Glauco Gomes Madureira e outros x Lucas Felipe De Freitas
Número do Processo:
3000664-87.2024.8.06.0133
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJCE
Classe:
RECURSO INOMINADO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
3º Gabinete da 6ª Turma Recursal Provisória
Última atualização encontrada em
24 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
24/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 3º Gabinete da 6ª Turma Recursal Provisória | Classe: RECURSO INOMINADO CíVELPODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA FÓRUM DAS TURMAS RECURSAIS PROF. DOLOR BARREIRA 6ª TURMA RECURSAL RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS N.º: 3000664-87.2024.8.06.0133 JUÍZO DE ORIGEM: 1ª VARA DA COMARCA DE NOVA RUSSAS RECORRENTE/RECORRIDO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. RECORRENTE/RECORRIDO: MARIA DE FATIMA FERREIRA DA SILVA JUIZ (A) RELATOR (A): JULIANA BRAGANÇA FERNANDES LOPES SÚMULA DE JULGAMENTO (ARTIGO. 46 DA LEI N° 9.099/95) EMENTA RECURSOS INOMINADOS SIMULTÂNEOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONTRATAÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 14, DO CDC. DEVER DE INDENIZAR. DANO MORAL CONFIGURADO. DANO MATERIAL CONFIGURADO. RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. ACÓRDÃO Acordam os Juízes da Sexta Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, CONHECER DOS RECURSOS E NEGAR-LHES PROVIMENTO, nos termos do voto da Juíza Relatora, que assina o acórdão, consoante o art. 61 do Regimento Interno. Acórdão assinado pela Juíza Relatora, em conformidade com o artigo 61 do Regimento Interno das Turmas Recursais. Fortaleza/CE, data da assinatura digital. JULIANA BRAGANÇA FERNANDES LOPES JUÍZA RELATORA Trata-se de AÇÃO INDENIZATÓRIA ajuizada por MARIA DE FATIMA FERREIRA DA SILVA em face de BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. Em síntese, aduz a parte promovente que jamais firmou contrato de cartão de crédito consignado com a instituição financeira demandada, tendo sido surpreendida com descontos mensais indevidos em seu benefício previdenciário, sem sua anuência ou conhecimento. Por fim, pugna pela condenação da parte promovida por danos morais e materiais. Adveio sentença (ID.20109927) que julgou procedentes em partes os pedidos formulados na inicial, na forma do art. 487, I do CPC para: a) declarar a NULIDADE do contrato discutido nesta lide, com a consequente inexistência do débito. b) condenar a parte promovida em RESTITUIR, observando a prescrição quinquenal, na forma simples, os valores descontados indevidamente da parte autora até 30 de março de 2021 e em dobro os valores descontados no período de 31 de março de 2021 até o último desconto, mais juros de mora simples de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária pelo INPC, ambos contados das datas dos efetivos descontos. (Súmulas 43 e 54 do STJ); c) condenar o promovido ao pagamento de R$2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais, a ser devidamente acrescido de correção monetária pelo INPC, a partir da data do arbitramento (Súmula 362/STJ), e juros moratórios a partir do evento danoso (início dos descontos), nos moldes da Súmula 54 do STJ, à taxa de 1% (um por cento) ao mês. A parte promovente interpôs recurso inominado (ID.20109948) pugnando pela restituição das cobranças indevidas sem a limitação temporal bem como a majoração dos danos morais. Irresignada, a parte promovida interpôs recurso inominado (ID.20109941) pugnando pela reforma da sentença. Contrarrazões apresentadas pela parte promovente (ID.20109953). É o breve relatório. Passo ao voto. Conheço dos recursos em face da obediência aos seus pressupostos de admissibilidade. O recorrente alega a prejudicial de prescrição. Contudo, o caso comporta a incidência do art. 27 do CDC, que estabelece o prazo de 5 anos. Tratando-se de obrigação de trato sucessivo onde a violação do direito ocorre de forma contínua, mês a mês, o termo inicial da prescrição é a data correspondente ao vencimento da última parcela. Prejudicial rejeitada. Trata-se de ação consumerista, portanto aplica-se a Lei 8.078/90, e sendo assim, a responsabilidade civil da parte acionada é objetiva, baseada na teoria do risco, independentemente de culpa. Nesse contexto, insta ressaltar que envolvendo o caso relação de consumo, eventual falha na prestação de serviços ao consumidor impõe ao prestador o dever de reparação pelos danos experimentados pelo promovente. Assim, não havendo comprovação nos autos da existência e da validade do negócio jurídico firmado entre as partes, resta configurada a falha da empresa promovida, sendo indevidas as parcelas descontadas da conta da promovente. Tendo a promovente negado a contratação, compete ao promovido a demonstração de fato que altere o direito defendido, como determina o art. 373. II do Código de Processo Civil. Com efeito, sustenta o promovente que houve