Joseane Cristina Dos Santos x Tizauto Comercio De Pecas E Acessorios Autos Ltda - Me e outros
Número do Processo:
0833337-71.2017.8.15.2001
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJPB
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
14ª Vara Cível da Capital
Última atualização encontrada em
23 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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28/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14ª Vara Cível da Capital | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário da Paraíba 14ª Vara Cível da Capital PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) 0833337-71.2017.8.15.2001 [Acidente de Trânsito, Acidente de Trânsito] AUTOR: JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS REU: TIZAUTO COMERCIO DE PECAS E ACESSORIOS AUTOS LTDA - ME, ORLANDO PAIVA FILHO SENTENÇA Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REBOQUE LOCADO. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. ÔNUS DA PROVA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME 1. Ação de reparação de dano causado por acidente de veículos c/c ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por proprietária de veículo S-10 contra empresa locadora de reboque e seu representante legal, decorrente de acidente ocorrido na BR-101 quando o reboque locado supostamente estourou pneu por falta de manutenção, causando capotamento do veículo automotor, com pedido de indenização por danos materiais no valor de R$ 39.730,96 e danos morais no valor de R$ 20.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se houve defeito no reboque locado que tenha causado o acidente de trânsito; (ii) estabelecer se a autora se desincumbiu do ônus probatório quanto aos fatos constitutivos de seu direito à indenização por danos materiais e morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A configuração do dever de indenizar exige a comprovação cumulativa dos elementos da responsabilidade civil: conduta, dano, nexo causal e culpa, conforme artigos 186 e 927 do Código Civil. 4. O ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I, do CPC, devendo a autora demonstrar defeito no reboque, nexo causal com o acidente e extensão dos danos. 5. Verificou-se contradição fundamental na narrativa da autora quanto à carga transportada, alegando inicialmente "linhas de madeira", mas constando no Boletim da PRF "carregamento de areia", evidenciando inveracidade das alegações iniciais. 6. O laudo da PRF não comprova defeitos nos pneus do reboque, constando apenas "veículo acidentado" sem menção específica a pneus estourados ou em mau estado, contrariando a alegação de pneus "carecas". 7. O condutor no momento do acidente era terceira pessoa sem comprovação de habilitação válida para conduzir veículo tracionando reboque, caracterizando infração gravíssima e fator determinante para o sinistro. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Pedidos julgados improcedentes. Tese de julgamento: “ 1. O ônus da prova incumbe ao autor quanto aos fatos constitutivos de seu direito, devendo demonstrar inequivocamente a existência de defeito no equipamento locado, o nexo causal e a extensão dos danos para configurar responsabilidade civil. 2. O transporte de carga em quantidade superior à capacidade do reboque locado configura uso inadequado do equipamento e culpa exclusiva do consumidor, excluindo a responsabilidade do locador. 3. A condução de veículo tracionando reboque por pessoa sem habilitação adequada constitui fator determinante para ocorrência de acidentes e caracteriza culpa exclusiva da vítima..” ___________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 5º e 373, I; CTB, art. 162; CDC, art. 14, §3º, II. Jurisprudência relevante citada: TJPB, Apelação Cível nº 0820832-82.2016.8.15.2001, Rel. Des. Marcos William de Oliveira, 3ª Câmara Cível, j. 01.10.2022; STJ, REsp 1.168.775/RS. Vistos, etc. 