Murillo Lopes Cardoso x Anpv Brasil

Número do Processo: 0807753-16.2024.8.19.0038

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRJ
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Nova Friburgo
Última atualização encontrada em 16 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 16/06/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara Cível da Comarca de Nova Friburgo | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca de Nova Friburgo 1ª Vara Cível da Comarca de Nova Friburgo Avenida Euterpe Friburguense, 201, Centro, NOVA FRIBURGO - RJ - CEP: 28605-130 SENTENÇA Processo: 0807753-16.2024.8.19.0038 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: MURILLO LOPES CARDOSO RÉU: ANPV BRASIL I – RELATÓRIO 1 – Trata-se de processo pelo procedimento comum de que são partes o autor Murilo Lopes Cardoso e a ré ANPV Brasil, tendo o autor alegado os seguintes fatos na inicial. 2 – As partes contrataram seguro do veículo Hyundai I.30, placa EMG9E14, de propriedade de Fábio Pinto Quintanilha. 3 – Em 11 de outubro de 2023, por volta das 2h49, o autor adormeceu na direção do veículo, que sofreu perda total. 4 – Contudo, a seguradora se recusou a pagar a indenização sob alegação de excesso de velocidade, de que o condutor dormiu ao volante e de que um dos pneus não correspondia aos padrões de segurança. 5 – O autor pede a condenação da seguradora a lhe pagar a indenização contratual, no valor de R$ 40.149,00, bem como indenização por dano moral em valor a ser estabelecido pelo Judiciário. 6 – Em contestação (id. 116582217), a ré sustentou a competência do foro de Niterói para o processo e julgamento, que o proprietário do veículo deveria ocupar o polo autor e que é regular a negativa de pagamento de indenização pela condução do veículo a 147km/h, dispensando a resolução judicial, afirmando ainda que o condutor dormiu ao volante quando já imprimia alta velocidade. 7 – Em réplica (id. 135948740), o autor alegou que a velocidade aumentou após ter dormido ao volante. 8 – As partes dispensaram a produção de outras provas (ids. 154976156, 156512272 e 156722874). II – FUNDAMENTOS 9 – Tratando-se de uma relação de consumo pela adequação das participações contratuais aos tipos dos artigos 2º, ‘caput’, e 3º, ambos do CDC, rejeita-se o pedido de declínio ao foro de Niterói conforme o habitual entendimento do c. STJ: ‘DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. COMPETÊNCIA TERRITORIAL EM RELAÇÃO DE CONSUMO. ESCOLHA DE FORO. RECURSO NÃO CONHECIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que desproveu agravo de instrumento, mantendo decisão que declinou a competência para o juízo da Comarca de Fortaleza/CE. 2. O acórdão recorrido considerou que a escolha do foro de Brasília pelo consumidor foi aleatória, sem justificativa plausível, apesar de o consumidor ter a faculdade de escolher o foro competente em demandas consumeristas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se a escolha do foro de Brasília pelo consumidor, sem justificativa plausível, é admissível, considerando a faculdade de escolha do foro em demandas consumeristas. 4. Outra questão é se a alegação de celeridade processual, devido à localização de documentos no Distrito Federal, justifica a escolha do foro de Brasília. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. A jurisprudência do STJ estabelece que a competência territorial em relações de consumo é absoluta, permitindo ao consumidor ajuizar a demanda no local em que melhor possa deduzir sua defesa, escolhendo entre seu foro de domicílio, o de domicílio do réu, o de eleição ou o de cumprimento da obrigação, mas não admite escolha aleatória sem justificativa plausível. 6. A alegação de celeridade processual devido à localização de documentos no Distrito Federal não é considerada justificativa plausível, especialmente com os atuais meios eletrônicos de comunicação. 7. O entendimento da Corte de origem está em conformidade com a jurisprudência do STJ, atraindo o óbice da Súmula n. 83 do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso não conhecido. Tese de julgamento: "1. A competência territorial em relações de consumo é absoluta, permitindo ao consumidor escolher o foro, mas não admite escolha aleatória sem justificativa plausível. 