Processo nº 10079374920248260084
Número do Processo:
1007937-49.2024.8.26.0084
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJSP
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Foro Regional de Vila Mimosa - 5ª Vara
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Foro Regional de Vila Mimosa - 5ª Vara | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELProcesso 1007937-49.2024.8.26.0084 - Procedimento Comum Cível - Indenização por Dano Material - Allianz Seguros S/A - Vistos, etc. I RELATÓRIO. Trata-se de ação regressiva de reparação de danos proposta por ALLIANZ SEGUROS S/A em face de ELEKTRO REDES S/A, ambas devidamente qualificadas nos autos, em que aduz a autora, em síntese, ter celebrado contratos de seguro contra danos elétricos com terceiros e, tendo estes sofrido detrimentos por ela reparados, quanto a eventos de responsabilidade objetiva da requerida, pretende ser ressarcida, por ter se sub-rogado na posição dos consumidores. Com a inicial (fls. 01/20), foram acostados documentos (fls. 21/131). A ré compareceu aos autos e ofereceu contestação, em que suscita preliminares de ausência de interesse de agir e incompetência territorial. No mérito, alega falta de comprovante de pagamento, força maior e não preenchimento dos requisitos legais ensejadores da responsabilidade civil, além da inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (fls. 141/156). Com documentos às fls. 157/349. Houve réplica (fls. 353/376). É o relatório. Fundamento e decido. II FUNDAMENTAÇÃO. O feito comporta julgamento antecipado, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, eis que, para o deslinde das questões de fato suscitadas, bastam os documentos acostados aos autos, observando-se que eventual perícia dos equipamentos danificados acaso preservados não poderia auxiliar na solução do litígio, pois teria apenas a capacidade de revelar a existência do dano e sua extensão, mas não a sua origem. A preliminar de ausência de interesse de agir não prospera, por não se fazer necessário ao ajuizamento da ação o prévio requerimento administrativo ou, ainda, o esgotamento dessa via, em especial diante da resistência manifestada pela requerida em contestação à pretensão formulada pela parte, pena de se ferir a garantia constitucional de amplo acesso à Justiça (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal). De outro turno, impossível restringir o direito do usuário ao ressarcimento dos prejuízos causados pela falha na prestação de serviços, em virtude da inobservância ao disposto na Resolução nº 414/2010, da ANEEL, que, por certo, não tem o condão de revogar preceitos de ordem legal e constitucional. Quanto à incompetência territorial não se vislumbra qualquer irregularidade, é certo que o Código de Defesa do Consumidor faculta ao consumidor o ajuizamento em seu domicílio de demandas fundadas em relação de consumo (art. 101, inciso I), como no caso. Essa norma, contudo, não afasta a regra geral, segundo a qual, "A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu" (art. 46, Código de Processo Civil). Nesse sentido, a Súmula nº 77 do E. TJSP: A ação fundada em relação de consumo pode ser ajuizada no foro do domicílio do consumidor (art. 101, I, CDC) ou no do domicílio do réu (art. 94 do CPC), de sorte que não se admite declinação de competência de ofício em qualquer dos casos". Tratando-se, pois, do domicílio da sede da ré (art. 53, inciso III, alínea a), não há de se falar em incompetência do juízo. No mérito, o pedido é parcialmente procedente. De início, a alegação de ausência de comprovante de pagamento não prospera. Os extratos de fls. 59 e 90 evidenciam o pagamento da indenização securitária, exatamente no valor postulado na inicial, R$ 8.521,53. Importante observar que, à luz do art. 786, do Código Civil, com o pagamento da indenização, houve sub-rogação da seguradora nos direitos dos segurados, de modo que todos os direitos, ações e prerrogativas daquele a quem indenizou lhe foram transferidos, na forma do art. 349, do Código Civil. Nesse sentido, a jurisprudência pacífica: A jurisprudência do STJ confere à seguradora sub-rogada os mesmos direitos, ações e privilégios do segurado a quem indenizou, nos termos do art. 988 do CC/1916, em vigor na época dos fatos deste processo (4ª Turma REsp 1162649/SP Rel. p/ Acórdão Min. Antonio Carlos Ferreira j. 13/05/2014). Assim, em se considerando que a relação entre a concessionária de energia elétrica e o usuário é de natureza consumerista, aplicam-se ao caso todas as normas e institutos estabelecidos no Código de Defesa do Consumidor, inclusive no que diz respeito à inversão do ônus da prova. Nesse sentido: Esta Corte já firmou entendimento de que, ao efetuar o pagamento da indenização ao segurado em decorrência de danos causados por terceiro, a seguradora sub-roga-se nos direitos daquele, podendo, dentro do prazo prescricional aplicável à relação jurídica originária, buscar o ressarcimento do que despendeu, nos mesmos termos e limites que assistiam ao segurado. Não se desconhece, outrossim, que a seguradora ao sub-rogar-se nos direitos e ações que competiriam ao segurado contra o autor do dano, faz jus à aplicação de todos os institutos do CDC, evidentemente, quando no caso da relação originária ser configurada como de consumo (STJ 3ª Turma AgRg no REsp 1169418/RJ Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva j. 06/02/2014). No cerne, não se pode olvidar que a ré é prestadora de serviço público de fornecimento de energia elétrica e, portanto, responde objetivamente pelos danos causados aos usuários em razão do serviço prestado, consoante dispõe o art. 37, §6º, da Constituição Federal: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. No mesmo rumo, estabelece o art. 