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO CAUSADO POR ACIDENTE DE VEÍCULOS C/C AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada por JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS em face de TIZAUTO COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOS LTDA – ME e ORLANDO PAIVA FILHO, pelos fatos e fundamentos a seguir delineados. A autora alegou que é proprietária do veículo Chevrolet S-10 cabine dupla, ano 2014, cor cinza, placa QFB-2686, e que em 20/02/2017, alugou um reboque da empresa demandada, de placa NQD-5457, para transportar algumas linhas de madeira para uma obra que estava construindo próximo a Alhandra/PB. Relatou que, no retorno à cidade de João Pessoa/PB, o reboque, por falta de manutenção, teve um dos pneus estourados, pois estava careca, levando o veículo da autora a capotar na BR-101, Km 112. Isso ocasionou perda quase total do veículo, que não era segurado. Aduziu que seu esposo estava no carro e foi hospitalizado em razão dos ferimentos decorrentes do acidente. Sustentou que o Boletim de Ocorrência nº 17017691B01, elaborado pelo Departamento de Polícia Rodoviária Federal, aponta como causa do acidente o estouro do pneu do semirreboque. Informou que vende acarajé na praia e depende do veículo para seu trabalho, sendo o automóvel financiado. Após tentativas infrutíferas de solução administrativa, buscou a tutela jurisdicional, para obter a procedência dos pedidos, com a condenação dos demandados ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 39.730,96 (trinta e nove mil setecentos e trinta reais e noventa e seis centavos) e indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Por meio do despacho de ID. 12432576, foi determinado que a promovente juntasse o documento de propriedade do veículo avariado no acidente e comprovante de residência em seu nome, sob pena de indeferimento da inicial por ausência de documento essencial. Na mesma oportunidade, foi deferida a gratuidade judiciária à autora, determinado o agendamento de audiência de conciliação, e ordenada a citação da ré para comparecimento ou manifestação de desinteresse, bem como para apresentar contestação, sob pena de revelia. Em atendimento ao comando judicial, a promovente apresentou a complementação de documentação (ID 13337617). A empresa TIZAUTO COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOS LTDA - ME, representada legalmente por ORLANDO PAIVA FILHO, e elo próprio, apresentaram contestação (ID 14299649). Preliminarmente, suscitaram a falta de interesse de agir e ilegitimidade passiva. No mérito, aduziram que não houve ato ilícito, pois ocorreu culpa exclusiva do consumidor. Alegaram que o reboque estava em perfeito estado de conservação, com capacidade para 800 kg. Sustentaram que o condutor no momento do acidente era terceira pessoa (Severino Lima da Silva), sem comprovação de habilitação. Informaram que toda locação é precedida de vistoria e que a autora não fez reclamação quanto ao estado do equipamento. Contestaram a causa do acidente, alegando que as fotos do laudo da PRF não mostram pneus danificados. A autora transportava carga acima do limite (1 metro de areia equivalente a 52 latas, pesando aproximadamente 1.040 kg, mais 5 sacos de cimento, totalizando quase 1.300kg), sendo esta a real causa do acidente. Argumentaram que o excesso de peso constituiu a verdadeira causa do acidente, caracterizando uso inadequado do equipamento e culpa exclusiva da consumidora, nos termos do art. 14, §3º, II, do CDC. Sustentaram que o condutor abandonou o local do acidente, sendo o veículo recolhido pela PRF devido à ausência de responsável no local. Quanto aos danos materiais pleiteados, impugnaram a autenticidade dos recibos apresentados por não identificarem o emitente, requerendo sua exclusão com base no art. 428, I, do CPC. Subsidiariamente, caso reconhecida alguma responsabilidade, pugnaram pela aplicação do menor valor entre três orçamentos. Relativamente aos danos morais, alegaram ausência de comprovação de abalo psíquico relevante, tratando-se de mero dissabor insuficiente para configurar dano moral indenizável, invocando jurisprudência consolidada sobre a banalização do instituto. Por fim, os réus apresentaram reconvenção, pleiteando indenização por danos materiais no valor de R$ 3.840,00, englobando: R$ 1.000,00 pelos reparos no reboque; R$ 490,00 de dano emergente (diárias de locação não pagas); R$ 350,00 de lucros cessantes pelo período de indisponibilidade do equipamento; e R$ 2.000,00 referentes aos honorários advocatícios