APELANTE | : BANCO AGIBANK S.A (RÉU) |
ADVOGADO(A) | : DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA (OAB SC051063) |
APELADO | : JUREMA DE FATIMA MIGUEL MARTINS (AUTOR) |
ADVOGADO(A) | : DIEGO ARTHUR IGARASHI SANCHEZ (OAB PR092543) |
DESPACHO/DECISÃO
BANCO AGIBANK S/A interpôs APELAÇÃO contra a sentença proferida nos autos da ação revisional, que tramitou no Juízo de Direito da Unidade Estadual de Direito Bancário, na qual foi julgado procedente, em parte, o intento autoral, com a ordem para descaracterização da mora, redução dos juros remuneratórios à média de mercado, bem como a condenação do réu na repetição simples do que foi pago em excesso.
Defendeu que a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil não pode ser utilizada como único parâmetro para aferição de abusividades. Por isso, com apego no brocardo jurídico pacta sunt servanda, asseverou que os juros remuneratórios não comportam revisão porque, além de terem sido expressamente aceitos, não revelam abusividade diante do perfil de alto risco da contratante. Aduziu que a taxa moratória e a capitalização de juros não comportam modificação. Pleiteou a imposição de multa por litigância de má-fé, alegou que não cabe a devolução do que já foi pago e, ao fim, postulou o prequestionamento da matéria para fins de interposição de Recurso Especial.
Após apresentadas as contrarrazões, os autos ascenderam a esta Corte de Justiça.
1. "O interesse recursal, enquanto pressuposto formal de admissibilidade, representa, em um de seus desdobramentos, a necessidade de que a interposição do recurso tenha por finalidade reverter situação desfavorável produzida pelo decisum contra o qual se dirige. Ao deduzir em seu recurso questões que já foram resolvidas no juízo de origem, o apelante acaba por violar o pressuposto recursal do interesse, já que, neste ponto, a interposição do presente recurso de apelação não busca reverter situação desfavorável que decorra do julgado" (STF – Agravo em Recurso Extraordinário nº 1363122/DF, rel. Min. Luiz Fux, j. em 01.02.2022).
No veredito objurgado, nada foi dito acerca da taxa moratória, tampouco sobre a capitalização de juros, o que, aliás, sequer foi mencionado na exordial. Logo, nesse ponto, falta motivo para a insurreição da instituição financeira.
2. Pelo princípio da autonomia da vontade, os capazes podem contratar sem amarras. Entretanto, tal princípio não é aplicável indistintamente, de modo que deve-se atentar para os limites da ordem pública e da função social do contrato (CC, art. 421). De igual modo, o pacta sunt servanda, mandamento jurídico que preconiza que o acordo de vontades faz lei entre as partes, também deve ser flexibilizado a fim de inibir-se a estipulação de cláusulas que porventura desequilibrem a relação contratual, pondo o consumidor em desvantagem exagerada (CDC, art. 51, inc. IV) ou, ainda, que tornem a obrigação excessivamente onerosa para o contratante (CDC, art. 51, § 1º, inc. III) (nesse sentido: TJSP – Apelação Cível nº 1002044-39.2022.8.26.0572, de São Joaquim da Barras, Trigésima Sétima Câmara de Direito Privado, unânime, rel. Des. Sérgio Gomes, j. em 9.1.2023).
Essa linha de raciocínio ganha força na medida em que se notam disposições contratuais que vão de encontro a normas de ordem pública e de interesse social, como as previstas no Código de Defesa do Consumidor (CDC, art. 1º), as quais são inderrogáveis ainda que essa fosse a vontade dos interessados (José Geraldo Brito Filomeno, "Direitos do Consumidor", 15ª ed., São Paulo: Atlas, 2018, pág. 13).
Indo direto ao ponto, é possível, de forma excepcional, a revisão da taxa de juros remuneratórios posta em contratos de mútuo – sobre os quais incidirão as regras emanadas da legislação consumerista – desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, ou seja, quando o consumidor for posto em desvantagem exagerada (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.920.112/PR, Terceira Turma, unânime, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21.2.2022).
Jurema de Fátima Miguel Martins entabulou contrato de empréstimo pessoal com Banco Agibank S/A e, acoimando de abusivos os juros remuneratórios estipulados, busca a revisão do pacto e a mitigação da respectiva taxa.
Sabe-se que "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (STJ – Súmula nº 382) e que a taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil representa mero referencial para a constatação de excessividades. É somente perante as particularidades iridescentes do caso concreto que a onerosidade do percentual compensatório poderá ser apurada. Para isso, levar-se-á em consideração circunstâncias, tais qual "o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ – Recurso Especial nº 1.821.182/RS, Quarta Turma, unânime, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, j. em 29.6.2022).
Desvela-se do instrumento contratual sacramentado entre Jurema e Agibank que os juros remuneratórios pactuados destoam significativamente da contemporânea média de mercado e, ainda que tenha tido oportunidade para fazê-lo, a instituição financeira não comprovou que a anabolização dos compensatórios foi pautada em concretas condições desfavoráveis para a concessão do crédito. Na verdade, a narrativa ventilada pelo réu é genérica, abstrata, e, por isso, não tem o condão de justificar a incidência de taxas elevadas.
Eis a discrepância identificada:
Contrato | Data | Juros pactuados | Média de mercado | Série Bacen |
1252389654 (Evento 1, CONTR6) | 8.8.2023 | 9,49% a.m e 201,34% a.a | 5,61% a.m e 92,60% a.a | 25464 e 20742 - Crédito pessoal não consignado |
Diante da nítida onerosidade excessiva a que a consumidora foi exposta no referido contrato, as taxas de juros remuneratórios devem ser minoradas para equivalerem à contemporânea média de mercado (TJSC – Apelação nº 5002301-06.2020.8.24.0189, de Santa Rosa do Sul, Quinta Câmara de Direito Comercial, unânime, relatora Desembargadora Soraya Nunes Lins, j. em 25.4.2024), sendo que "a procedência dos pedidos formulados em ação revisional de contrato bancário possibilita tanto a compensação de créditos quanto a devolução da quantia paga indevidamente, em obediência ao princípio que veda o enriquecimento ilícito" (STJ – Agravo Interno no Recurso Especial nº 1.679.635/PR, Quarta Turma, unânime, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, j. em 10.8.2020).
2. A aplicação da pena por litigância de má-fé só deve ser imposta nos casos de induvidosa prática de dolo processual, quando se extrapola o direito à prestação jurisdicional e resta demonstrado o efetivo prejuízo suportado pela parte prejudicada em decorrência do mau comportamento alheio (TJMG – Apelação Cível nº 1.0287.15.000623-0/001, de Guaxupé, 3ª Câmara Cível, unânime, relatora Desembargadora Albergaria Costa, j. em 27.01.2016), o que não é o caso.
3. Para além disso, vale a menção de que "o órgão julgador não está obrigado a se pronunciar acerca de todo e qualquer ponto suscitado pelas partes, mas apenas sobre aqueles considerados suficientes para fundamentar a decisão" (STJ – Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 1215994/RS, Sexta Turma, unânime, rel. Min. Vasco Della Giustina, j. em 28.6.2011).
4. Desprovido o apelo, fixo em 5% sobre o proveito econômico obtido os honorários recursais (CPC, art. 85, § 11).
À luz do exposto, conheço, em parte, do recurso e, na extensão, com fulcro no disposto no artigo 932, inciso VIII, do CPC c/c artigo 132, inciso XV, do RITJSC, nego-lhe provimento.