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor: O fornecedor de serviço responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Nesse contexto, a responsabilidade da concessionária independe da prova de culpa, bastando a demonstração da sua ação ou omissão, do resultado lesivo e do nexo causal entre ambos. Incumbia à requerida, portanto, demonstrar alguma das causas excludentes da sua responsabilidade, qual seja, a inexistência de defeito na prestação do serviço ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor), ônus do qual não se desincumbiu. Com efeito, a requerida, mesmo concedida expressa e específica oportunidade para tanto, não trouxe aos autos prova capaz de refutar as alegações da autora, as quais estão corroboradas pelos laudos técnicos, orçamentos e relatório produzidos durante a fase de regulação do sinistro, que evidenciam a ocorrência dos danos, a falha no serviço prestado, consistente na oscilação de energia elétrica e o nexo de causalidade entre eles. Nem se alegue que esses documentos não podem servir como meio hábil a demonstrar o nexo de causalidade entre a falha na prestação dos serviços por parte da concessionária e os danos relatados, eis que admitidos pela própria Resolução da ANEEL, que regulamenta os pedidos administrativos de ressarcimento de danos a consumidores (art. 616 da Resolução nº 1.000/2021, em vigor desde 03/01/2022). No caso, as avaliações realizadas pelas empresas responsáveis pela análise dos equipamentos avariados revelaram - à exceção dos equipamentos do segurado MARIO BARBOSA MACIEL, que declarou, no laudo (fl. 50) que os danos em seus equipamentos decorreram de descargas elétricas atmosféricas - que estes foram danificados em razão de pico de tensão ou oscilação de energia (fls. 85). A concessionária, por sua vez, não demonstrou que os danos decorreram do uso incorreto dos equipamentos ou da má conservação das instalações elétricas internas. A mera alegação de que o sistema da requerida não detectou oscilação de energia, na data do evento, sem amparo nos relatórios de fornecimento listados no módulo 9 do PRODIST, exigidos pela regulamentação da ANEEL então vigente (Resolução Normativa nº 956/2021), não se mostra suficiente a elidir o nexo causal, como pretendido, valendo destacar que oscilação de tensão não se confunde com interrupção no fornecimento. Tenha ou não havido desligamento, tal fato não exclui a ocorrência de oscilações na rede. Demais disso, de acordo com a própria regulamentação administrativa vigente à época, a ausência de apresentação dos cinco relatórios mencionados no módulo 9 do PRODIST gera a presunção de perturbação na rede: "29. Todos os relatórios listados no item 26 devem constar no processo individualizado. Caso contrário, considera-se que efetivamente houve perturbação, devendo ser averiguada se a perturbação poderia ter causado o dano reclamado." (Resolução nº 956/2021). Evidente que a regulamentação infralegal não condiciona ou vincula o juízo, mas a documentação de monitoramento do sistema exigida da concessionária tem força probante, pois haveria de ser mantida de forma permanente e ininterrupta pela concessionária, e os registros independeriam de ter ou não havido falhas, ou mesmo de pedidos de indenização posteriores. E a existência ou não de defeitos ou problemas na rede externa de fornecimento é, precisamente, a base para a demonstração (ou exclusão) de eventual nexo de causalidade entre a prestação do serviço e o dano. Aqui, como a requerida está a negar a existência desse nexo que é pressuposto de imputação da responsabilidade , e os documentos somente a ela são acessíveis, era dela o ônus de sua juntada aos autos, na forma do art. 373, §1º, do Código de Processo Civil. Ocorre que, mesmo tomando ciência da decisão (fl. 138) com seu comparecimento espontâneo, a ré não apresentou os relatórios integrais de fornecimento de energia, como lhe competia para tanto não servindo os de fls. 334/344, que são parciais e distintos daqueles previstos pela norma -, não restando outra conclusão que não a presunção da ocorrência das perturbações que ocasionaram os danos indicados na inicial. A esse respeito, já se pronunciou a Corte bandeirante, em casos análogos: "Apelação Prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica Ação de reparação de danos proposta por seguradora sub-rogada Sentença