contratuais Impugnação à contestação apresentada (ID 17920364). Sobreveio decisão de saneamento (ID 30931584), a qual rejeitou as preliminares, indeferiu a gratuidade judiciária aos réus e deferiu prova pericial. Posteriormente, as partes informaram que os veículos foram consertados, dispensando-se a perícia (ID 31195337 e 59253314). A reconvenção foi extinta sem resolução do mérito por falta de recolhimento das custas (ID 101915739), mantida tal decisão após embargos de declaração (ID 106609647). Termo de audiência de instrução (ID 107213805). Alegações finais apresentadas pelas partes (IDs 108013271 e 108336697). Vieram-me os autos conclusos para julgamento. É o que importa relatar. Passo a decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARES Conforme já decidido na fase de saneamento através da robusta fundamentação constante no ID 30931584, as preliminares de falta de interesse de agir e ilegitimidade passiva foram devidamente rejeitadas, decisão que ora ratifico integralmente. Quanto à preliminar de falta de interesse de agir, restou consignado que o interesse processual se caracteriza pelo binômio necessidade/utilidade do provimento jurisdicional. No caso, a autora alegou ter sofrido danos materiais e morais pleiteando indenização, enquanto os réus negam responsabilidade, tornando a demanda útil e necessária. A argumentação dos contestantes confunde-se com o mérito da causa. Relativamente à ilegitimidade passiva, as condições da ação são aferidas abstratamente à luz da teoria da asserção, conforme as alegações da inicial. Os demandados possuem pertinência subjetiva à lide em razão da participação na relação jurídica referente à causa de pedir, tendo locado o reboque envolvido no acidente. Portanto, rejeito as preliminares suscitadas. DO MÉRITO Cumpre destacar que o presente processo se encontra isento de qualquer vício ou nulidade, uma vez que todo o trâmite processual obedeceu aos ditames legais, sendo oportunizado às partes a produção da prova, configurando, pois, a hipótese do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. A presente lide versa sobre responsabilidade civil extracontratual decorrente de acidente de trânsito, envolvendo reboque locado e consequente pedido de indenização por danos materiais e morais. Para adequada análise do caso, faz-se necessário examinar minuciosamente os elementos probatórios à luz da legislação pertinente e dos princípios norteadores da responsabilidade civil. Inicialmente, é imperioso ressaltar que, para a configuração do dever de indenizar, faz-se necessária a comprovação cumulativa dos elementos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta (ação ou omissão), o dano, o nexo causal e a culpa (na modalidade subjetiva), conforme preconizam os artigos 186 e 927 do Código Civil. Esta tríade é amplamente reconhecida pela doutrina e jurisprudência como requisito sine qua non para a caracterização do dever de reparar. O art. 373, I, do Código de Processo Civil é cristalino ao estabelecer que "o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito". No presente caso, cabia à autora JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS demonstrar, de forma inequívoca: a) a existência de defeito no reboque locado; b) que tal defeito foi a causa determinante do acidente; c) a extensão dos danos materiais e morais alegados; d) o nexo causal entre a suposta falha no equipamento e os prejuízos sofridos. Verifica-se contradição fundamental e insanável na narrativa da autora quanto à natureza da carga transportada. Na petição inicial (ID 8710955), alegou transportar "algumas linhas de madeira", conforme também sustentado em suas razões finais (ID 108013271). Todavia, os réus demonstraram categoricamente, em sua defesa (ID 14299649) e reiteraram em suas alegações finais (ID 108336697), que, segundo informações prestadas pela própria autora, quando da comunicação do acidente e atestado pelo Boletim de Acidente de Trânsito, a carga era composta por 1 metro de areia (equivalente a 52 latas) pesando aproximadamente 1.040 kg, mais 5 sacos de cimento de 250kg cada, totalizando quase 1.300kg. Observando-se o laudo do acidente, documento emitido pela PRF (ID 8710973 - Pág 4), verifica-se no campo denominado “descrição e informação complementares”, a seguinte resposta: “CARREGAMENTO DE AREIA VEÍCULO CARREGADO COM AREIA A GRANEL”. Esta constatação é de extrema relevância jurídica e fática, pois evidencia a inveracidade das alegações iniciais. Ademais, Embora a autora invoque o laudo da PRF (ID 8710973) como prova da causa do acidente, a análise técnica detida do documento, revela que no campo destinado à informação do "estado do veículo" e "estado geral dos pneus" do reboque consta apenas "veículo acidentado", sem qualquer menção específica a pneus estourados ou em mau estado de conservação. Ademais, pelas fotografias constantes no laudo não é possível vislumbrar defeitos ou danos nos pneus do reboque, contrariando frontalmente a alegação de que estavam "carecas e reabertos". Outro elemento de extrema relevância para o deslinde da controvérsia é o fato, evidenciado no relatório da PRF (ID 8710973 - Pág 2), de que, no momento do acidente, quem conduzia o conjunto automotor era terceira pessoa (Sr. Severino Lima da Silva), não sendo comprovado que ele possuía habilitação válida para conduzir veículo tracionando reboque. A condução de veículo automotor sem a devida habilitação constitui infração gravíssima, nos termos do art. 162 do Código de Trânsito Brasileiro, e configura fator determinante para a ocorrência de acidentes, caracterizando culpa exclusiva da vítima. Conforme decisão de ID 30931584, foi inicialmente deferida prova pericial no veículo e no reboque para averiguar a real causa do acidente e a extensão dos danos. Todavia, as partes informaram que os veículos envolvidos foram consertados (ID 31195337 e 59253314), tornando inútil e impossível a realização da perícia. Entretanto, o conjunto probatório existente nos autos, composto pelos documentos juntados, são suficientes para formar o convencimento deste juízo acerca da questão debatida. Ademais, o art. 370 do CPC confere ao juiz o poder-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Diante do exposto, conclui-se que a promovente não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, nos termos do art. 373, I, do CPC. Em consonância com o entendimento aqui exposto, a jurisprudência consolidada do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba corrobora o posicionamento adotado no caso sub examine, conforme se depreende do seguinte julgado: APELAÇÕES CÍVEIS. CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. PERDA DO OBJETO. REJEIÇÃO. VÍCIO REDIBITÓRIO. AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DO AUTOR. APLICAÇÃO DO ART. 373, I, DO CPC/2015. REFORMA DA SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. PROVIMENTO DOS APELOS. É aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de compra e venda de veículo, elaborado entre o consumidor e a concessionária, fornecedora de produtos e serviços. "A dificuldade probatória ensejada pela impossibilidade de perícia direta no veículo sinistrado, no curso da instrução do processo, não caracteriza cerceamento de defesa em relação ao fabricante" (REsp 1.168.775/RS). De plano, observa-se que deve ser reformada a sentença de procedência, tendo em vista a ausência de provas quanto aos fatos constitutivos do direito da autora, conforme estabelece o art. 373, I, do CPC/2015. (0820832-82.2016.8.15.2001, Rel. Des. Marcos William de Oliveira (aposentado), APELAÇÃO CÍVEL, 3ª Câmara Cível, juntado em 01/10/2022) Por fim, é importante ressaltar que o mero dissabor ou aborrecimento decorrente de situações corriqueiras da vida em sociedade não é suficiente para configurar dano moral indenizável, impondo-se, por consequência, o reconhecimento da improcedência do pleito. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, por consequência, DECLARO EXTINTO o processo com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência, CONDENO a promovente a arcar com as custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observado o disposto no artigo 98, §3º, do Código de Processo Civil. PUBLIQUE-SE. INTIMEM-SE. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, sem prejuízo de desarquivamento, se houver pedido de execução do julgado, caso em que deve ser evoluída a classe processual para “cumprimento de sentença”. João Pessoa/PB, data da assinatura eletrônica. ALEXANDRE TARGINO GOMES FALCÃO Juiz de Direito
