise, conquanto evidenciada a falha na prestação do serviço que ocasionou a excessiva onerosidade da modalidade contratual em questão, o requerente não comprovou os alegados danos morais, que no presente caso, não extrapolam o mero dissabor, razão pela qual não faz jus ao recebimento à indenização requerida. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C REPETIÇÃO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RECONHECIMENTO DE COBRANÇA DE ENCARGOS ABUSIVOS. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. MERO ABORRECIMENTO. O reconhecimento da abusividade da contratação não caracteriza, por si só, dano moral ao contratante, porquanto na hipótese em estudo não houve comprovação de ofensa a direitos da sua personalidade. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. (TJGO, Apelação Cível 5430595- 31.2021.8.09.0174, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITAMAR DE LIMA, 3ª Câmara Cível, julgado em 21/09/2022, DJe de 21/09/2022)” Desta forma, concluo existir fundamento à ação proposta, razão pela qual os pedidos iniciais hão de ser julgados parcialmente procedentes. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, I, e CONDENO a ré na repetição simples do valor pago pelo autor em razão dos juros abusivos, os quais deverão ser readequados para 6,05% (seis, vírgula zero cinco por cento) ao mês e 102,31% (cento e dois, vírgula trinta e um por cento) ao ano, nos termos do parágrafo único do artigo 42, CDC. O valor a ser pago deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de juros legais fixados no patamar legal de 1% a.m., (um por cento ao mês) limitados a 12% (doze por cento) ao ano (art. 405, Código Civil). Tendo em vista o julgamento parcialmente procedente, entendo pela sucumbência recíproca sobre encargos e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, devidamente atualizado (Art. 85 e 85 do CPC). No entanto, distribuo o ônus em 90% à parte ré, considerando que sucumbiu em maior parte, restando 10% à parte autora, todavia, sobrestada a cobrança em razão da gratuidade de justiça, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, Intimem-se. Cumpra-se. Águas Lindas/GO, datado e assinado digitalmente. ANDRÉ REIS LACERDAJuiz de Direito em Auxílio NAJDecreto n.º 2.645/2025
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27/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Águas Lindas de Goiás - 1ª Vara Cível | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELComarca de Águas Lindas de Goiás1ª Vara CívelNúcleo de Aceleração de Julgamentos e Cumprimento de Metas de 1ª Instância Processo nº.: 5287728-96.2022.8.09.0168Polo Ativo: Lauana Oliveira Strini SilvaPolo Passivo: Banco Crefisa S.A. Crédito Financiamento E InvestimentosNatureza da ação: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento Comum Cível SENTENÇA Tratam-se dos autos de ação de revisão contratual c/c revisão do indébito e danos morais proposta por Lauana Oliveira Strini Silva em face de Crefisa S.A. Crédito, Financiamento e Investimento, ambos qualificados nos autos. A parte autora informa que contratou empréstimo pessoal não consignado junto à requerida (contrato de nº 041820018219), sendo-lhe concedido R$ 10.952,72 (dez mil, novecentos e cinquenta e dois reais e setenta e dois centavos) em 12 (doze) parcelas de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Relata ainda que o contrato apresenta abusividade, com a aplicação de juros acima da média do mercado: 22% a.m. (vinte e dois por cento ao mês) e 987% a.a. (novecentos e oitenta e sete por cento ao ano). Por fim, pleiteia a revisão dos juros com base na média do mercado, inversão do ônus da prova e repetição em dobro do indébito, além de indenização por danos morais. Recebida a inicial, e indeferida a gratuidade de justiça (mov. 09). Concedida a gratuidade de justiça em sede de agravo de instrumento (mov. 12). Contestação na mov. 29, na qual a parte ré alegou, preliminarmente, advocacia predatória, conexão, ausência de interesse de agir, inépcia da inicial, litigância de má fé e impugnou a concessão da gratuidade de justiça. No mérito, requereu a improcedência da ação sob a alegação de legalidade das taxas aplicadas. Réplica na mov. 34. Proferida sentença parcialmente procedente na mov. 41. Ambas as partes interpuseram apelação (mov. 44 e 45) Sentença cassada (mov. 65). Decisão na mov. 100 afastou a preliminar de conexão e intimou as partes para apresentarem suas alegações finais. Ambas as partes apresentares alegações finais (mov. 103 e 104). Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. Partes bem representadas e causa madura para julgamento, nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC. DAS PRELIMINARES Advocacia Predatória No tocante a chamada “advocacia predatória”, que é uma prática que consiste no ajuizamento de ações em massa, através de petições padronizadas, artificiais e recheadas de teses genéricas, em nome de pessoas vulneráveis e com o propósito de enriquecimento ilícito. Antecipo que tal preliminar não merece respaldo. Isso porque não é passível de conhecimento, em sede de preliminares, alegações de prática de advocacia predatória, em razão de ajuizamento de ações, por lote, e com captação de clientes, uma vez que, nesta oportunidade processual, as matérias arguíveis devem corresponder à eventuais existências de irregularidade e/ou nulidades. Nesta senda, impede ressaltar que ilações imputadas ao advogado da parte adversa, em tese, configura infração disciplinar descrita no Estatuto da OAB, dessa forma, deverá ser representada pelo interessado na Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, e eventual dano deverá ser objeto de ação própria. A propósito, colaciono a jurisprudência: “(...) 1. Não incumbe a esta Corte sindicar acerca da conduta do causídico que representa uma das partes, no contexto do alegado ajuizamento de multiplicidade de ações em prática de advocacia predatória, devendo o interessado, se o desejar, questionar a sua conduta, em eventual desacordo com o código de ética, perante a entidade de classe que o representa. 2. (...). APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. Acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, pela Quinta Turma Julgadora de sua Quarta Câmara Cível, à unanimidade de votos, em CONHECER DA APELAÇÃO CÍVEL, MAS DESPROVÊ-LA, tudo nos termos do voto do Relator.(TJ-GO - AC: 55194422920198090093 JATAÍ, Relator: Des(a). DESEMBARGADOR DELINTRO BELO DE ALMEIDA FILHO, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 28/11/2022) – destaquei. Por essas razões, indefiro o pedido de reconhecimento de advocacia predatória neste feito. Ausência de interesse de agir O interesse de agir subdivide-se em dois elementos: o binômio necessidade e adequação, cuja presença mútua é obrigatória, sob pena de inexistência de interesse. A necessidade diz respeito à razão fundamental pela qual se busca a tutela de direito subjetivo da parte, representado pela hipótese abstrata ou concreta de sua lesão. Sem a tutela do Estado, em outras palavras, o direito da parte correria o risco de perecer, demandando imediata movimentação da jurisdição para protegê-lo. A adequação, por outro lado, diz respeito à via eleita pela parte, por meio da qual se concretizará a necessidade da tutela do direito subjetivo lesado. Se inadequada a via, por equivocada, impossível ou inexistente, carece o peticionante de interesse em acionar a atuação do Estado-juiz. No caso dos autos, verifica-se que a esfera de direitos patrimoniais da autora encontrava-se em risco, na data da propositura da ação, havendo necessidade de intervenção do Estado-Juiz para que cesse a lesão; ainda, a via eleita é adequada, qual seja, a ação cível de rito ordinário. Por fim, não há que se falar em inexistir pretensão resistida, pois, uma vez contestado o feito de maneira a apresentar fatos desconstitutivos, modificativos ou impeditivos do direito da autora, torna-se evidente a existência de resistência, por parte da ré. Sem mais questões preliminares, passo a análise do mérito. Impugnação a concessão da gratuidade de justiça Também não merece prosperar a preliminar arguida com relação à justiça gratuita, visto que o réu não carreou ao feito prova capaz de comprovar suas alegações, ou seja, que o autor detém condições de arcar com as despesas processuais. Assim, a improcedência da impugnação é medida que se impõe. Inépcia da inicial Quanto a preliminar de inépcia da inicial, apesar de a autora ter cumprido em parte a regra do art. 330, § 2º do CPC, não vejo motivo plausível para acolhê-la, pois é impossível a autora saber de antemão qual seria o valor justo que, em tese, seria adequado. Ademais, a petição inicial só deve ser indeferida por inépcia quando o vício verificado apresentar gravidade tal que impossibilite a defesa do réu, ou a própria prestação jurisdicional. Ora, a parte ré contestou de forma específica o pedido inicial e, portanto, não há que falar em inépcia da peça de ingresso, o que implicaria na violação do princípio da inafastabilidade da