2. A alegação de celeridade processual devido à localização de documentos não justifica a escolha de foro aleatório." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 6º, VIII; CPC, art. 53. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp n. 967020/MG, relator Ministro Marco Buzzi, DJe de 20/8/2018; STJ, AgInt no AREsp n. 1877552/DF, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 2/6/2022.’ (Relator Ministro João Otávio de Noronha – c. 4ª Turma – Resp 1.881.390/DF – julgamento em 24 de março de 2025) 10 – O autor é legitimado à pretensão derivada da alegação de descumprimento contratual em que é contratante do seguro, razão pela qual rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa ‘ad causam’. 11 – Rejeita-se a tese de ausência de interesse processual pela indicada resolução administrativa satisfatória, porque a resolução atendeu exclusivamente aos interesses da ré e não contou com a concordância do autor, que indicou a potencial lesão de seu direito, justificando o legítimo exercício da ação (CRFB, artigo 5º, inciso XXXV). 12 – Não há controvérsia quanto à alegação de que o acidente ocorreu porque o condutor dormiu ao volante, havendo questão de fato no que se refere à alta velocidade antecedente ao sono. 13 – Consequentemente, cabia à ré o ônus de provar sua alegação de que o condutor do veículo imprimia alta velocidade antes de dormir, suposto fato impeditivo do direito do autor (CPC, artigo 373, II), mas a ré não apresentou prova suficiente de sua alegação. 14 – Sobre o tema, apresentou apenas um relatório de aparelho rastreador (id. 116582222), insuficiente à demonstração de que o condutor, ainda consciente, imprimia velocidade incompatível com a via. 15 – No que se refere à negativa de pagamento da indenização securitária sob a alegação de que o autor dormiu ao volante, deve-se verificar se esse evento exclui a obrigação de pagamento. 16 – Diz o artigo 768 do Código Civil que ‘o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato’. 17 – Pode-se concluir que a perda do direito de garantia depende do dolo, mas outra é a opinião do mestre Sergio Cavalieri Filho: ‘Na vigência do Código de 1916, em face do disposto no seu art. 1.454, houve controvérsia quanto a ser ou não necessário conduta intencional do segurado para configurar o agravamento do risco capaz de levar à perda do direito ao seguro. Prevaleceu o entendimento no sentido da intencionalidade, agora expressamente adotado no art. 768 do Código Civil de 2002: “O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato.” Não bastará, portanto, mera imprudência ou negligência do segurado. Reforçando esse entendimento temos, ainda, o art. 799, que dispõe: “O segurador não pode eximir-se ao pagamento do seguro, ainda que da apólice conste a restrição, se a morte ou a incapacidade do segurado provier da utilização de meio de transporte mais arriscado, da prestação de serviço militar, da prática de esporte, ou de atos de humanidade em auxílio de outrem.” Mas se a mera imprudência ou negligência do segurado não basta para agravar o risco, não será preciso, todavia, chegar-se ao dolo. O termo intencionalmente constante do art. 768 indica conduta voluntária e consciente que ultrapassa os limites da culpa grave, mas sem a intenção de obter um resultado ilícito. No REsp. 1.411.430, Relator o Ministro Sanseverino, a Terceira Turma do STJ considerou caracterizado o agravamento do risco na conduta do motorista que deixou o veículo aberto e com a chave na ignição, facilitando o seu furto. “Com a devida vênia, tenho que, no presente caso, se mostra inequívoco o ‘voluntário e consciente’ agravamento do risco do objeto do contrato, que foi determinante para a subtração do veículo. Ressalte-se que o furto ocorreu às duas horas da madrugada, deixando-se o veículo com as portas abertas e a chave na ignição, não se podendo conceber que tal conduta possa ser qualificada como mero descuido do segurado. Pelo contrário, essa conduta voluntária do segurado ultrapassa os limites da culpa grave, incluindo-se nas hipóteses de agravamento do risco na linha dos precedentes desta Corte, determinando o afastamento da cobertura securitária.” (Cavalieri Filho, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil (Portuguese Edition) (p. 486). Atlas. Edição do Kindle.) 