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28/05/2025 - IntimaçãoÓrgão: 14ª Vara Cível da Capital | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário da Paraíba 14ª Vara Cível da Capital PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) 0833337-71.2017.8.15.2001 [Acidente de Trânsito, Acidente de Trânsito] AUTOR: JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS REU: TIZAUTO COMERCIO DE PECAS E ACESSORIOS AUTOS LTDA - ME, ORLANDO PAIVA FILHO SENTENÇA Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. REBOQUE LOCADO. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. ÔNUS DA PROVA. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. IMPROCEDÊNCIA. I. CASO EM EXAME 1. Ação de reparação de dano causado por acidente de veículos c/c ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por proprietária de veículo S-10 contra empresa locadora de reboque e seu representante legal, decorrente de acidente ocorrido na BR-101 quando o reboque locado supostamente estourou pneu por falta de manutenção, causando capotamento do veículo automotor, com pedido de indenização por danos materiais no valor de R$ 39.730,96 e danos morais no valor de R$ 20.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se houve defeito no reboque locado que tenha causado o acidente de trânsito; (ii) estabelecer se a autora se desincumbiu do ônus probatório quanto aos fatos constitutivos de seu direito à indenização por danos materiais e morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A configuração do dever de indenizar exige a comprovação cumulativa dos elementos da responsabilidade civil: conduta, dano, nexo causal e culpa, conforme artigos 186 e 927 do Código Civil. 4. O ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I, do CPC, devendo a autora demonstrar defeito no reboque, nexo causal com o acidente e extensão dos danos. 5. Verificou-se contradição fundamental na narrativa da autora quanto à carga transportada, alegando inicialmente "linhas de madeira", mas constando no Boletim da PRF "carregamento de areia", evidenciando inveracidade das alegações iniciais. 6. O laudo da PRF não comprova defeitos nos pneus do reboque, constando apenas "veículo acidentado" sem menção específica a pneus estourados ou em mau estado, contrariando a alegação de pneus "carecas". 7. O condutor no momento do acidente era terceira pessoa sem comprovação de habilitação válida para conduzir veículo tracionando reboque, caracterizando infração gravíssima e fator determinante para o sinistro. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Pedidos julgados improcedentes. Tese de julgamento: “ 1. O ônus da prova incumbe ao autor quanto aos fatos constitutivos de seu direito, devendo demonstrar inequivocamente a existência de defeito no equipamento locado, o nexo causal e a extensão dos danos para configurar responsabilidade civil. 2. O transporte de carga em quantidade superior à capacidade do reboque locado configura uso inadequado do equipamento e culpa exclusiva do consumidor, excluindo a responsabilidade do locador. 3. A condução de veículo tracionando reboque por pessoa sem habilitação adequada constitui fator determinante para ocorrência de acidentes e caracteriza culpa exclusiva da vítima..” ___________ Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 5º e 373, I; CTB, art. 162; CDC, art. 14, §3º, II. Jurisprudência relevante citada: TJPB, Apelação Cível nº 0820832-82.2016.8.15.2001, Rel. Des. Marcos William de Oliveira, 3ª Câmara Cível, j. 01.10.2022; STJ, REsp 1.168.775/RS. Vistos, etc. 