Processo nº 10172579220248110003
Número do Processo:
1017257-92.2024.8.11.0003
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJMT
Classe:
APELAçãO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Quarta Câmara de Direito Privado
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Quarta Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017257-92.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação] Relator: Des(a). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [SABEMI SEGURADORA SA - CNPJ: 87.163.234/0001-38 (APELANTE), JULIANO MARTINS MANSUR - CPF: 078.855.777-75 (ADVOGADO), RAIMUNDO MARIANO DA COSTA - CPF: 109.767.871-72 (APELADO), DANIELA OLIVEIRA BARBOSA - CPF: 014.884.051-58 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO TRIENAL REJEITADA. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL (ART. 27 DO CDC). MÉRITO. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DESCONTOS INDEVIDOS. DANO MORAL MANTIDO. VALOR RAZOAVEL E PROPORCIONAL. RESTITUIÇÃO DOS VALORES NA FORMA SIMPLES. CONSECTARIOS LEGAIS. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO À LEI Nº 14.905/2024. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível contra sentença que julgou procedente ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada em razão de descontos realizados em benefício previdenciário, sob alegação de contratação de seguro não reconhecida. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em: (i) saber se incide, no caso, a prescrição trienal prevista no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, ou o prazo quinquenal do art. 27 do CDC; (ii) saber se houve comprovação da contratação do seguro e a legalidade dos descontos realizados no benefício previdenciário; (iii) saber se estão presentes os requisitos para a condenação por danos morais e sua quantificação; (iv) saber se é cabível a restituição dos valores descontados; e (v) saber qual o índice aplicável para juros moratórios e correção monetária em razão da vigência da Lei nº 14.905/2024. III. Razões de decidir Preliminar: 3. A pretensão de reparação de danos decorrentes de descontos indevidos por contrato inexistente configura fato do serviço, sujeitando-se ao prazo prescricional de cinco anos, conforme o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Mérito: 4. Diante da relação de consumo e da hipossuficiência do autor, aplicou-se a inversão do ônus da prova, cabendo à ré demonstrar a regularidade da contratação, o que não ocorreu. 5. Compete à instituição financeira o ônus de comprovar a validade da contratação e a autenticidade da manifestação de vontade do consumidor, nos termos do art. 373, II, do CPC. A ausência de prova robusta leva à manutenção da declaração de nulidade do negócio jurídico. 6. A ausência de prova da relação jurídica válida e os descontos indevidos caracterizam ato ilícito passível de reparação moral. O dano é presumido (in re ipsa), estando o valor arbitrado em consonância com a jurisprudência e os critérios do art. 944 do CC. 6. Restituição dos valores descontados indevidamente deve se dar na forma simples, diante da ausência de má-fé. 7. Em virtude da natureza extracontratual da responsabilidade, aplica-se a Taxa Selic para os juros moratórios e o IPCA para a correção monetária, conforme Lei nº 14.905/2024 e nova redação do art. 406 do Código Civil. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O prazo prescricional para ação declaratória de inexistência de débito e repetição de indébito fundada em relação de consumo é de cinco anos, nos termos do art. 27 do CDC. 2. A não comprovação da contratação do seguro torna ilegais os descontos efetuados, sendo devidos danos morais e restituição simples dos valores descontados. 3. Ausente convenção expressa quanto à taxa de juros aplicável, devem ser calculados com base na Taxa Selic, conforme a nova redação do art. 406 do Código Civil dada pela Lei nº 14.905/2024.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, arts. 186, 927, 944, 406; CDC, arts. 6º, III e VIII, 27, 42, parágrafo único; Lei nº 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2467639/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03/06/2024, DJe 06/06/2024; TJMT, N.U 1047553-51.2022.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 05/02/2025, DJE 12/02/2025; TJMT, N.U 1001447-92.2020.8.11.0011, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 13/10/2022, DJE 19/10/2022; TJMT, N.U 1001257-27.2023.8.11.0011, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 25/11/2024, DJE 26/11/2024; TJMT, N.U 1022047-39.2023.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 30/04/2025, DJE 30/04/2025; TJMT, N.U 0044357-37.2015.8.11.0041, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 02/04/2025, DJE 07/04/2025. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por SABEMI SEGURADORA S/A contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais ajuizada por RAIMUNDO MARIANO DA COSTA, julgou procedente os pedidos iniciais. Narra o autor que desde 19 de fevereiro de 2020, a empresa ré, SABEMI SEGURADORA S/A, vem realizando descontos em seu benefício previdenciário e que tais descontos seriam referentes a um contrato de seguro de acidentes pessoais que nunca ter solicitou ou contratou. A sentença (ID 277812897) julgou procedente o pedido para declarar nula a apólice de seguro nº 01.82.000330; condenar a ré ao pagamento de R$ 6.000,00 a título de danos morais; determinar a restituição, de forma simples, das parcelas indevidamente descontadas; e condenar a ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. O Apelante, em suas razões recursais (ID 277813854), suscitou preliminar de prescrição trienal com base no Art. 206, § 3º, IV do Código Civil, por se tratar de pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa. No mérito, sustenta, em síntese, a validade do contrato, que teria sido celebrado por meio de telefone. Afirma que agiu de forma diligente e sem má-fé, sendo as cobranças legítimas. Aduz a inexistência de dano moral indenizável, pois agiu no exercício regular de um direito e não negativou o nome do Apelado. Alternativamente, pugna pela redução do valor de R$ 6.000,00, por considerá-lo excessivo. Requer a improcedência do pedido de restituição dos valores, por ausência de má-fé. Por fim, pede a aplicação da nova taxa de juros legal (Taxa Selic) e correção pelo IPCA, conforme a Lei nº 14.905/2024, em substituição aos critérios definidos na sentença. Contrarrazões pelo não provimento (ID 277813857). É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO PRELIMINAR - PRESCRIÇÃO EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Defende a apelante que, na hipótese, incide o prazo prescricional de três anos do Código Civil, na medida em que “discute-se a exigibilidade de um contrato firmado entre as partes e a devolução da valores decorrentes de obrigações previstas em tal negócio jurídico, atraindo norma prevista (em hipótese expressa) do Código Civil.” Sustenta, nesse sentido a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, diversamente do que alega a apelante, nos casos relacionados às ações declaratórias de inexistência de débito relativas a contratos de seguro cuja contratação é questionada, o prazo prescricional aplicável é de cinco anos, conforme art. 27 do CDC, com início da contagem a partir do último desconto. “Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria”. Nesse mesmo sentido é a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça: “[...] Ação declaratória de inexistência de relação jurídica relativa à apólice de seguro com pedido de indenização por dano moral . 2. A jurisprudência do STJ é no sentido de que é aplicável o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor quando se tratar de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos. Súmula 568/STJ . 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2467639 SC 2023/0350304-9, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/06/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/06/2024).” Assim, rejeito a preliminar de prescrição. VOTO - MÉRITO EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: A controvérsia cinge-se na comprovação da existência e validade do negócio jurídico. É incontroverso que a relação jurídica existente entre as partes é de consumo, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Nesse sentido, é o verbete das Súmulas emitidas pelo Superior Tribunal de Justiça acerca do tema: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Em razão da hipossuficiência do autor, é cabível a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, VIII, do CDC, cabendo ao banco réu comprovar a regularidade da contratação e a inexistência de abusividade. “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. No caso, o autor provou os fatos constitutivos do seu direito ao juntar cópia do extrato bancário, que comprovam os descontos realizados pelo apelante (ID 277812879 e 277812880). Por outro lado, o réu não se desincumbiu do ônus probatório, visto que não trouxe aos autos o contrato ou qualquer outro documento que comprovasse que ele foi de fato celebrado e, consequentemente, a legalidade do desconto. Ressalta-se, que o áudio apresentado pelo apelante como prova da contratação (ID 277812886) não demonstra que o consumidor foi devidamente informado sobre os termos do contrato. O registro da conversa telefônica é genérico e não apresenta explicações claras sobre a natureza da operação, a forma de pagamento, os encargos aplicáveis e as demais cláusulas contratuais. A ausência dessas informações essenciais evidencia o descumprimento do dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor. Assim, constatado que a requerida não produziu prova apta a demonstrar a higidez da relação jurídica pactuada, mostra-se acertada a sentença, no ponto em que declarou a ilegalidade dos descontos efetuados, porquanto restou incontroversa a inexistência de relação jurídica entre as partes e a ausência de provas de filiação da autora. Nesse sentido: “[...] Não demonstrada a regularidade da contratação, considera-se inexistente a dívida, e os descontos dela decorrentes caracterizam ato ilícito passível de reparação por dano moral, que são presumidos na presente hipótese. 