Trata-se de recurso de apelação cível interposto por VILMAR DA SILVA contra sentença de improcedência (Evento 25) prolatada na denominada "AÇÃO VISANDO A CONVERSÃO DE OPERAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PADRÃO C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA", ajuizada em desfavor de BANCO PAN S.A.
Em suas razões recursais (Evento 29), requer, em síntese, a nulidade do contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), asseverando que "a parte apelada não trouxe o contrato questionado aos autos, ônus probatório que lhe cabia à fim de confirmar anuência sobre as supostas condições acordadas". Acrescenta que, "além das amplas irregularidades no que tange à autenticidade do aceite e anuência acerca das condições do cartão de crédito referido, reforça-se ainda mais a inautenticidade de celebração e subsequente recebimento e uso do cartão, o fato de que a apelada deixou de aportar quaisquer comprobatórias de que o autor teria o recebido". Diz que o pedido da demandante para conversão da operação em empréstimo consignado padrão é viável, em razão da limitação do INSS e da Resolução nº 1.363/2024. Pretende, ainda, a "devolução em dobro dos valores descontados indevidamente (art. 42, parágrafo único, do CDC), observada a compensação com eventual saldo devedor comprovadamente existente", bem como "a condenação da apelada ao pagamento das custas recursais e honorários advocatícios de sucumbência".
Apresentadas as contrarrazões (Evento 33), os autos ascenderam a esta Instância.
É o relato do essencial.
O recurso comporta julgamento monocrático, nos termos do art. 932, VIII, do Código de Processo Civil, cumulado com o art. 132, XV, do Regimento Interno deste Sodalício. Deste modo, despicienda sua submissão ao Órgão Colegiado, pois trata de temática cujo entendimento é pacificado neste Tribunal de Justiça.
Isso posto, passo ao exame do mérito recursal no qual o autor requer a reforma integral da sentença de improcedência.
Pois bem. Durante o curso do processado, o autor defende a nulidade da contratação celebrada com a ré, por vício de consentimento, sustentando não ter procurado o banco para adquirir contrato de cartão de crédito com “reserva de cartão consignado”, mas "empréstimo consignado padrão".
Conforme tem se manifestado esta Corte de Justiça, "a contratação de cartão consignado de benefício e a averbação da reserva de cartão consignado possuem expressa autorização legal, conforme previsão contida no art. 115, VI, da Lei n. 8.213/1991 (com redação dada pela Lei n. 14.431/2022), no art. 6º, caput e § 5º, da Lei n. 10.820/2003 (para aposentados e pensionistas do INSS) e no art. 97, da Lei n. 6.745/1985, regulamentada pelo Decreto n. 781/2020 (para aposentados e pensionistas do regime próprio de previdência do Estado de Santa Catarina). Assim sendo, a modalidade contratada, por si só, não se mostra irregular ou abusiva, desde que expressamente autorizada pelo beneficiário com uso de reconhecimento biométrico, nos termos do art. 5º, III, da Instrução Normativa n. 138/2022 do INSS. Embora o saque de valores por meio de cartão consignado de benefício possua singularidades com a operação de empréstimo consignado, tais como a disponibilização de valores em conta e os descontos em folha de pagamento, as modalidades não se confundem, sobretudo após a ampla difusão de ambas entre os pensionistas e aposentados. Enquanto no empréstimo consignado os descontos correspondem ao valor das parcelas fixas previamente pactuadas, no contrato de cartão consignado de benefício é estipulada a porcentagem da reserva de cartão consignado (máxima de 5% - art. 5º, V, "c", da IN 138/2022 do INSS) e os descontos consistem apenas no valor mínimo da fatura, de modo que podem sofrer modificações ao longo da vigência contratual. Todavia, a forma de liquidação e a incidência de encargos diferentes não tornam a disponibilização de valores por meio de cartão consignado de benefício, por si só, excessivamente onerosa aos consumidores" (TJSC, Apelação n. 5046317-48.2023.8.24.0930, rel. Silvio Franco, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 08-10-2024).
Sob essa ótica, o cartão consignado de benefício (RCC), tal qual o cartão de crédito consignado (RMC), surgiu para aumentar as possibilidades de crédito perante os bancos, especialmente quando considerados os limites de consignações para cada modalidade.
No caso dos autos, da análise das circunstâncias em que a contratação foi efetivada, é possível rechaçar a narrativa do demandante, no sentido de que pretendia firmar o denominado "empréstimo consignado" puro e simples, com parcelas fixas e preestabelecidas, vindo, entretanto, tempos depois, a saber, que contraíra outra modalidade contratual, via reserva de margem consignável, culminando na incidência de juros extorsivos a ponto de impossibilitar o pagamento do débito.