de rejeição do pedido. Peculiar situação dos autos em que a concessionária de serviços ré, apesar do expresso requerimento nesse sentido apresentado com a petição inicial, deixou de apresentar os relatórios de fornecimento dos serviços em questão, de que trata a norma intitulada "Módulo 9 PRODIST", editada pela ANEEL e destinada à averiguação do nexo causal em pedidos de ressarcimento de danos por anomalia dos serviços. Omissão da ré trazendo presunção de que existiu a perturbação descrita na petição inicial, nos termos do disposto no item 6.2.3 da citada norma e da regra do art. 400 do CPC. Presunção corroborando a prova do nexo, em acréscimo ao que se deduz dos laudos extrajudiciais também apresentados pela autora, vista a questão à luz do princípio da facilitação do reconhecimento dos direitos do consumidor (CDC, art. 6º, VIII). Sentença reformada, com a proclamação da procedência da demanda. Anotada a necessidade de a apelante recolher a diferença do preparo, em prazo a ser fixado em primeiro grau, sob pena de inscrição na Dívida Ativa. Deram provimento à apelação, com observação." (TJSP 19ª Câmara de Direito Privado Apelação Cível 1014789-86.2020.8.26.0001 Rel. Des. Ricardo Pessoa de Mello Belli j. 08/11/2021) "EXIBIÇÃO DOCUMENTAL - Relatórios do PRODIST que podem desvendar a existência ou não de pico de tensão na rede de energia elétrica da agravada na oportunidade em que houve a queima dos equipamentos sinistrados - Admissível a prova como qualquer outro meio lícito - Ausência de exibição que implica em presunção de veracidade na forma do art. 400 do CPC - Precedentes desta Corte e do STJ - Decisão reformada - Agravo de instrumento provido para determinar a apresentação, pela concessionária de energia, dos relatórios do Módulo 9 do Prodist referentes ao tempo em que se alega ter ocorrido a descarga de energia e queima dos equipamentos, no prazo de vinte (20) dias, sob pena de presunção de veracidade dos fatos que a agravante queria provar com a exibição." (grifo nosso) (TJSP 15ª Câmara de Direito Privado Agravo de Instrumento 2204114-66.2020.8.26.0000 Rel. Des. Mendes Pereira j. 26/01/2021) "APELAÇÃO - AÇÃO DE RESSARCIMENTO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - RECURSO - SEGURO PATRIMONIAL - SOBRETENSÃO NA REDE ELÉTRICA - EQUIPAMENTO ELETROELETRÔNICO AVARIADO - INDENIZAÇÃO PAGA - REGRESSO - SUB-ROGAÇÃO DOS DIREITOS PELA SEGURADORA - ARTIGO 786 DO CC E SÚMULA Nº 188 DO STF - APRESENTAÇÃO INCOMPLETA DOS RELATÓRIOS PREVISTOS NO MÓDULO 9 DO PRODIST DA ANEEL - PRESUNÇÃO DE PERTURBAÇÃO NA REDE ELÉTRICA - SUBITEM 6.2.3 DO PROCEDIMENTO DE RESSARCIMENTO DE DANOS ELÉTRICOS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - ARTIGO 37, § 6º, DA CF - DOCUMENTOS ACOSTADOS NA INICIAL QUE CORROBORAM A TESE AUTORAL, EVIDENCIANDO, INCLUSIVE, O NEXO CAUSAL - AUSENTE IRREFRAGÁVEL CONTRAPROVA DA CONCESSIONÁRIA - DEVER DE REPARAÇÃO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO." (TJSP 14ª Câmara de Direito Privado Apelação Cível 1040044-11.2018.8.26.0100 Rel. Des. Carlos Abrão j. 12/06/2019) Nesse passo, demonstrados os danos decorrentes das oscilações no fornecimento de energia, assim como o nexo de causalidade entre a falha na prestação de serviços e os defeitos apresentados pelos aparelhos, inquestionável o dever de indenizar da ré, nos termos da Súmula 188, do Supremo Tribunal Federal: O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até o limite previsto no contrato de seguro. A indenização, contudo, deve se restringir aos danos de origem elétrica ligados à prestação do serviço, de modo que a indenização paga ao segurado MARIO BARBOSA MACIEL, tendo por decorrência danos ocasionados por descargas elétricas advindas de raio conforme informado à seguradora no laudo de fl. 50 sem qualquer correlação com a requerida, não competirão virem indenizados. Deveras, tratando-se de fortuito externo à atividade da fornecedora, rompe-se o nexo causal necessário à responsabilização. Descabido, portanto, o ressarcimento da respectiva quantia pela concessionária de energia elétrica, limitando-se a condenação à importância de R$4.700,00 (R$8.521,53 menos R$3.821,53, fl. 59). III DISPOSITIVO. Em face do exposto, e considerando o que mais dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido inicial, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para o fim de condenar a requerida ao pagamento da importância de R$4.700,00, com incidência de correção monetária e juros de mora, de 1% ao mês, desde o desembolso (v.g., STJ, 4ª Turma, AgInt no AREsp905346, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 28/08/2020). Diante da sucumbência recíproca, mas superior à ré, condeno a requerida ao pagamento de 70% das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação, na forma do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. Condeno a autora, de seu lado, ao pagamento de honorários advocatícios de 20% sobre o valor da diferença pretendida na inicial e não obtida. Publique-se, registre-se e intimem-se. - ADV: ELTON CARLOS VIEIRA (OAB 200427/SP)