3. O dano moral deve ser fixado em quantia que atenda à função pedagógica, compensatória e punitiva da medida. [...] (N.U 1047553-51.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/02/2025, Publicado no DJE 12/02/2025).” Confirmado o ato ilícito (abatimentos injustificados), a ré responde pelos prejuízos morais causados, os quais, na hipótese, são presumidos (in re ipsa), dispensam comprovação. Para ilustrar: “[...] Configura falha na prestação do serviço a conduta da empresa que realiza descontos na conta corrente do consumidor, relativos a contrato de seguro cuja contratação não foi comprovada, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados indevidamente. Se ausente comprovação da origem da dívida questionada, é caso de declarar a inexistência da relação jurídica, bem como resta configurada situação geradora de danos morais. (N.U 1001447-92.2020.8.11.0011, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/10/2022, Publicado no DJE 19/10/2022).” No que diz respeito ao quantum indenizatório, deve-se levar em conta tanto as circunstâncias da lide como as condições pessoais, econômicas e financeiras das partes (art. 944 do Código Civil). Também deve estar em sintonia com o grau da ofensa moral e sua repercussão sobre os direitos de personalidade, não pode causar enriquecimento imotivado e tem de ser suficiente para inibir práticas reincidentes. À vista desses critérios, a importância definida na sentença em R$6.000,00 deve ser mantida, pois estão de acordo com o que têm aplicado o STJ e este Tribunal em situações análogas. Igualmente restou comprovado dano material, já que comprovados os descontos indevidos em conta bancária, o que gera o direito à restituição dos indevidamente descontado na forma simples. Nesse contexto: “[...] Os descontos indevidos são restituídos na forma simples quando não evidenciada a má-fé da instituição financeira (art. 42, parágrafo único, do CDC). (N.U 1001257-27.2023.8.11.0011, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/11/2024, Publicado no DJE 26/11/2024).” Por outro lado, no que concerne à aplicação dos juros e da correção monetária, a presente hipótese configura responsabilidade civil extracontratual, em razão de descontos indevidos efetuados sem qualquer consentimento da parte autora, tendo sido reconhecida judicialmente a inexistência de relação jurídica válida entre as partes. Diante da ausência de estipulação expressa quanto à taxa de juros aplicável, incide a norma legal superveniente, a qual estabelece a Taxa Selic como índice de juros moratórios. Nesse sentido: “[...] Com a vigência da Lei nº 14.905/2024, aplicam-se a taxa SELIC menos o IPCA para juros e o IPCA para correção. [...] (N.U 1022047-39.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025).” “[...] A taxa SELIC, conforme a redação dada ao art. 406 do Código Civil pela Lei nº 14.905/2024, aplica-se às condenações judiciais a título de juros e correção monetária apenas quando inexistir convenção entre as partes ou disposição legal específica. (N.U 0044357-37.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 07/04/2025).” Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, apenas para determinar que os juros moratórios incidentes sobre os danos materiais e morais sejam calculados com base na Taxa Selic, mantendo-se a sentença nos demais termos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Quarta Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017257-92.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Defeito, nulidade ou anulação] Relator: Des(a). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [SABEMI SEGURADORA SA - CNPJ: 87.163.234/0001-38 (APELANTE), JULIANO MARTINS MANSUR - CPF: 078.855.777-75 (ADVOGADO), RAIMUNDO MARIANO DA COSTA - CPF: 109.767.871-72 (APELADO), DANIELA OLIVEIRA BARBOSA - CPF: 014.884.051-58 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO TRIENAL REJEITADA. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL (ART. 27 DO CDC). MÉRITO. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DESCONTOS INDEVIDOS. DANO MORAL MANTIDO. VALOR RAZOAVEL E PROPORCIONAL. RESTITUIÇÃO DOS VALORES NA FORMA SIMPLES. CONSECTARIOS LEGAIS. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO À LEI Nº 14.905/2024. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação Cível contra sentença que julgou procedente ação declaratória de inexistência de débito c/c repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada em razão de descontos realizados em benefício previdenciário, sob alegação de contratação de seguro não reconhecida. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em: (i) saber se incide, no caso, a prescrição trienal prevista no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, ou o prazo quinquenal do art. 27 do CDC; (ii) saber se houve comprovação da contratação do seguro e a legalidade dos descontos realizados no benefício previdenciário; (iii) saber se estão presentes os requisitos para a condenação por danos morais e sua quantificação; (iv) saber se é cabível a restituição dos valores descontados; e (v) saber qual o índice aplicável para juros moratórios e correção monetária em razão da vigência da Lei nº 14.905/2024. III. Razões de decidir Preliminar: 3. A pretensão de reparação de danos decorrentes de descontos indevidos por contrato inexistente configura fato do serviço, sujeitando-se ao prazo prescricional de cinco anos, conforme o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. Mérito: 4. Diante da relação de consumo e da hipossuficiência do autor, aplicou-se a inversão do ônus da prova, cabendo à ré demonstrar a regularidade da contratação, o que não ocorreu. 5. Compete à instituição financeira o ônus de comprovar a validade da contratação e a autenticidade da manifestação de vontade do consumidor, nos termos do art. 373, II, do CPC. A ausência de prova robusta leva à manutenção da declaração de nulidade do negócio jurídico. 6. A ausência de prova da relação jurídica válida e os descontos indevidos caracterizam ato ilícito passível de reparação moral. O dano é presumido (in re ipsa), estando o valor arbitrado em consonância com a jurisprudência e os critérios do art. 944 do CC. 6. Restituição dos valores descontados indevidamente deve se dar na forma simples, diante da ausência de má-fé. 7. Em virtude da natureza extracontratual da responsabilidade, aplica-se a Taxa Selic para os juros moratórios e o IPCA para a correção monetária, conforme Lei nº 14.905/2024 e nova redação do art. 406 do Código Civil. IV. Dispositivo e tese 5. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. O prazo prescricional para ação declaratória de inexistência de débito e repetição de indébito fundada em relação de consumo é de cinco anos, nos termos do art. 27 do CDC. 2. A não comprovação da contratação do seguro torna ilegais os descontos efetuados, sendo devidos danos morais e restituição simples dos valores descontados. 3. Ausente convenção expressa quanto à taxa de juros aplicável, devem ser calculados com base na Taxa Selic, conforme a nova redação do art. 406 do Código Civil dada pela Lei nº 14.905/2024.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, arts. 186, 927, 944, 406; CDC, arts. 6º, III e VIII, 27, 42, parágrafo único; Lei nº 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2467639/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03/06/2024, DJe 06/06/2024; TJMT, N.U 1047553-51.2022.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 05/02/2025, DJE 12/02/2025; TJMT, N.U 1001447-92.2020.8.11.0011, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 13/10/2022, DJE 19/10/2022; TJMT, N.U 1001257-27.2023.8.11.0011, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 25/11/2024, DJE 26/11/2024; TJMT, N.U 1022047-39.2023.8.11.0041, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 30/04/2025, DJE 30/04/2025; TJMT, N.U 0044357-37.2015.8.11.0041, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 02/04/2025, DJE 07/04/2025. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por SABEMI SEGURADORA S/A contra a r. sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Repetição de Indébito e Indenização por Danos Morais ajuizada por RAIMUNDO MARIANO DA COSTA, julgou procedente os pedidos iniciais. Narra o autor que desde 19 de fevereiro de 2020, a empresa ré, SABEMI SEGURADORA S/A, vem realizando descontos em seu benefício previdenciário e que tais descontos seriam referentes a um contrato de seguro de acidentes pessoais que nunca ter solicitou ou contratou. A sentença (ID 277812897) julgou procedente o pedido para declarar nula a apólice de seguro nº 01.82.000330; condenar a ré ao pagamento de R$ 6.000,00 a título de danos morais; determinar a restituição, de forma simples, das parcelas indevidamente descontadas; e condenar a ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação. O Apelante, em suas razões recursais (ID 277813854), suscitou preliminar de prescrição trienal com base no Art. 206, § 3º, IV do