AUTOR | : SHEILA ANA GONCALVES FERREIRA |
ADVOGADO(A) | : MATHEUS SANTOS DIAS (OAB SP472089) |
DESPACHO/DECISÃO
Vistos em inspeção.
SHEILA ANA GONCALVES FERREIRA, devidamente qualificada, ajuizou ação cognitiva em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, requerendo gratuidade de justiça e inversão do ônus da prova, bem como objetivando, em sede de tutela de urgência inaudita altera pars, “sejam deferidos depósitos judiciais mensais das parcelas no valor incontroverso de R$ 1.279,72, permanecendo a parte autora na posse do bem, assim como se abstenha a parte ré de incluir o nome da parte autora no cadastro de mal (sic) pagadores”.
Para tanto, relata que, em 27/07/2021, celebrou com a ré contrato de financiamento, referente ao imóvel situado na Rua Atlas, n. 16, Lote 02, Quadra D, Padre Miguel, nesta cidade.
Afirma que foram incluídas na avença valores relativos a seguro e taxa de administração, a configurar venda casada, e que, “conforme se observa do contrato celebrado entre as partes, consta somente a informação da taxa anual de juros, não havendo sequer indício do percentual da taxa mensal, e ainda não consta nenhuma cláusula expressa que permita a aplicação e regime de juros compostos”.
Alega, por fim, que os juros devem ser fixados de acordo com as taxas praticadas pelo mercado, definidas pelo Banco Central.
Com a inicial vieram procuração e documentos.
DECIDO.
Ab initio, defiro a gratuidade de justiça, na forma do art. 98 do CPC, e analiso o pedido de inversão do ônus da prova formulado na exordial.
Nos termos do entendimento majoritário do Superior Tribunal de Justiça, as regras do Código de Defesa do Consumidor, nelas incluída a que autoriza a inversão do ônus da prova, são aplicáveis aos contratos de mútuo para aquisição de imóvel pelo Sistema Financeiro de Habitação. Entretanto, para que seja deferido o pedido, é necessário que estejam demonstrados os pressupostos do artigo 6º, VIII, do CDC.
In casu, a hipossuficiência não é presumida tão-somente por se tratar de contrato do Sistema de Financeiro de Habitação. A mera incapacidade econômica do mutuário em relação ao cumprimento do contrato não implica necessariamente a sua incapacidade em arcar com as provas de suas alegações, até mesmo porque a perícia contábil se mostra apta a verificá-las, fazendo-se imprescindível que a autora comprovasse a necessidade de produção de outras provas e sua impossibilidade de obtê-las, no que não logrou êxito.
Dito isto, assim dispõe o art. 300, caput, do Código de Processo Civil, in verbis:
Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.
Para a sua concessão, como visto, é exigida a comprovação da probabilidade do direito, além da existência de perigo de dano ou risco ao resultado do processo, requisitos que, in casu, não se mostraram evidenciados.
A autora pretende o depósito das parcelas que entende devidas no âmbito de contrato de financiamento habitacional, afirmando, para tanto, a aplicação de “juros abusivos”, cobrança de tarifas indevidas e utilização de juros compostos no cômputo da dívida.
Trata-se de pedido de revisão de contrato de mútuo pactuado livremente, sendo certo que as apontadas irregularidades somente são aferíveis mediante perícia contábil, elaborada por profissional imparcial e da confiança do Juízo.
No ponto, consigno que, a autora pretende alterar o sistema de amortização, para que se apliquem juros simples (método Gauss) ao débito, o que é inadmissível, porquanto dissociado da realidade contratual.
Não pode um mutuário assinar um contrato e, posteriormente, pretender alterar suas cláusulas em benefício próprio, somente podendo almejar o afastamento das que se mostrarem, após a devida dilação probatória, incompatíveis com a legislação e com as regras de proteção ao consumidor.
Igualmente não há o que prover, no que tange ao pedido de depósito de parcelas nos autos, na medida em que se trata de valor incontroverso, que deve ser pago na forma e tempo contratados, tal como previsto no art. 50, § 1º, da Lei n. 10.931/04, reproduzido no Código de Processo Civil, mais precisamente no art. 330, § 3º.
Por fim, consigno que, na medida em que a demandante se encontra inadimplemte, conforme ela mesma comprova em ANEXO2 – fl 24, tal circunstância, pode, sim, levar a CEF, de forma legítima, a inserir seu nome em cadastros de restição ao crédito, sem que se configure ilegalidade.
Isto posto, INDEFIRO a tutela de urgência requerida e o pedido de inversão do ônus da prova.
Providencie a Secretaria o cadastro do advogado da autora no Sistema e-proc.
Após, cite-se (artigo 335 do CPC).
Oferecida resposta, deve a parte demandada noticiar se há possibilidade de conciliação, deduzindo, se for o caso, os seus termos de modo objetivo e circunstanciado.
Em seguida, à parte autora, em réplica, oportunidade em que, tendo sido informada pela parte ré a existência de proposta de autocomposição, deve manifestar-se especificamente sobre ela, valendo o silêncio como recusa, importando registrar, no ponto, que a aludida transação poderá ocorrer a qualquer tempo.
Deverá ainda a parte autora, em réplica, apresentar manifestação acerca de eventuais preliminares e prejudiciais suscitadas na resposta, especialmente sobre eventual arguição de ilegitimidade (artigo 338 CPC).
Registro, por oportuno, sem a necessidade de maiores digressões, que cabe à própria parte, ao protocolar a inicial, ou posteriormente, no curso do processo, proceder ao cadastramento, no sistema eProc, dos procuradores que deseja ver intimados, visto que tal atividade traduz um dever seu.
P.I.