Anderson De Vasconcellos Chaves x Nataly De Pinho Veloso
Número do Processo:
5030985-49.2024.8.13.0433
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMG
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Unidade Jurisdicional - 4º JD da Comarca de Montes Claros
Última atualização encontrada em
01 de
julho
de 2025.
Intimações e Editais
-
01/07/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Unidade Jurisdicional - 4º JD da Comarca de Montes Claros | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Montes Claros / 2ª Unidade Jurisdicional - 4º JD da Comarca de Montes Claros Rua Camilo Prates, 352, Fórum Gonçalves Chaves, Centro, Montes Claros - MG - CEP: 39400-906 PROJETO DE SENTENÇA PROCESSO: 5030985-49.2024.8.13.0433 AUTOR: ANDERSON DE VASCONCELLOS CHAVES CPF: 686.053.406-06 RÉU/RÉ: NATALY DE PINHO VELOSO CPF: 069.796.346-23 Vistos, etc. Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38 da Lei nº. 9.099/1995. Trata-se de Ação de Indenização por Danos Morais ajuizada por ANDERSON DE VASCONCELLOS CHAVES em face de NATALY DE PINHO VELOSO, ambos devidamente qualificados nos autos, por meio da qual o Requerente busca reparação pecuniária em virtude de alegada ofensa à sua honra e imagem, decorrente de mensagens e imagens supostamente divulgadas pela Requerida em redes sociais e grupos de aplicativo de mensagens. Em sua petição inicial, o Requerente narra ser Secretário Municipal de Defesa Social do Município de Montes Claros, cargo que ocupa desde 2017, sendo, portanto, figura pública e respeitada pelos serviços prestados. Aduz que, durante seu período de férias, cedeu sua residência, para uma reunião de campanha eleitoral dos candidatos Guilherme Guimarães e Otávio Rocha, concorrentes aos cargos de prefeito e vice-prefeito de Montes Claros, agendada para o dia 17 de setembro de 2024. Contudo, segundo a exordial, a Requerida, sem qualquer justificativa, teria passado a atacar e denegrir a imagem do Autor em redes sociais e grupos de WhatsApp, propagando mensagens direcionadas aos guardas municipais e à população em geral. Tais mensagens, conforme transcrição parcial na peça vestibular, afirmavam que os guardas municipais estariam sendo coagidos a comparecer à reunião para "passarem a falsa ideia de que estava tudo bem", e que o objetivo do Autor seria "permanecer no cargo e continuar oprimindo os guardas", "perseguindo, tirando direitos e atrasando ainda mais a instituição", em referência à Guarda Civil Municipal, vinculada à Secretaria de Defesa Social. Além disso, o Requerente alega que a Requerida teria divulgado uma fotografia sua, na qual aparece entre os candidatos Guilherme Guimarães e Otávio Rocha, com um "X" sobre sua imagem e a inscrição "Esse nunca mais". Por fim, sustenta que a Requerida também teria espalhado a falsa informação de que a reunião teria sido cancelada, com o intuito de confundir os interessados e gerar desinformação. O Autor argumenta que a conduta da Requerida extrapolou os limites da liberdade de expressão, ferindo seu direito de personalidade e dignidade humana, causando-lhe sofrimento, dor, tristeza e indignação, e buscando desmoralizá-lo perante a sociedade, a gestão municipal e os servidores da Guarda Municipal. Diante de tais fatos, o Requerente pleiteia a condenação da Requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A Requerida, por sua vez, apresentou contestação alegando ter recebido a mensagem em um grupo de WhatsApp, composto por dezenas de pessoas desconhecidas, cujo teor revelava que o Requerente estaria utilizando sua atribuição pública para convocar servidores subordinados à sua pasta para reuniões políticas, com a intenção de demonstrar que o setor não enfrentava problemas com os servidores. A Requerida afirmou que nunca ocupou cargo público, não possui interesse em tal, e não conhece o Requerente ou pessoas próximas a ele, tendo agido unicamente no seu interesse de cidadã ao buscar esclarecer uma notícia que considerava grave. Confessou ter compartilhado o conteúdo da mensagem e a imagem que a acompanhava, mas o fez exclusivamente via "direct" (caixa de mensagem privada) do Instagram da página "EventosMoc", por acreditar que se tratava de um fato grave e que a referida página, que se autodenomina "jornalística e de notícias", teria a aptidão para investigar a veracidade do conteúdo. A Requerida negou veementemente ter divulgado o conteúdo da mensagem em grupos de WhatsApp, Facebook ou em postagens públicas, e ressaltou que a página "EventosMoc" sequer publicou o teor da mensagem enviada. Adicionalmente, invocou a proteção constitucional da liberdade de expressão (art. 5º, IV e XIV, e art. 220 da CRFB/88), afirmando que a crítica a agentes públicos, especialmente em período eleitoral, é um meio indispensável de controle da atividade política e que o Requerente, como Secretário Municipal, estava sujeito a tais críticas. Em audiência de conciliação, não foi possível a composição amigável. O Requerente apresentou impugnação ao ID 10380652096. Na audiência de instrução, foi colhido o depoimento das partes e ouvida uma testemunha apresentada pelo requerente, que inclusive foi contraditada pelo procurador da requerida, alegando suspeição, em razão de sua subordinação ao Requerente na época dos fatos. É o