Processo nº 10384678420194013400
Número do Processo:
1038467-84.2019.4.01.3400
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF1
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara Federal Cível da SJDF
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara Federal Cível da SJDF | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária do Distrito Federal 2ª Vara Federal Cível da SJDF SENTENÇA TIPO "A" PROCESSO: 1038467-84.2019.4.01.3400 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: RENATO LUCIANO GALLI REPRESENTANTES POLO ATIVO: ANTONIO DE PADUA NOTARIANO JUNIOR - SP154695 POLO PASSIVO:UNIÃO FEDERAL e outros SENTENÇA Trata-se de ação cível comum ajuizada por RENATO LUCIANO GALLI em face da UNIÃO e da CVM, na qual formula o seguinte pedido: 126. Ademais, o Autor requer seja JULGADA INTEGRALMENTE PROCEDENTE a presente ação para o fim de que seja totalmente cancelada a multa imposta pela CVM, com a consequente absolvição do Autor. 127. Alternativamente e em caráter sucessivo, requer seja a presente ação JULGADA PROCEDENTE para quantificar a pena atribuída ao Autor, ao patamar mínimo (advertência), atentando para os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, conforme demonstrado ao longo desta Inicial. Na petição inicial (Id 123686359), o autor alega que foi condenado à pena de multa no valor de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), no Processo Administrativo Sancionador nº 12/2004, pela prática das condutas descritas nos itens “c” e “a” do item II e vedadas pelo item I, todos da Instrução Normativa CVM nº 08/79. Informa que o objeto do processo foi a existência de um esquema de operações fraudulentas e criação de condições artificiais de demanda e oferta no âmbito do mercado de valores mobiliários. Sustenta que: a acusação é inepta, pois não descreve a conduta que teria sido praticada pelo autor; a decisão do CSRFN é nula, pois não enfrentou as peculiaridades relacionadas à conduta do demandante; inexiste prova que demonstre se a conduta do autor foi culposa ou dolosa; inexiste fundamento para a manutenção de sua condenação; a interferência de terceiros mal-intencionados na operação não pode ser atribuída ao autor; inobservância do princípio da proporcionalidade na dosimetria da pena. Pede a concessão de tutela provisória de urgência. Atribui à causa o valor de R$ 1.048.320,00 (um milhão, quarenta e oito mil, trezentos e vinte reais). Junta documentos. Comprova o recolhimento das custas (Id 123709360). Distribuída a ação, o Juízo determinou a intimação da parte ré para se manifestar sobre o pedido de tutela provisória de urgência (Id 129439384). A UNIÃO se manifestou (Id 142908377). O Juízo deferiu o pedido de tutela provisória de urgência (Id 143404363). A parte autora apresentou emenda à petição inicial para incluir a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), no polo passivo da demanda (Id 157291893). A União apresentou contestação (Id 195845991) e informou a interposição de Agravo de Instrumento (Id 195987867). A CVM apresentou contestação (Id 1042517343). A parte autora ofereceu réplica (Id 1804031648). As partes não especificaram provas. Os autos vieram conclusos para sentença. É o relatório. Decido. Inicialmente, reconheço a ilegitimidade passiva da UNIÃO, uma vez que o ato impugnado foi praticado pela CVM, que é ente dotado de personalidade jurídica. No mérito, este Juízo proferiu a seguinte decisão quando do exame do pedido de tutela provisória de urgência: “O art. 300 do CPC estabelece que a tutela de urgência de natureza cautelar será concedida quando houver elementos que evidenciem: (a) a probabilidade do direito; e (b) o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. No caso em análise, estão presentes os requisitos para a concessão da medida. A jurisprudência é pacífica no sentido de que o controle do Poder Judiciário no tocante aos processos administrativos sancionadores restringe-se ao exame da obediência às garantias fundamentais do administrado, sem, contudo, adentrar o mérito administrativo (por exemplo: STJ, RMS 47.595/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 05/10/2015). Uma das garantias do administrado é o direito a uma decisão administrativa fundamentada, que é emanação da cláusula do devido processo administrativo. Tal garantia tem assento constitucional: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; (...) Além disso, a Lei nº 9.784, de 1999, é expressa ao dispor que “[o]s atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: (...) II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções” (art. 50, II). In casu, a leitura perfunctória do Relatório da Comissão de Inquérito (Id 123686362), mais especificamente dos itens 141 a 145 e 157 a 202, sugere que o autor não teve observado o seu direito a uma decisão administrativa fundamentada. A Comissão de Inquérito concluiu que as operações apuradas serviram a um esquema comandado pela São Paulo CV “que utilizou o mercado de opões flexíveis