jurisdição, prevista no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. Sem mais questões preliminares a serem dirimas, passo ao exame do mérito da demanda. DO MÉRITO Verifica-se dos autos que as partes celebraram o contrato de empréstimo pessoal não consignado (contrato de nº 041820018219), no dia 11/11/2019, para ser pago em 12 (doze) parcelas de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais). Conforme documentação juntada por ambas às partes, a taxa de juros aplicada foi de 22% (vinte e dois por cento) ao mês e 987,22% (novecentos e oitenta e sete, vírgula vinte e dois por cento) ao ano. Percebe-se, de fato, que a taxa de juros prevista no contrato em testilha é abusiva, razão pela qual, neste ponto, a demanda deve ser julgada procedente. Explico. Em contratos de empréstimo pessoal, a taxa de juros pode ser considerada abusiva quando excedem, de forma desproporcional, os padrões médios de mercado, configurando onerosidade excessiva ao consumidor. O Código de Defesa do Consumidor (art. 6º, V) estabelece a possibilidade de revisão de cláusulas contratuais que coloquem o consumidor em desvantagem, sobretudo quando os juros aplicados violam o princípio da boa-fé objetiva e o equilíbrio contratual. A análise de abusividade deve considerar, entre outros fatores, as taxas médias divulgadas pelo Banco Central, além das circunstâncias específicas do contrato e da condição financeira do consumidor. Em relação à comparação com a média de mercado, o STJ, no julgamento do REsp. nº 1.061.530/RS, ponderou que não basta que os juros remuneratórios avençados sejam superiores à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central, faz-se necessário aferir sua efetiva abusividade. Veja-se: “[...] A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos." (REsp nº 1.061.530, Ministra Nancy "DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. INOVAÇÃO RECURSAL. INVIABILIDADE. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO BANCÁRIO. LIMITAÇÃO DE JUROS. SELIC. IMPOSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. TAXA MENSAL. DUODÉCUPLO. TAXA ANUAL. [...] 2. Reconhecida na origem pequena diferença entre a taxa contratada de juros remuneratórios e a taxa média de mercado, a alteração é inviável, nos termos das Súmulas n. 5 e 7/STJ. [...] ( AgInt no REsp 1420977/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/09/2017, DJe 05/10/2017) – [sem destaque no original]. O mesmo entendimento é trazido por este Tribunal de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO COM PEDIDO LIMINAR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGULAR CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO RECEBIDA NO ENDEREÇO INFORMADO NO CONTRATO. VALIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. MANTIDOS. TARIFAS DE AVALIAÇÃO E REGISTRO DO CONTRATO. SEGURO PRESTAMISTA. POSSIBILIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. NÃO COMPROVADO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS. SENTENÇA MANTIDA. (...) 4. A abusividade das taxas de juros remuneratórios somente ocorrerá quando o percentual contratado for superior a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da taxa média de mercado. No caso, a taxa de juros aplicada ao contrato não destoa das praticadas pelo mercado, razão pela qual não é abusiva, pelo que deve ser mantida. Precedentes do STJ. 5. (...) APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA MAS DESPROVIDA. (TJGO, Apelação Cível 5190603-13.2022.8.09.0174, Rel. Des (a). DESEMBARGADOR SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, 7a Câmara Cível, julgado em 30/01/2023, DJe de 30/01/2023) – [sem destaque no original] Nesse sentido, ao se verificar que a taxa de juros aplicada supera de maneira desarrazoada a média praticada no mercado, cabe ao Judiciário intervir, readequando os encargos financeiros à realidade econômica vigente e ajustando o contrato às disposições do Código de Defesa do Consumidor. Assim, evita-se a perpetuação de contratos com cláusulas abusivas, resguardando o equilíbrio e a proporcionalidade nas relações jurídicas. Ademais, a redução dos percentuais fixados a título de juros remuneratórios só é possível quando estes destoarem da Taxa Média de Mercado prevista para o período em operações da mesma espécie, devendo ser aferida considerável dissonância ou desequilíbrio contratual. Isso porque a cláusula não pode ser considerada abusiva apenas por fixar taxas superiores a 12% (doze por cento) ao ano, nos termos da súmula 382 do STJ, dependendo de comprovação