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANO CAUSADO POR ACIDENTE DE VEÍCULOS C/C AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS ajuizada por JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS em face de TIZAUTO COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOS LTDA – ME e ORLANDO PAIVA FILHO, pelos fatos e fundamentos a seguir delineados. A autora alegou que é proprietária do veículo Chevrolet S-10 cabine dupla, ano 2014, cor cinza, placa QFB-2686, e que em 20/02/2017, alugou um reboque da empresa demandada, de placa NQD-5457, para transportar algumas linhas de madeira para uma obra que estava construindo próximo a Alhandra/PB. Relatou que, no retorno à cidade de João Pessoa/PB, o reboque, por falta de manutenção, teve um dos pneus estourados, pois estava careca, levando o veículo da autora a capotar na BR-101, Km 112. Isso ocasionou perda quase total do veículo, que não era segurado. Aduziu que seu esposo estava no carro e foi hospitalizado em razão dos ferimentos decorrentes do acidente. Sustentou que o Boletim de Ocorrência nº 17017691B01, elaborado pelo Departamento de Polícia Rodoviária Federal, aponta como causa do acidente o estouro do pneu do semirreboque. Informou que vende acarajé na praia e depende do veículo para seu trabalho, sendo o automóvel financiado. Após tentativas infrutíferas de solução administrativa, buscou a tutela jurisdicional, para obter a procedência dos pedidos, com a condenação dos demandados ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 39.730,96 (trinta e nove mil setecentos e trinta reais e noventa e seis centavos) e indenização por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Por meio do despacho de ID. 12432576, foi determinado que a promovente juntasse o documento de propriedade do veículo avariado no acidente e comprovante de residência em seu nome, sob pena de indeferimento da inicial por ausência de documento essencial. Na mesma oportunidade, foi deferida a gratuidade judiciária à autora, determinado o agendamento de audiência de conciliação, e ordenada a citação da ré para comparecimento ou manifestação de desinteresse, bem como para apresentar contestação, sob pena de revelia. Em atendimento ao comando judicial, a promovente apresentou a complementação de documentação (ID 13337617). A empresa TIZAUTO COMÉRCIO DE PEÇAS E ACESSÓRIOS AUTOS LTDA - ME, representada legalmente por ORLANDO PAIVA FILHO, e elo próprio, apresentaram contestação (ID 14299649). Preliminarmente, suscitaram a falta de interesse de agir e ilegitimidade passiva. No mérito, aduziram que não houve ato ilícito, pois ocorreu culpa exclusiva do consumidor. Alegaram que o reboque estava em perfeito estado de conservação, com capacidade para 800 kg. Sustentaram que o condutor no momento do acidente era terceira pessoa (Severino Lima da Silva), sem comprovação de habilitação. Informaram que toda locação é precedida de vistoria e que a autora não fez reclamação quanto ao estado do equipamento. Contestaram a causa do acidente, alegando que as fotos do laudo da PRF não mostram pneus danificados. A autora transportava carga acima do limite (1 metro de areia equivalente a 52 latas, pesando aproximadamente 1.040 kg, mais 5 sacos de cimento, totalizando quase 1.300kg), sendo esta a real causa do acidente. Argumentaram que o excesso de peso constituiu a verdadeira causa do acidente, caracterizando uso inadequado do equipamento e culpa exclusiva da consumidora, nos termos do art. 14, §3º, II, do CDC. Sustentaram que o condutor abandonou o local do acidente, sendo o veículo recolhido pela PRF devido à ausência de responsável no local. Quanto aos danos materiais pleiteados, impugnaram a autenticidade dos recibos apresentados por não identificarem o emitente, requerendo sua exclusão com base no art. 428, I, do CPC. Subsidiariamente, caso reconhecida alguma responsabilidade, pugnaram pela aplicação do menor valor entre três orçamentos. Relativamente aos danos morais, alegaram ausência de comprovação de abalo psíquico relevante, tratando-se de mero dissabor insuficiente para configurar dano moral indenizável, invocando jurisprudência consolidada sobre a banalização do instituto. Por fim, os réus apresentaram reconvenção, pleiteando indenização por danos materiais no valor de R$ 3.840,00, englobando: R$ 1.000,00 pelos reparos no reboque; R$ 490,00 de dano emergente (diárias de locação não pagas); R$ 350,00 de lucros cessantes pelo período de indisponibilidade do equipamento; e R$ 2.000,00 referentes aos honorários advocatícios contratuais Impugnação à contestação apresentada (ID 17920364). Sobreveio decisão de saneamento (ID 30931584), a qual rejeitou as preliminares, indeferiu a gratuidade judiciária aos réus e deferiu prova pericial. Posteriormente, as partes informaram que os veículos foram consertados, dispensando-se