Isso porque, analisando o caderno processual, verifica-se ter a instituição financeira demandada colacionado "Termo de Adesão ao Regulamento de Cartão de Crédito, Cartão de Crédito Consignado PAN e Cartão Benefício Consignado PAN" n. 758425505 datado de 12/07/2022, acompanhado do respetivo "Termo de Consentimento Esclarecido do Cartão Benefício Consignado PAN" e da "Solicitação de Saque via Cartão de Benefício Consignado PAN (Transferência de Recursos)" (Evento 20, ANEXO2, p. 2/20).
O teor das minutas de Evento 20, ANEXO2, esclarece acerca das especificidades da contratação, além de estarem assinados pelo acionante por meio eletrônico (p. 1, 21 e 22), com biometria facial, ID da sessão usuário, geolocalização, e apresentação de documento pessoal, além da juntada de Dossiê de Contratação, cuja possibilidade é prevista pelo art. 3º, III, da IN, do INSS/PRES Nº 28/2008.
Lembra-se que o denominado "Termo de Consentimento Esclarecido do Cartão de Crédito Consignado", no qual contem figura exemplificativa da tarjeta magnética (Evento 20, ANEXO2, p. 8/9), atende à Instrução Normativa n. 100/2018 do INSS, na qual fora determinada, em casos como o dos autos, a obrigatoriedade de inclusão do respectivo termo, a fim de que o consumidor fosse efetivamente cientificado acerca das características e particularidades do contrato ajustado entre os litigantes.
Destaca-se que não há amparo na alegação do apelante de que "a parte apelada não trouxe o contrato questionado aos autos", porque a proposta n. 758425505 colacionada pelo banco é exatamente a mesma constante do denominado "Histórico de empréstimo consignado" juntado pelo autor:
Ainda, a Instrução Normativa INSS/PRES n. 28/2008 possibilita a contratação de modalidade ajustado com a finalidade de saque, de modo que a não utilização do cartão para compras não invalida a operação.
Diante dos elementos de convicção exibidos nos autos, este Sodalício tem se manifestado o hipossuficiente recebeu informações claras e adequadas a respeito da modalidade contratual entabulada, a afastar as teses autorais de vício de consentimento e ilegalidade da avença.
Nesse sentido, extrai-se da jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. RESERVA DE CARTÃO CONSIGNADO (RCC). IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO DA PARTE AUTORA. MÉRITO. ALEGAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO NA PACTUAÇÃO, PORQUANTO ALMEJAVA UM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO AO INVÉS DE UM CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO. AFERIÇÃO DESTE DEFEITO COM BASE NA ANÁLISE DO EXTRATO MENSAL DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO E DA MARGEM DISPONÍVEL INCABÍVEL. ENTENDIMENTO SUPERADO. EXEGESE DOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA COLEGIALIDADE. PACTUAÇÃO DE MÚTUO BANCÁRIO INCONTROVERSA. PROVA DOCUMENTAL QUE COMPROVA A ADESÃO À MODALIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO. VÍCIO DE CONSENTIMENTO E/OU FALTA DE INFORMAÇÃO PARA GERAR DEFEITO NO NEGÓCIO JURÍDICO AUSENTES. FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO DA PARTE AUTORA. EXEGESE DO ARTIGO 373, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, NA FORMA DO ARTIGO 6º, INCISO VIII, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, QUE NÃO DISPENSAM A PARTE AUTORA DE DEMONSTRAR O FATO CONSTITUTIVO DE SEU DIREITO. CONTRATO ACOSTADO AO PROCESSO. ANUÊNCIA DA PARTE AUTORA PRESENTE. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER MÁCULA APTA A INVALIDAR O NEGÓCIO JURÍDICO. DANO MORAL. LICITUDE DA CONDUTA DA CASA BANCÁRIA RECONHECIDA. INCONFORMISMO COM OS TERMOS DO PACTO QUE ADERIU QUE, POR SI SÓ, NÃO PRESTAM PARA CARACTERIZAR UM ABALO MORAL INDENIZÁVEL, TRATANDO-SE DE MERO DISSABOR. INDENIZAÇÃO AFASTADA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PEDIDO INCABÍVEL. PACTO VÁLIDO E LÍCITO. SENTENÇA MANTIDA. SUCUMBÊNCIA INALTERADA. HONORÁRIOS RECURSAIS (ART. 85, § 11, CPC). CRITÉRIOS CUMULATIVOS ATENDIDOS (STJ, EDCL NO AGINT NO RESP 1.573.573/RJ). MAJORAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5096745-97.2024.8.24.0930, rel. Guilherme Nunes Born, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 22-05-2025)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CARTÃO DE CRÉDITO (RMC). SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. PRETENSÃO DE NULIDADE DO CONTRATO E RESTITUIÇÃO DOS VALORES COBRADOS, EM DOBRO. APELO NÃO ACOLHIDO. CONTRATO DEVIDAMENTE ASSINADO. MENÇÃO EXPRESSA AO CARTÃO DE CRÉDITO (RMC). CONTRATO QUE EXPLICITOU A MODALIDADE PACTUADA E PRESTOU TODAS AS INFORMAÇÕES DESCRITAS PELOS ARTIGOS 6º E 39 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CLIENTE QUE ESTAVA CIENTE DA MODALIDADE CONTRATADA. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS DEVIDOS. MAJORAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5063108-58.2024.8.24.0930, rel. Stephan K. Radloff, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 10-06-2025)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE NULIDADE CONTRATUAL CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO DE CARTÃO CONSIGNADO DE BENEFÍCIO (RCC). DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA RECURSAL DA AUTORA. DEFENDIDA A IRREGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO POR TER PRETENDIDO OUTRA MODALIDADE DE CONTRATO (EMPRÉSTIMO CONVENCIONAL). NÃO ACOLHIMENTO. ASSERTIVA DESPROVIDA DE COMPROVAÇÃO. ÔNUS QUE INCUMBIA À REQUERENTE A TEOR DO ART. 373, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CONTRATAÇÃO REALIZADA POR MEIO ELETRÔNICO, CONFIRMADA MEDIANTE RECONHECIMENTO BIOMÉTRICO (CAPTURA DA SELFIE E O ENVIO DE FOTOGRAFIA DO DOCUMENTO DE IDENTIFICAÇÃO). DISPENSABILIDADE DE ASSINATURA E CONTRATO FÍSICO. PRINCÍPIO DA LIBERDADE DAS FORMAS. INTELIGÊNCIA DO ART. 107 DO CÓDIGO CIVIL. VALIDADE DO CONTRATO ELETRÔNICO. INSTRUMENTO CONTRATUAL QUE DEMONSTRA A AUTORIZAÇÃO DA AUTORA PARA QUE DEDUÇÕES FOSSEM REALIZADAS EM SUA FOLHA DE PAGAMENTO. ANUÊNCIA EXPLÍCITA. TERMO DE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO (TEC) EXIBIDO NA DEFESA. CIRCUNSTÂNCIAS QUE DEMONSTRAM A CIÊNCIA DA CONSUMIDORA ACERCA DA MODALIDADE DO AJUSTE PRINCIPAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DIREITO DE INFORMAÇÃO E À BOA-FÉ OBJETIVA. IRRELEVÂNCIA DA UTILIZAÇÃO OU NÃO DO CARTÃO CONSIGNADO DE BENEFÍCIO PARA OUTROS FINS QUE NÃO O SAQUE DE VALOR. IRREGULARIDADE DA PACTUAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. AUSÊNCIA DE VALORES A SEREM DEVOLVIDOS. SENTENÇA PRESERVADA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5083775-65.2024.8.24.0930, rel. Luiz Felipe Schuch, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 24-04-2025)
Com essas considerações, mantem-se a sentença de improcedência, motivo pelo qual queda prejudicado o exame das demais insurgências do apelo.
Por fim, relativamente aos honorários recursais, cumpre destacar que este Órgão Colegiado acompanha o entendimento externado pelo Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Declaração no Agravo Interno no Recurso Especial de n. 1.573.573/RJ, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, cujo julgamento se deu em 04-04-2017.
No caso concreto, desprovida a insurgência, mostra-se viável a majoração dos honorários advocatícios sucumbenciais fixados em favor do procurador da parte recorrida, nos termos deliberados pelo Superior Tribunal de Justiça, de modo que, mantido o parâmetro adotado pela sentença, eleva-se o estipêndio patronal em 2% (dois por cento). Suspende-se, todavia, a exigibilidade da verba nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Ritos (Evento 4).
Ante o exposto, com fulcro no art. 932, VIII, do Código de Processo Civil, c/c art. 132, XV, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, nega-se provimento ao recurso e majora-se os honorários advocatícios sucumbenciais em 2% (dois por cento), suspendendo, contudo, a exigibilidade diante da concessão da gratuidade da justiça.