contratação regular de cartão de crédito com reserva de margem consignável e que os descontos foram legítimos, contudo, o requerido não juntou aos autos o referido documento impugnado em sua peça de defesa, provas de fácil acesso ao promovido. Ou seja, quedou-se inerte. Assim, a realização de descontos na conta bancária da promovente mostra-se indevida. A relação jurídica aqui tratada é de consumo, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor, conforme Súmula 297 do STJ. Dessa forma, nos termos do art. 14 do CDC, a responsabilidade do fornecedor é objetiva. Dessa forma caberia ao banco, portanto, comprovar a regularidade da contratação. Assim, é evidente que o réu não cumpriu adequadamente o seu ônus probatório, uma vez que deixou de apresentar a documentação específica e pertinente aos contratos que estão sendo questionados neste processo. A ausência de provas relativas ao contrato em litígio impede a comprovação da regularidade da avença contestada. Nessa linha, ao não apresentar documentos que validem a regularidade e legitimidade da contratação, a instituição promovida deixa de comprovar a existência de relação jurídica substancial entre as partes no contexto do contrato em discussão, o que leva à conclusão de que as cobranças de RMC são inexigíveis. Ademais, cabe ressaltar que em casos como o presente, em que a autora alega desconhecer o débito, incumbe à parte ré a comprovação da regularidade da sua atuação ou a culpa exclusiva do consumidor, não sendo dado impor à demandante, que nega a existência da contratação e da dívida, a impossível produção da prova negativa. Diante da ausência de instrumento contratual, a jurisprudência pátria entende pela inexistência da relação jurídica. Nesse sentido: RECURSO. CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. NÃO JUNTADA DE CONTRATO. BANCO NÃO CONSEGUIU SE DESVENCILHAR DO SEU ÔNUS PROBATÓRIO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. (TJCE- FÓRUM DAS TURMAS RECURSAIS PROF. DOLOR BARREIRA, 6° TURMA RECURSAL, RI 3000695-94.2017.8.06.0152, REL. ROBERTO SOARES BULCÃO COUTINHO, JULGADO EM 07.05.2020). APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA CUMULADA COM CANCELAMENTO DE CONTRATO, REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS JULGADA PROCEDENTE - RECURSO DO BANCO - PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO REJEITADA - DEFESA DE MÉRITO DE LEGALIDADE CONTRATUAL - CONTRATO NÃO JUNTADO AOS AUTOS - DISCUSSÃO SOBRE A OBRIGAÇÃO E FORMA DE RESTITUIÇÃO DE VALORES - DISCUSSÃO SOBRE A EXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS E QUANTUM INDENIZÁVEL - RECURSO DO BANCO PROVIDO PARCIALMENTE PARA EXCLUIR A OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR E A INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - RECURSO DO CONSUMIDOR VISANDO A MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS PREJUDICADO [...] Não juntado aos autos o contrato em discussão, impossível afirmar-se a sua existência, validade e eficácia, de tal sorte que deve ser declarada a sua inexistência. […] (TJMS. Apelação Cível n. 0811246-22.2015.8.12.0002, Dourados, 1ª Câmara Cível, Relator (a): Des. Marcelo Câmara Rasslan, j: 17/02/2020, p: 18/02/2020). Desta forma, resta confirmado o argumento exordial de inexistência de contratação, aplicando-se o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso em análise, de maneira que o Banco reponde objetivamente pelos danos causados. Há de se salientar que a Segunda Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da Súmula n. 479, pacificou o entendimento de que "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". Em relação à repetição do indébito, entendo que a repetição deva ser realizada na forma simples para os descontos anteriores a 30 de março de 2021. O posicionamento atual do Superior Tribunal de Justiça, fixado no recurso repetitivo paradigma (EAREsp 676608/RS), é no sentido de que a restituição em dobro independe da natureza volitiva do fornecedor, ou seja, prescinde da comprovação da má-fé quando a cobrança indevida decorrer de serviços não contratados. Todavia, o entendimento supra foi publicado com modulação dos efeitos, de sorte que a tese fixada somente será aplicável a valores pagos após a sua publicação, ou seja, 30/03/2021, autorizada a devolução de valores em dobro; aos descontos indevidos antes desta data, a devolução deverá ocorrer de forma simples. A propósito, confira-se: "Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. (...) Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão." (STJ. Corte Especial. EAREsp 676608/RS, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 21/10/2020) (Grifei) Nesta oportunidade, colaciono decisões que tratam do tema: RESPONSABILIDADE CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE RELAÇÃO CONTRATUAL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (ART. 6º, VIII, CDC). APLICABILIDADE. INSTRUMENTO CONTRATUAL NÃO ANEXADO AOS AUTOS PELA RÉ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE DO PACTO. OCORRÊNCIA. RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS NA FORMA SIMPLES E EM DOBRO A DEPENDER DA DATA DE REALIZAÇÃO DOS DESCONTOS, SEGUNDO O C. STJ NO EAREsp 676.608/RS. CONFIGURAÇÃO DE DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO DO RÉU CONHECIDA E IMPROVIDA. RECURSO DA AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. (...). 4. Nesse contexto, tendo em vista a não apresentação do contrato pelo réu, configurou-se a irregularidade do negócio e a falha na prestação do serviço, assim, a responsabilidade civil e o dever de indenizar recai sobre a instituição financeira promovida. 5. A título de danos materiais, tendo em vista comprovada a supressão indevida de valores do benefício previdenciário da demandante, resta configurado o prejuízo financeiro e o dever de ressarcimento, para a qual deve-se observar o que fora decidido pelo c. STJ nos embargos de divergência em agravo em recurso especial (EAREsp 676.608/RS), segundo à modulação dos efeitos do julgado, no sentido de que a restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas às cobranças eventualmente realizadas partir da publicação daquele acórdão, ou seja 30/03/2021 . 6. A quantia de R$ 1.000,00 (hum mil reais) fixada em primeiro grau merece ser ajustada aos parâmetros aplicados nos julgados deste Tribunal, uma vez que usualmente tem-se como proporcional e razoável o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para reparar os danos sofridos e de acordo com o porte econômico do ofensor. 8. Apelação do réu conhecida e improvida. Recurso da autora conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada. Indenização por dano moral majorada para R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e restituição de indébito em dobro, todavia, apenas quanto aos descontos porventura realizados após 30/03/2021. (TJ-CE - AC: 0000125-43.2018.8.06.0147, Relator: HERÁCLITO VIEIRA DE SOUSA NETO, Data de Julgamento: 15/12/2021, 1a Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 15/12/2021) (Grifei). Não assiste razão à parte recorrente quanto à alegação de que, por se tratar de contrato declarado nulo, não haveria limitação temporal à restituição dos valores pagos. aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 206, §5º, inciso I, do Código Civil, quando se trata de pretensão de repetição do indébito. Isso porque a nulidade do contrato não tem o condão de afastar a incidência da prescrição, pois o que se discute não é a declaração da invalidade em si, mas sim a devolução dos valores pagos indevidamente, o que configura pretensão de natureza patrimonial e, portanto, submetida aos prazos prescricionais ordinários. Nessa toada, ressalta-se que a parte promovida não comprovou ter agido sob o pálio da legalidade, uma vez que não colacionou aos autos documento que comprove a validade do negócio jurídico em apreço. Portanto, é imperioso arbitrar condenação da parte ré em indenização por danos morais. Quanto aos danos morais, por sua vez, entende-se que restam configurados, posto presente no caso os elementos necessários para sua caracterização: ato ilícito, nexo de causalidade, dano ou prejuízo e abalo aos direitos personalíssimos. Consigne-se que quando do arbitramento judicial devem ser observadas as circunstâncias do caso concreto, a extensão do dano, a capacidade financeira do ofensor e possibilidade de absorção do ofendido e o papel pedagógico de desestimular a recalcitrância na prática de ato ilícito, dentre outros critérios. O valor a título de danos morais na quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) afigura-se razoável, levando-se em consideração as peculiaridades do caso em análise, pois sopesou a extensão e repercussão do dano, estando adequado ao caso em cotejo bem como aos parâmetros desta Turma. Frisa-se, por fim, que é entendimento assente de nossa jurisprudência que o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentário sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio (STJ - 1ª Turma, AI169.073SP AgRg, Rel. Min. José Delgado, j. 4.6.98, negaram provimento, v.u., DJU 17.8.98, p.44). No mesmo sentido: "O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos" (RJTJESP 115/207). Ante o exposto, CONHEÇO DOS RECURSOS, para NEGAR-LHES PROVIMENTO, mantendo inalterada a sentença vergastada. Custas e honorários advocatícios pela parte recorrente promovente ao pagamento das custas legais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, cuja execução fica suspensa em razão da concessão do benefício da gratuidade de justiça, que ora defiro. Custas e honorários advocatícios pelo recorrente promovido, estes últimos no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, na forma do art. 55 da Lei n. 9.099/95. É como voto. Fortaleza, data da assinatura. JULIANA BRAGANÇA FERNANDES LOPES JUÍZA RELATORA