18 – Nesse sentido parece ser o entendimento do c. STJ a seguir exemplificado: ‘PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SÚMULA 182/STJ. INAPLICABILIDADE. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA DESNECESSÁRIA. SEGURO DE AERONAVE. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. RECUSA DE PAGAMENTO. ACIDENTE. ALTERAÇÃO DO PLANO DE VOO SEM AUTORIZAÇÃO. VOO NOTURNO VISUAL. AUSÊNCIA DE INSTRUMENTOS. AGRAVAMENTO INTENCIONAL DO RISCO PELO PILOTO (CC, ART. 768). EXCLUSÃO DA COBERTURA. POSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO PROVIDO. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. Não há violação dos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal de origem aprecia a controvérsia em sua inteireza e de forma fundamentada, porém em desconformidade com os interesses da parte. 2. Não caracteriza cerceamento de defesa o julgamento antecipado da lide quando o julgador constata adequadamente instruído o feito, com a prescindibilidade de dilação probatória, por se tratar de fatos provados documentalmente. 3. O art. 768 do Código Civil dispõe que o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato, sendo que "O agravamento intencional de que trata o art. 768 do Código Civil envolve tanto o dolo quanto a culpa grave do segurado, que tem o dever de vigilância (culpa ‘in vigilando’) e o dever de escolha adequada daquele a quem confia a prática do ato (culpa ‘in eligendo’)" (AgInt no AREsp 1.039.613/SP, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2020, DJe de 29/10/2020).4. No caso, o Tribunal de Justiça concluiu não ser devida a indenização securitária em razão do agravamento intencional do risco pelo piloto do helicóptero, que alterou significativamente o plano de voo sem a autorização do serviço de tráfego aéreo e realizou voo noturno visual em distância incompatível com a falta de instrumentos da aeronave. A modificação de tal entendimento, mormente considerando a existência de cláusula limitativa expressa, demandaria a interpretação da apólice e o reexame de fatos e provas, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõem as Súmulas 5 e 7 deste Pretório. 5. Agravo interno provido para, em novo exame, conhecer do agravo e negar provimento ao recurso especial.’ (Relator Ministro Raul Araújo – c. 4ª Turma – AgInt no AREsp 1.312.698/SP – julgamento em 9 de dezembro de 2024) 19 – O adormecimento é involuntário, mas previsível em hipótese de sono, não tendo o autor alegado qualquer condição específica que o tenha levado a dormir sem a precedente sonolência. 20 – Diversamente, o horário do evento reforça a indicação de que o adormecimento derivou do sono, evento natural e previsível. 21 – Significa dizer que o autor conduziu o veículo sob sonolência, em condições contrárias ao disposto no artigo 28 da Lei 9.503/97: ‘Art. 28. O condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito.’ 22 – Nesse ambiente, penso que se trate aqui de conduta que ultrapasse os limites de culpa grave, pois o autor conduziu seu veículo quando estava com sono, comportamento voluntário e consciente contra a condução segura do veículo e determinante para o agravamento do risco objeto do contrato, estando a situação, sob minha leitura, adequada ao tipo do artigo 768 do Código Civil. 23 – Consequentemente, entendo que seja legítima a negativa de pagamento da indenização securitária, significando a improcedência não só do pedido de condenação da ré ao referido pagamento, mas também ao pagamento de indenização por dano moral, pois a negativa de pagamento não é defeituosa (CDC, artigo 14, parágrafo 3º, inciso I). III – DISPOSITIVO 24 – Julgo improcedentes os pedidos e condeno o autor a pagar as despesas do processo e honorários aos eminentes advogados da ré no equivalente a 10% do valor da causa, mas conforme o artigo 98, parágrafo 3º, do CPC, em razão da gratuidade de que o autor é titular (id. 106091187). 25 – Publique-se. Intimem-se. 26 – Transitada em julgado, dê-se baixa e arquivem-se. NOVA FRIBURGO, 13 de junho de 2025. MARCUS VINICIUS MIRANDA MACHADO GONCALVES Juiz Titular
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