Código Civil, por se tratar de pretensão de ressarcimento por enriquecimento sem causa. No mérito, sustenta, em síntese, a validade do contrato, que teria sido celebrado por meio de telefone. Afirma que agiu de forma diligente e sem má-fé, sendo as cobranças legítimas. Aduz a inexistência de dano moral indenizável, pois agiu no exercício regular de um direito e não negativou o nome do Apelado. Alternativamente, pugna pela redução do valor de R$ 6.000,00, por considerá-lo excessivo. Requer a improcedência do pedido de restituição dos valores, por ausência de má-fé. Por fim, pede a aplicação da nova taxa de juros legal (Taxa Selic) e correção pelo IPCA, conforme a Lei nº 14.905/2024, em substituição aos critérios definidos na sentença. Contrarrazões pelo não provimento (ID 277813857). É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO PRELIMINAR - PRESCRIÇÃO EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Defende a apelante que, na hipótese, incide o prazo prescricional de três anos do Código Civil, na medida em que “discute-se a exigibilidade de um contrato firmado entre as partes e a devolução da valores decorrentes de obrigações previstas em tal negócio jurídico, atraindo norma prevista (em hipótese expressa) do Código Civil.” Sustenta, nesse sentido a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Todavia, diversamente do que alega a apelante, nos casos relacionados às ações declaratórias de inexistência de débito relativas a contratos de seguro cuja contratação é questionada, o prazo prescricional aplicável é de cinco anos, conforme art. 27 do CDC, com início da contagem a partir do último desconto. “Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria”. Nesse mesmo sentido é a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça: “[...] Ação declaratória de inexistência de relação jurídica relativa à apólice de seguro com pedido de indenização por dano moral . 2. A jurisprudência do STJ é no sentido de que é aplicável o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor quando se tratar de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos. Súmula 568/STJ . 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2467639 SC 2023/0350304-9, Relator.: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 03/06/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/06/2024).” Assim, rejeito a preliminar de prescrição. VOTO - MÉRITO EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: A controvérsia cinge-se na comprovação da existência e validade do negócio jurídico. É incontroverso que a relação jurídica existente entre as partes é de consumo, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Nesse sentido, é o verbete das Súmulas emitidas pelo Superior Tribunal de Justiça acerca do tema: Súmula 297/STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável as instituições financeiras”. Súmula 479/STJ: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. Em razão da hipossuficiência do autor, é cabível a inversão do ônus da prova, nos termos do artigo 6º, VIII, do CDC, cabendo ao banco réu comprovar a regularidade da contratação e a inexistência de abusividade. “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. No caso, o autor provou os fatos constitutivos do seu direito ao juntar cópia do extrato bancário, que comprovam os descontos realizados pelo apelante (ID 277812879 e 277812880). Por outro lado, o réu não se desincumbiu do ônus probatório, visto que não trouxe aos autos o contrato ou qualquer outro documento que comprovasse que ele foi de fato celebrado e, consequentemente, a legalidade do desconto. Ressalta-se, que o áudio apresentado pelo apelante como prova da contratação (ID 277812886) não demonstra que o consumidor foi devidamente informado sobre os termos do contrato. O registro da conversa telefônica é genérico e não apresenta explicações claras sobre a natureza da operação, a forma de pagamento, os encargos aplicáveis e as demais cláusulas contratuais. A ausência dessas informações essenciais evidencia o descumprimento do dever de informação previsto no art. 6º, III, do Código de Defesa do Consumidor. Assim, constatado que a requerida não produziu prova apta a demonstrar a higidez da relação jurídica pactuada, mostra-se acertada a sentença, no ponto em que declarou a ilegalidade dos descontos efetuados, porquanto restou incontroversa a inexistência de relação jurídica entre as partes e a ausência de provas de filiação da autora. Nesse sentido: “[...] Não demonstrada a regularidade da contratação, considera-se inexistente a dívida, e os descontos dela decorrentes caracterizam ato ilícito passível de reparação por dano moral, que são presumidos na presente hipótese. 3. O dano moral deve ser fixado em quantia que atenda à função pedagógica, compensatória e punitiva da medida. [...] (N.U 1047553-51.