relatório. Passo a fundamentar. A controvérsia central que se apresenta para deslinde nesta demanda reside na análise da conduta atribuída à Requerida e sua subsunção aos preceitos da responsabilidade civil, especificamente no que tange à alegada ofensa à honra e imagem do Requerente. Cumpre perquirir se o compartilhamento de mensagens e imagens, no contexto fático delineado, configurou um ato ilícito capaz de gerar o dever de indenizar, ou se, ao revés, tal conduta encontra-se amparada pelo legítimo exercício de direitos fundamentais, notadamente a liberdade de expressão e o direito de crítica a figuras públicas. A ponderação entre esses valores constitucionais, em face das provas produzidas e do ônus probatório, é imperativa para a justa solução da lide. O sistema processual civil brasileiro, em seu artigo 373 do Código de Processo Civil, estabelece a regra geral de distribuição do ônus da prova, incumbindo ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito e ao réu a prova dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. No caso em tela, para que a pretensão indenizatória do Requerente pudesse prosperar, seria imprescindível a demonstração cabal da ocorrência do ato ilícito, ou seja, que a Requerida efetivamente divulgou as mensagens e imagens de forma a extrapolar os limites da crítica legítima e causar dano à honra e imagem do Autor, bem como a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta e o alegado dano moral. Ao analisar o conjunto probatório, verifica-se que o Requerente não logrou êxito em desincumbir-se integralmente do ônus que lhe competia. A petição inicial alega que a Requerida "passou a atacar e denegrir o Autor nas redes sociais e em grupos de whatsApp, propagando mensagens direcionadas aos guardas municipais e à população em geral". Contudo, as provas documentais e orais produzidas nos autos não corroboram a tese de uma ampla e indiscriminada divulgação por parte da Requerida. A própria Requerida, em sua contestação e depoimento pessoal, admitiu ter recebido a mensagem em um grupo de WhatsApp e a ter encaminhado para o "direct" (caixa de mensagem privada) de uma página jornalística no Instagram, denominada "EventosMoc". A Ata Notarial (ID 10366307994), produzida pela Requerida, corrobora essa versão dos fatos, demonstrando o envio para um canal privado. Não há nos autos qualquer print, testemunho ou outro elemento probatório que demonstre que a Requerida tenha, de fato, "espalhado" ou "repostado" o conteúdo em grupos de WhatsApp ou em suas redes sociais de forma pública, como alegado pelo Requerente. A alegação da Requerida de que a página "EventosMoc" sequer publicou o conteúdo enviado também não foi refutada por prova em contrário pelo Autor. A ausência de publicidade ampla e efetiva do conteúdo é um fator determinante para a configuração do dano moral em casos de alegada difamação ou injúria, pois a lesão à honra e imagem, em regra, pressupõe a ciência por terceiros que possam formar um juízo de valor negativo sobre a vítima. Se a mensagem não alcançou um público significativo por meio da conduta da Requerida, o potencial lesivo é mitigado a ponto de descaracterizar o dano moral indenizável. No que concerne à prova oral, o depoimento pessoal do Requerente, embora afirme que a mensagem foi "publicada em diversos grupos", não apresenta elementos concretos que vinculem essa ampla divulgação à conduta da Requerida. Sua declaração de que recebeu a mensagem via "EventosMoc" corrobora a tese da Requerida de que o envio foi para uma caixa de mensagem privada, e não uma publicação pública. O depoimento da Requerida, por sua vez, mostrou-se coerente com sua tese defensiva. Ela confirmou ter recebido a mensagem em um grupo de WhatsApp e a ter encaminhado para o "direct" da página "EventosMoc" com o intuito de denúncia, por considerar o fato grave. Sua negativa de autoria da mensagem e de ampla divulgação pública, aliada à ausência de prova em contrário pelo Autor, fortalece a tese de que sua conduta não configurou o ato ilícito nos moldes alegados. A recusa em responder sobre parentesco na guarda municipal, amparada no direito de não produzir prova contra si, é um direito constitucionalmente assegurado e não pode ser interpretada em seu desfavor, especialmente porque a relevância de tal pergunta para o objeto da lide (a conduta da Requerida e o dano causado) é questionável. Quanto à testemunha Wellington José de Araújo, arrolada pelo Requerente, sua oitiva deve ser analisada com as devidas ressalvas. A contradita arguida pela Requerida, sob o fundamento de que a testemunha era subordinada direta do Requerente na Secretaria de Defesa Social à época dos fatos, é pertinente. Embora mantida a oitiva, a relação de subordinação pretérita, mesmo que não configure impedimento legal absoluto, pode gerar interesse moral na causa, comprometendo a imparcialidade do depoimento, conforme o artigo 447, § 3º, inciso II, do Código de Processo Civil. Assim, seu testemunho, embora colhido, não possui o mesmo peso probatório de uma testemunha isenta, devendo ser considerado com cautela e, em alguns pontos, como mera informação. O conteúdo de seu depoimento, ao afirmar que "ouviu dizer" que a Requerida tem parente na guarda que teria encaminhado a mensagem, constitui prova frágil, que não se presta a comprovar fatos concretos e relevantes para a imputação de responsabilidade à Requerida. Ainda que se considerasse a conduta da Requerida, é imperioso ponderar a questão sob a ótica da liberdade de expressão e do direito de crítica a figuras públicas. O Requerente, na condição de Secretário Municipal, é um agente público e, como tal, está sujeito a um escrutínio mais rigoroso por parte da sociedade. A liberdade de expressão, consagrada nos artigos 5º, inciso IV, e 220 da Constituição da República Federativa do Brasil, constitui um pilar fundamental do Estado Democrático de Direito, permitindo a livre manifestação do pensamento, a crítica e o debate público, essenciais para o controle da atividade política e a participação cidadã. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em diversas ocasiões, tem reafirmado a ampla proteção da liberdade de expressão, especialmente quando se trata de críticas a agentes públicos, mesmo que estas sejam "duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas", conforme se depreende da ADI 4451. No caso em apreço, a mensagem compartilhada pela Requerida, embora contundente, dirigia-se à atuação do Requerente em sua função pública, questionando a alegada coação de guardas municipais para fins eleitorais e a gestão da instituição. A Requerida alegou ter agido no dever de denunciar um fato que considerava grave e de interesse público, qual seja, o suposto uso da função pública para fins eleitorais. O próprio Requerente, em seu depoimento, não negou a realização da reunião em sua residência com fins eleitorais, o que confere um substrato de veracidade à premissa fática que motivou a conduta da Requerida. A discussão sobre a conduta de um Secretário Municipal em período eleitoral, especialmente no que tange à convocação de subordinados, é de evidente interesse público e se insere no legítimo debate democrático. A relativização dos direitos da personalidade de agentes públicos é uma tese consolidada na doutrina e na jurisprudência. Pessoas que ocupam cargos públicos ou que se expõem à vida pública, como o Requerente, devem ter uma maior tolerância às críticas e ao escrutínio público. A esfera de proteção de sua intimidade e vida privada é naturalmente mais restrita em comparação com a de um cidadão comum, na medida em que suas ações e decisões, especialmente aquelas relacionadas ao exercício de suas funções, são de interesse da coletividade. A crítica, no presente caso, direcionou-se à atuação do Requerente enquanto Secretário, e não à sua vida privada ou a atributos inatos de sua pessoa, o que reforça a tese de que a conduta da Requerida se manteve dentro dos limites da liberdade de expressão e do direito de crítica política. Em suma, a análise detida dos autos revela que o Requerente não produziu provas suficientes para demonstrar que a conduta da Requerida configurou um ato ilícito passível de indenização por danos morais. A ausência de comprovação de ampla divulgação das mensagens pela Requerida, a natureza privada do canal de comunicação utilizado (direct do Instagram para uma página jornalística que não publicou o conteúdo), e o contexto de crítica à atuação de um agente público em período eleitoral, são elementos que afastam a configuração do dano moral. A conduta da Requerida, nos termos em que restou provada, insere-se no exercício regular do direito de liberdade de expressão e do dever cívico de denunciar fatos que, a seu ver, seriam de interesse público, sem que se vislumbre excesso ou abuso que justifique a reparação pretendida. O mero descontentamento ou aborrecimento do Requerente com a crítica, por mais ácida que possa ter sido, não se confunde com o dano moral indenizável, que exige a efetiva lesão a um bem jurídico extrapatrimonial. Registra-se que o autor é pessoa de conduta ilibada e conceituada na cidade e mantém sua honra intacta, não havendo nenhuma informação de que a notícia vinculada, objeto da presente ação, tenha causado transtornos além daqueles subjetivos, próprios de quem recebe críticas. O autor é pessoa idônea de reconhecidos trabalhos prestados na administração pública neste e em outros setores, mantendo sua inabalada honra aos olhos da população geral, certamente. Ante o exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e no artigo 6º da Lei nº 9.099/95, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por ANDERSON DE VASCONCELLOS CHAVES em face de NATALY DE PINHO VELOSO. Sem custas e honorários de advogado nesta fase, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95. Pelo princípio de cooperação, advirto as partes que a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios poderá ensejar na fixação da multa prevista no art. 1026, §2º, do CPC. Int. Cumpra-se. Nos termos do art. 40 da Lei nº 9.099/95, submeto o presente projeto de sentença para fins de homologação por parte do Juízo. Montes Claros, data da assinatura MARIA FERNANDA BRAGA E SILVA Juíza Leiga SENTENÇA Vistos. Nos termos do artigo 40 da Lei 9.099, de 1995, HOMOLOGO o projeto de sentença para que produza seus efeitos jurídicos. Int. Cumpra-se. Montes Claros, data da assinatura eletrônica. ISAÍAS CALDEIRA VELOSO Juiz de Direito 2ª Unidade Jurisdicional - 4º JD da Comarca de Montes Claros