inequívoca de abusividade. Assim, de acordo com o contrato firmado entre as partes, da jurisprudência vinculante do STJ e do índice divulgado pelo Banco Central do Brasil, verifica-se que a taxa média de juros das operações de crédito para pessoa física não foi respeitada. Em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais no site do Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub), inserindo-se o código 25464 (referente à “Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado), verifico que a taxa média praticada pelo mercado em novembro de 2019 era de 6,05% (seis, vírgula zero cinco por cento) ao mês. Já, em consulta ao Sistema Gerenciador de Séries Temporais no site do Banco Central do Brasil (https://www3.bcb.gov.br/sgspub), inserindo-se o código 20742 (referente à “Taxa média anual de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado), verifico que a taxa média praticada pelo mercado em novembro de 2019 era 102,31% (cento e dois, vírgula trinta e um por cento) ao ano. Assim, não se verifica que a taxa oferecida pelo autor ao réu está na “média de mercado”. Por todo o exposto, merece ser julgado procedente o pedido de readequação dos juros para média de 6,05% a.m. (seis, vírgula zero cinco por cento ao mês) e 102,31% a.a (cento e dois, vírgula trinta e um por cento ao ano), uma vez que se vislumbra abusividade na forma como contratada. Tendo em vista o pagamento das parcelas com a inclusão de juros abusivos, caberá, à parte ré, a devolução simples ao autor da diferença despendida, acrescido de correção monetária e juros legais, nos termos do artigo 42, parágrafo único, do CDC. Frisa-se que deixo de determinar a devolução em dobro por ausência de comprovação de má-fé por parte da instituição financeira. Quanto ao pedido de indenização por danos morais, sabe-se que não é qualquer dissabor que deve ser alçado ao patamar de dano moral, de sorte que este deve ser visto e entendido como uma dor, vexame, sofrimento ou humilhação que fuja à normalidade e interfira intensamente no comportamento psicológico da pessoa, de modo a lhe causar sofrimento, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar e a sua integralidade psíquica. No caso em análise, conquanto evidenciada a falha na prestação do serviço que ocasionou a excessiva onerosidade da modalidade contratual em questão, o requerente não comprovou os alegados danos morais, que no presente caso, não extrapolam o mero dissabor, razão pela qual não faz jus ao recebimento à indenização requerida. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL C/C REPETIÇÃO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RECONHECIMENTO DE COBRANÇA DE ENCARGOS ABUSIVOS. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. MERO ABORRECIMENTO. O reconhecimento da abusividade da contratação não caracteriza, por si só, dano moral ao contratante, porquanto na hipótese em estudo não houve comprovação de ofensa a direitos da sua personalidade. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. (TJGO, Apelação Cível 5430595- 31.2021.8.09.0174, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITAMAR DE LIMA, 3ª Câmara Cível, julgado em 21/09/2022, DJe de 21/09/2022)” Desta forma, concluo existir fundamento à ação proposta, razão pela qual os pedidos iniciais hão de ser julgados parcialmente procedentes. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, resolvendo o mérito nos termos do art. 487, I, e CONDENO a ré na repetição simples do valor pago pelo autor em razão dos juros abusivos, os quais deverão ser readequados para 6,05% (seis, vírgula zero cinco por cento) ao mês e 102,31% (cento e dois, vírgula trinta e um por cento) ao ano, nos termos do parágrafo único do artigo 42, CDC. O valor a ser pago deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de juros legais fixados no patamar legal de 1% a.m., (um por cento ao mês) limitados a 12% (doze por cento) ao ano (art. 405, Código Civil). Tendo em vista o julgamento parcialmente procedente, entendo pela sucumbência recíproca sobre encargos e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, devidamente atualizado (Art. 85 e 85 do CPC). No entanto, distribuo o ônus em 90% à parte ré, considerando que sucumbiu em maior parte, restando 10% à parte autora, todavia, sobrestada a cobrança em razão da gratuidade de justiça, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, Intimem-se. Cumpra-se. Águas Lindas/GO, datado e assinado digitalmente. ANDRÉ REIS LACERDAJuiz de Direito em Auxílio NAJDecreto n.º 2.645/2025