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/02/2025, Publicado no DJE 12/02/2025).” Confirmado o ato ilícito (abatimentos injustificados), a ré responde pelos prejuízos morais causados, os quais, na hipótese, são presumidos (in re ipsa), dispensam comprovação. Para ilustrar: “[...] Configura falha na prestação do serviço a conduta da empresa que realiza descontos na conta corrente do consumidor, relativos a contrato de seguro cuja contratação não foi comprovada, condição que enseja a restituição, na forma simples, de valores descontados indevidamente. Se ausente comprovação da origem da dívida questionada, é caso de declarar a inexistência da relação jurídica, bem como resta configurada situação geradora de danos morais. (N.U 1001447-92.2020.8.11.0011, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/10/2022, Publicado no DJE 19/10/2022).” No que diz respeito ao quantum indenizatório, deve-se levar em conta tanto as circunstâncias da lide como as condições pessoais, econômicas e financeiras das partes (art. 944 do Código Civil). Também deve estar em sintonia com o grau da ofensa moral e sua repercussão sobre os direitos de personalidade, não pode causar enriquecimento imotivado e tem de ser suficiente para inibir práticas reincidentes. À vista desses critérios, a importância definida na sentença em R$6.000,00 deve ser mantida, pois estão de acordo com o que têm aplicado o STJ e este Tribunal em situações análogas. Igualmente restou comprovado dano material, já que comprovados os descontos indevidos em conta bancária, o que gera o direito à restituição dos indevidamente descontado na forma simples. Nesse contexto: “[...] Os descontos indevidos são restituídos na forma simples quando não evidenciada a má-fé da instituição financeira (art. 42, parágrafo único, do CDC). (N.U 1001257-27.2023.8.11.0011, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/11/2024, Publicado no DJE 26/11/2024).” Por outro lado, no que concerne à aplicação dos juros e da correção monetária, a presente hipótese configura responsabilidade civil extracontratual, em razão de descontos indevidos efetuados sem qualquer consentimento da parte autora, tendo sido reconhecida judicialmente a inexistência de relação jurídica válida entre as partes. Diante da ausência de estipulação expressa quanto à taxa de juros aplicável, incide a norma legal superveniente, a qual estabelece a Taxa Selic como índice de juros moratórios. Nesse sentido: “[...] Com a vigência da Lei nº 14.905/2024, aplicam-se a taxa SELIC menos o IPCA para juros e o IPCA para correção. [...] (N.U 1022047-39.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 30/04/2025).” “[...] A taxa SELIC, conforme a redação dada ao art. 406 do Código Civil pela Lei nº 14.905/2024, aplica-se às condenações judiciais a título de juros e correção monetária apenas quando inexistir convenção entre as partes ou disposição legal específica. (N.U 0044357-37.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 07/04/2025).” Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, apenas para determinar que os juros moratórios incidentes sobre os danos materiais e morais sejam calculados com base na Taxa Selic, mantendo-se a sentença nos demais termos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025
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11/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Quarta Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVELESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO INTIMAÇÃO DE PAUTA DE JULGAMENTO Julgamento designado para a Sessão Ordinária que será realizada entre 25 de Junho de 2025 a 27 de Junho de 2025 às 08:00 horas, no Plenário Virtual. Os pedidos de sustentação oral, preferência e envio de memoriais para os processos pautados na sessões de julgamento deverão ser realizados EXCLUSIVAMENTE por meio da ferramenta CLICKJUD (https://clickjudapp.tjmt.jus.br), conforme Portaria 353/2020-PRES. Se houver interesse na realização de sustentação oral no processo pautado no PLENÁRIO VIRTUAL, o advogado deverá peticionar e solicitar a retirada de pauta para ser julgado na sessão presencial/videoconferência, conforme Portaria n° 298/2020-PRES. Após o encerramento do Plenário Virtual, o processo será transferido para a SESSÃO PRESENCIAL, e a inscrição para sustentação oral DEVERÁ SER REALIZADA por meio da ferramenta CLICKJUD (https://clickjudapp.tjmt.jus.br). Resolução Nº 354 de 19/11/2020 Art. 7º A audiência telepresencial e a participação por videoconferência em audiência ou sessão observará as seguintes regras: (...) VI – a participação em audiência telepresencial ou por videoconferência exige que as partes e demais participantes sigam a mesma liturgia dos atos processuais presenciais, inclusive quanto às vestimentas;