de dólar com a finalidade de simular a realização de operações aparentemente lícitas, mas que de fato foram arranjadas de modo a gerar lucro para os participantes interessados em apresentar ganhos e prejuízos para aqueles interessados em apresentar perdas” (item 188 do Relatório). Convenceu-se também a Comissão de que a FAIR CCV, cujo diretor era Francisco Augusto Tertuliano, participou do esquema, uma vez que três clientes suas participaram dessas operações. No entanto, a Comissão não deixou claro porque vislumbrou a responsabilidade do autor, que era um empregado da FAIR CCV, que tinha, aparentemente, apenas a atribuição de receber as operações de opções flexíveis em uma filial e encaminhá-las para aprovação da matriz (item 143). Incumbia à Comissão motivar as suas conclusões de maneira explícita, clara e coerente e, em uma primeira análise, é possível concluir não constam do relatório elementos suficientes para a configuração da responsabilidade e participação do autor no esquema, do que ressai a probabilidade do seu direito. Está presente também o perigo de dano, tendo em vista que a parte autora está exposta às medidas diretas e indiretas de cobrança da pena pecuniária. Ante o exposto, DEFIRO O PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA para suspender a multa aplicada ao autor no Processo Administrativo Sancionador nº 12/2004, até ulterior decisão.” Com o estabelecimento do contraditório, não houve alteração das circunstâncias fáticas, não tendo sido demonstrado nos autos que houve motivação específica para o ato sancionador, tampouco a prática de conduta dolosa pelo autor. Com efeito, a CVM sustenta que a decisão administrativa estaria devidamente motivada, com base na remissão ao relatório da Comissão de Inquérito, conforme autoriza o art. 50, §1º, da Lei nº 9.784/99. Contudo, a motivação por remissão não dispensa a individualização da conduta, sobretudo em matéria sancionatória. No caso concreto, a análise dos autos revela ausência de motivação específica quanto aos atos atribuídos ao autor. Não se explicita de forma clara qual a conduta de Renato Galli, para infringir o item I da Instrução Normativa CVM nº 08/79. A ausência de elementos individualizadores compromete a validade do ato, por violar os princípios da ampla defesa e da motivação. Vale dizer, que apesar de o autor figurar como único operador da filial da FAIR CCV, restou demonstrado que o autor apenas executava ordens já aprovadas por superiores hierárquicos, sem poder decisório ou ingerência no conteúdo das operações. Desse modo, a responsabilização baseada exclusivamente na função ocupada pelo autor configura imputação por presunção, o que é vedado no âmbito do direito sancionador. Também não ficou demonstrado o elemento subjetivo “dolo”, exigido para a configuração da infração descrita na alínea “a”, item II, da Instrução Normativa CVM nº 08/79. Confira-se: INSTRUÇÃO CVM Nº 8, DE 08 DE OUTUBRO DE 1979. “II - Para os efeitos desta Instrução conceitua-se como: a) condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores mobiliários aquelas criadas em decorrência de negociações pelas quais seus participantes ou intermediários, por ação ou omissão dolosa provocarem, direta ou indiretamente, alterações no fluxo de ordens de compra ou venda de valores mobiliários;” Nenhum documento ou depoimento demonstra que o autor tenha tido ciência do caráter fraudulento das operações ou que tenha delas se beneficiado. Não basta a existência de documentos genéricos; é indispensável a demonstração do elemento subjetivo exigido pela norma. Dessa forma, restando comprovados vícios formais e materiais na decisão administrativa — que deixou de enfrentar os argumentos apresentados pela defesa, não individualizou a conduta do autor e tampouco demonstrou o dolo necessário à configuração da infração imputada —, impõe-se reconhecer a invalidade do ato sancionador, razão pela qual o pedido autoral merece ser integralmente acolhido. Ante o exposto, RATIFICO A DECISÃO que concedeu a tutela provisória de urgência; EXTINGO O FEITO, sem resolução do mérito, em relação à UNIÃO, nos termos do art. 485, IV, do CPC; e JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, nos termos do art. 487, I, do CPC, para anular a multa administrativa imposta à parte autora pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) nos autos do Processo Administrativo Sancionador (“PAS”) nº 12/2004. Condeno a parte ré ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios que, atento aos critérios do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa. Sentença sujeita ao reexame necessário. Intimem-se. Transcorrido in albis o prazo recursal, remetam-se os autos ao e. TRF da 1ª Região para reexame necessário. No caso de interposição de apelação, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões e, decorrido o prazo, com ou sem manifestação, remetam-se os autos ao e. TRF da 1ª Região (art. 1.010, § 3º, do CPC). Brasília, data da assinatura digital.