a perícia (ID 31195337 e 59253314). A reconvenção foi extinta sem resolução do mérito por falta de recolhimento das custas (ID 101915739), mantida tal decisão após embargos de declaração (ID 106609647). Termo de audiência de instrução (ID 107213805). Alegações finais apresentadas pelas partes (IDs 108013271 e 108336697). Vieram-me os autos conclusos para julgamento. É o que importa relatar. Passo a decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARES Conforme já decidido na fase de saneamento através da robusta fundamentação constante no ID 30931584, as preliminares de falta de interesse de agir e ilegitimidade passiva foram devidamente rejeitadas, decisão que ora ratifico integralmente. Quanto à preliminar de falta de interesse de agir, restou consignado que o interesse processual se caracteriza pelo binômio necessidade/utilidade do provimento jurisdicional. No caso, a autora alegou ter sofrido danos materiais e morais pleiteando indenização, enquanto os réus negam responsabilidade, tornando a demanda útil e necessária. A argumentação dos contestantes confunde-se com o mérito da causa. Relativamente à ilegitimidade passiva, as condições da ação são aferidas abstratamente à luz da teoria da asserção, conforme as alegações da inicial. Os demandados possuem pertinência subjetiva à lide em razão da participação na relação jurídica referente à causa de pedir, tendo locado o reboque envolvido no acidente. Portanto, rejeito as preliminares suscitadas. DO MÉRITO Cumpre destacar que o presente processo se encontra isento de qualquer vício ou nulidade, uma vez que todo o trâmite processual obedeceu aos ditames legais, sendo oportunizado às partes a produção da prova, configurando, pois, a hipótese do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil. A presente lide versa sobre responsabilidade civil extracontratual decorrente de acidente de trânsito, envolvendo reboque locado e consequente pedido de indenização por danos materiais e morais. Para adequada análise do caso, faz-se necessário examinar minuciosamente os elementos probatórios à luz da legislação pertinente e dos princípios norteadores da responsabilidade civil. Inicialmente, é imperioso ressaltar que, para a configuração do dever de indenizar, faz-se necessária a comprovação cumulativa dos elementos ensejadores da responsabilidade civil, quais sejam: a conduta (ação ou omissão), o dano, o nexo causal e a culpa (na modalidade subjetiva), conforme preconizam os artigos 186 e 927 do Código Civil. Esta tríade é amplamente reconhecida pela doutrina e jurisprudência como requisito sine qua non para a caracterização do dever de reparar. O art. 373, I, do Código de Processo Civil é cristalino ao estabelecer que "o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito". No presente caso, cabia à autora JOSEANE CRISTINA DOS SANTOS demonstrar, de forma inequívoca: a) a existência de defeito no reboque locado; b) que tal defeito foi a causa determinante do acidente; c) a extensão dos danos materiais e morais alegados; d) o nexo causal entre a suposta falha no equipamento e os prejuízos sofridos. Verifica-se contradição fundamental e insanável na narrativa da autora quanto à natureza da carga transportada. Na petição inicial (ID 8710955), alegou transportar "algumas linhas de madeira", conforme também sustentado em suas razões finais (ID 108013271). Todavia, os réus demonstraram categoricamente, em sua defesa (ID 14299649) e reiteraram em suas alegações finais (ID 108336697), que, segundo informações prestadas pela própria autora, quando da comunicação do acidente e atestado pelo Boletim de Acidente de Trânsito, a carga era composta por 1 metro de areia (equivalente a 52 latas) pesando aproximadamente 1.040 kg, mais 5 sacos de cimento de 250kg cada, totalizando quase 1.300kg. Observando-se o laudo do acidente, documento emitido pela PRF (ID 8710973 - Pág 4), verifica-se no campo denominado “descrição e informação complementares”, a seguinte resposta: “CARREGAMENTO DE AREIA VEÍCULO CARREGADO COM AREIA A GRANEL”. Esta constatação é de extrema relevância jurídica e fática, pois evidencia a inveracidade das alegações iniciais. Ademais, Embora a autora invoque o laudo da PRF (ID 8710973) como prova da causa do acidente, a análise técnica detida do documento, revela que no campo destinado à informação do "estado do veículo" e "estado geral dos pneus" do reboque consta apenas "veículo acidentado", sem qualquer menção específica a pneus estourados ou em mau estado de conservação. Ademais, pelas fotografias constantes no laudo não é possível vislumbrar defeitos ou danos nos pneus do reboque, contrariando frontalmente a alegação de que estavam "carecas e reabertos". Outro elemento de extrema relevância para o deslinde da controvérsia é o fato, evidenciado no relatório da PRF (ID 8710973 - Pág 2), de que, no momento do acidente, quem conduzia o conjunto automotor era terceira pessoa (Sr. Severino Lima da Silva), não sendo comprovado que ele possuía habilitação válida para conduzir veículo tracionando reboque. A condução de veículo automotor sem a devida habilitação constitui infração gravíssima, nos termos do art. 162 do Código de Trânsito Brasileiro, e configura fator determinante para a ocorrência de acidentes, caracterizando culpa exclusiva da vítima. Conforme decisão de ID 30931584, foi inicialmente deferida prova pericial no veículo e no reboque para averiguar a real causa do acidente e a extensão dos danos. Todavia, as partes informaram que os veículos envolvidos foram consertados (ID 31195337 e 59253314), tornando inútil e impossível a realização da perícia. Entretanto, o conjunto probatório existente nos autos, composto pelos documentos juntados, são suficientes para formar o convencimento deste juízo acerca da questão debatida. Ademais, o art. 370 do CPC confere ao juiz o poder-dever de determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Diante do exposto, conclui-se que a promovente não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, nos termos do art. 373, I, do CPC. Em consonância com o entendimento aqui exposto, a jurisprudência consolidada do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba corrobora o posicionamento adotado no caso sub examine, conforme se depreende do seguinte julgado: APELAÇÕES CÍVEIS. CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINARES. CERCEAMENTO DE DEFESA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. PERDA DO OBJETO. REJEIÇÃO. VÍCIO REDIBITÓRIO. AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DO AUTOR. APLICAÇÃO DO ART. 373, I, DO CPC/2015. REFORMA DA SENTENÇA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. PROVIMENTO DOS APELOS. É aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de compra e venda de veículo, elaborado entre o consumidor e a concessionária, fornecedora de produtos e serviços. "A dificuldade probatória ensejada pela impossibilidade de perícia direta no veículo sinistrado, no curso da instrução do processo, não caracteriza cerceamento de defesa em relação ao fabricante" (REsp 1.168.775/RS). De plano, observa-se que deve ser reformada a sentença de procedência, tendo em vista a ausência de provas quanto aos fatos constitutivos do direito da autora, conforme estabelece o art. 373, I, do CPC/2015. (0820832-82.2016.8.15.2001, Rel. Des. Marcos William de Oliveira (aposentado), APELAÇÃO CÍVEL, 3ª Câmara Cível, juntado em 01/10/2022) Por fim, é importante ressaltar que o mero dissabor ou aborrecimento decorrente de situações corriqueiras da vida em sociedade não é suficiente para configurar dano moral indenizável, impondo-se, por consequência, o reconhecimento da improcedência do pleito. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, por consequência, DECLARO EXTINTO o processo com apreciação do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência, CONDENO a promovente a arcar com as custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observado o disposto no artigo 98, §3º, do Código de Processo Civil. PUBLIQUE-SE. INTIMEM-SE. Com o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, sem prejuízo de desarquivamento, se houver pedido de execução do julgado, caso em que deve ser evoluída a classe processual para “cumprimento de sentença”. João Pessoa/PB, data da assinatura eletrônica. ALEXANDRE TARGINO GOMES FALCÃO Juiz de Direito
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28/05/2025 - Documento obtido via DJENSentença Baixar (PDF)