Processo nº 08050663020248100034

Número do Processo: 0805066-30.2024.8.10.0034

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJMA
Classe: APELAçãO CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado
Última atualização encontrada em 01 de julho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 01/07/2025 - Intimação
    Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVEL
    QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0805066-30.2024.8.10.0034 APELANTE: FLORISA PESSOA DA COSTA ADVOGADO: MARCUS ALEXANDRE DA SILVA BENJAMIM - PI18153-A APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A. ADVOGADO: NELSON MONTEIRO DE CARVALHO NETO - RJ60359-A RELATOR: DESEMBARGADOR TYRONE JOSÉ SILVA DECISÃO Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença proferida pelo Juízo de Direito do Núcleo de Justiça 4.0 – Empréstimo Consignado que julgou improcedente a ação proposta pela apelante em face do apelado. A apelante propôs a referida demanda em face do apelado, por meio da qual pretendia ressarcimento por danos morais e materiais que teria sofrido, em decorrência de cobrança de empréstimo consignado celebrado em seu nome, que diz não ter contratado. Nas razões recursais, o apelante reiterou a irregularidade da contratação e ausência de comprovante de transferência bancária, requerendo, ao final, o provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedente os pedidos formulados na inicial. Foram juntadas contrarrazões no Id. 46263657. É o relatório. Decido. Conheço do recurso de apelação sob análise, tendo em vista que reúne os pressupostos processuais objetivos e subjetivos necessários à espécie. Considerando o julgamento por esse Tribunal de Justiça do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº. 53.983/2016, que trata da matéria objeto dos presentes autos, passo à análise e decisão de forma monocrática. Verifico que a parte apelante se volta contra a sentença recorrida pugnando pela condenação do apelado nos termos postulados na inicial. No caso em questão, a apelante alegou não ter realizado empréstimo consignado questionado nos autos. O apelado, em sua peça de defesa, afirmou que a contratação do empréstimo se deu de forma regular e que os descontos são devidos. O exame dos autos revela que a sentença recorrida deve ser reformada. Nos termos do que dispõe o art. 104 do Código Civil, a validade do negócio jurídico requer agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e forma prescrita ou não defesa em lei. O art. 107 do mesmo dispositivo legal estabelece que a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. Em se tratando de pessoa analfabeta, é necessário a observância de forma prescrita em lei, conforme disposição contida no art. 595 do Código Civil, que ora transcrevo: Art. 595. No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Na espécie, verifico que o apelado juntou aos autos apenas um contrato em que consta a impressão digital do apelante e a assinatura de duas testemunhas, devendo ser destacado que o contrato em questão não foi assinado a rogo, conforme determina a lei civil e foi reiterado no IRDR já citado. Também não constato a juntada de nenhum tipo de documento que comprove o pagamento dos valores do empréstimo questionado pela apelante, especialmente porque o contrato se afigura apócrifo e não se mostra servível e idôneo para essa finalidade. Esse, inclusive, é o entendimento do STJ, senão vejamos: DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO. VALIDADE. REQUISITO DE FORMA. ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS. ART. 595 DO CC/02. PROCURADOR PÚBLICO. DESNECESSIDADE. 1. Ação ajuizada em 20/07/2018. Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto). 3. Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4. Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5. Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6. Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7. Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8. Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos – em especial, os contratos de consumo – põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo. Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9. O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato. O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10. O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse. Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11. Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput , do CC/02. Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1907394/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) Dessa forma, além do contrato ter sido celebrado com analfabeto sem as formalidades previstas em lei, a ausência de outras informações específicas sobre a forma como se deu o suposto pagamento à parte apelante não dão a certeza necessária sobre a validade dessa avença. É certo que a apelante deve contribuir com a justiça no sentido de esclarecer este ou aquele ponto relacionado ao que foi alegado pelo apelado em sua defesa. Entretanto, na espécie, não seria possível a determinação de juntada de extratos por parte da apelante para comprovar o eventual recebimento de valores do apelado, considerando que a modalidade de disponibilização do crédito prevista no contrato era ordem de pagamento. O apelado, neste caso, não comprovou a transferência dos valores ao apelante, de modo que o negócio jurídico não consta ter sido perfectibilizado, seja pela não observância das formalidade legais referentes à contratação por analfabetos, seja pela não comprovação de que os valores do empréstimo foram pagos ao apelante. A espécie se enquadra no que se denomina demanda de massa, onde se discute a celebração de contrato de empréstimo com pessoas analfabetas, idosas e de baixa renda, público suscetível de assédio para a contratação de serviços bancários. O que se tem observado nesse tipo de demanda é a negligência das instituições bancárias na celebração desses negócios jurídicos, os quais, muitas vezes, são celebrados mediante fraude ou com ausência de informações necessárias ao consumidor, dando margem a dúvidas quanto à sua efetiva celebração. Nesse aspecto, conforme entendimento do STJ, “a análise da vulnerabilidade do contratante é um “bom caminho” para uma decisão mais justa nas demandas envolvendo os analfabetos, haja vista que, embora sejam plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, necessitam, ao menos no que perquire à forma de declarar sua vontade, de serem protegidos de maneira especial”(REsp 1907394/MT). Assim, diante da irregularidade na contratação do empréstimo, tem-se que os descontos efetuados no benefício da apelante são indevidos, pelo que deverão ser ressarcidos. Os danos morais restaram caracterizados, haja vista que o apelado submeteu o apelante ao pagamento de empréstimo que não contratou. Promoveu descontos no benefício previdenciário da apelante, pessoa idosa e analfabeta, de valores que não lhe foi autorizado a cobrar, o que acarretou a diminuição dos seus parcos recursos, configurando, assim, conduta abusiva, pela qual deve responder. No que respeita ao valor dos danos morais, sua fixação deverá atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. O valor não deverá ser demasiado elevado, sob pena de incorrer-se em enriquecimento ilícito. Em contrapartida, não poderá ser fixado em valor irrisório, pois incentivaria a recalcitrância do ofensor. Tenho que a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) é adequada para a reparação do dano moral perpetrado pelo apelado, na extensão do sofrimento experimentado pela parte apelante, sendo razoável e proporcional às circunstâncias do caso concreto, não enseja enriquecimento ilícito de qualquer das partes, bem como cumpre o caráter pedagógico da indenização por dano moral. No que diz respeito ao pedido de restituição dobrada dos valores descontados indevidamente, tenho que o pleito deve ser acolhido. Dispõe o parágrafo único do art. 42 do CDC que “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. A norma legal impõe a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente como regra, que somente pode ser afastada em caso de engano justificável. Na espécie, não constato ter havido engano justificável, já que os descontos referentes ao empréstimo questionado nos autos se deram sem a necessária comprovação da contratação desse serviço, devendo o apelado adotar as medidas necessárias no seu âmbito de atuação para evitar, tanto quanto possível, a ocorrência de situações como essas. Não restando, portanto, configurado o engano justificável, a restituição em dobro dos valores descontados é medida impositiva. Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso de apelação sob análise, reformando a sentença recorrida para: 1) declarar nulo o contrato de empréstimo consignado nº. 545140452 discutido nos autos; 2) condenar o apelado a ressarcir a apelante os valores descontados do seu benefício previdenciário, referente ao empréstimo discutido, com juros de 1% ao mês e correção monetária desde a data dos descontos; 3) condenar o apelado em indenização por danos morais, que fixo em R$ 3.000,00 (três mil reais), com juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária a partir do arbitramento; 4) condenar o apelado no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Publique-se. Cumpra-se. São Luís (MA), data do sistema. Desembargador Tyrone José Silva Relator
  2. 01/07/2025 - Intimação
    Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado | Classe: APELAçãO CíVEL
    QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0805066-30.2024.8.10.0034 APELANTE: FLORISA PESSOA DA COSTA ADVOGADO: MARCUS ALEXANDRE DA SILVA BENJAMIM - PI18153-A APELADO: BANCO ITAU BMG CONSIGNADO S.A. ADVOGADO: NELSON MONTEIRO DE CARVALHO NETO - RJ60359-A RELATOR: DESEMBARGADOR TYRONE JOSÉ SILVA DECISÃO Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença proferida pelo Juízo de Direito do Núcleo de Justiça 4.0 – Empréstimo Consignado que julgou improcedente a ação proposta pela apelante em face do apelado. A apelante propôs a referida demanda em face do apelado, por meio da qual pretendia ressarcimento por danos morais e materiais que teria sofrido, em decorrência de cobrança de empréstimo consignado celebrado em seu nome, que diz não ter contratado. Nas razões recursais, o apelante reiterou a irregularidade da contratação e ausência de comprovante de transferência bancária, requerendo, ao final, o provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedente os pedidos formulados na inicial. Foram juntadas contrarrazões no Id. 46263657. É o relatório. Decido. Conheço do recurso de apelação sob análise, tendo em vista que reúne os pressupostos processuais objetivos e subjetivos necessários à espécie. Considerando o julgamento por esse Tribunal de Justiça do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº. 53.983/2016, que trata da matéria objeto dos presentes autos, passo à análise e decisão de forma monocrática. Verifico que a parte apelante se volta contra a sentença recorrida pugnando pela condenação do apelado nos termos postulados na inicial. No caso em questão, a apelante alegou não ter realizado empréstimo consignado questionado nos autos. O apelado, em sua peça de defesa, afirmou que a contratação do empréstimo se deu de forma regular e que os descontos são devidos. O exame dos autos revela que a sentença recorrida deve ser reformada. Nos termos do que dispõe o art. 104 do Código Civil, a validade do negócio jurídico requer agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e forma prescrita ou não defesa em lei. O art. 107 do mesmo dispositivo legal estabelece que a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir. Em se tratando de pessoa analfabeta, é necessário a observância de forma prescrita em lei, conforme disposição contida no art. 595 do Código Civil, que ora transcrevo: Art. 595. No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. Na espécie, verifico que o apelado juntou aos autos apenas um contrato em que consta a impressão digital do apelante e a assinatura de duas testemunhas, devendo ser destacado que o contrato em questão não foi assinado a rogo, conforme determina a lei civil e foi reiterado no IRDR já citado. Também não constato a juntada de nenhum tipo de documento que comprove o pagamento dos valores do empréstimo questionado pela apelante, especialmente porque o contrato se afigura apócrifo e não se mostra servível e idôneo para essa finalidade. Esse, inclusive, é o entendimento do STJ, senão vejamos: DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO. VALIDADE. REQUISITO DE FORMA. ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS. ART. 595 DO CC/02. PROCURADOR PÚBLICO. DESNECESSIDADE. 1. Ação ajuizada em 20/07/2018. Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto). 3. Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4. Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5. Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6. Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7. Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8. Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos – em especial, os contratos de consumo – põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo. Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9. O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato. O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10. O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse. Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11. Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput , do CC/02. Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1907394/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) Dessa forma, além do contrato ter sido celebrado com analfabeto sem as formalidades previstas em lei, a ausência de outras informações específicas sobre a forma como se deu o suposto pagamento à parte apelante não dão a certeza necessária sobre a validade dessa avença. É certo que a apelante deve contribuir com a justiça no sentido de esclarecer este ou aquele ponto relacionado ao que foi alegado pelo apelado em sua defesa. Entretanto, na espécie, não seria possível a determinação de juntada de extratos por parte da apelante para comprovar o eventual recebimento de valores do apelado, considerando que a modalidade de disponibilização do crédito prevista no contrato era ordem de pagamento. O apelado, neste caso, não comprovou a transferência dos valores ao apelante, de modo que o negócio jurídico não consta ter sido perfectibilizado, seja pela não observância das formalidade legais referentes à contratação por analfabetos, seja pela não comprovação de que os valores do empréstimo foram pagos ao apelante. A espécie se enquadra no que se denomina demanda de massa, onde se discute a celebração de contrato de empréstimo com pessoas analfabetas, idosas e de baixa renda, público suscetível de assédio para a contratação de serviços bancários. O que se tem observado nesse tipo de demanda é a negligência das instituições bancárias na celebração desses negócios jurídicos, os quais, muitas vezes, são celebrados mediante fraude ou com ausência de informações necessárias ao consumidor, dando margem a dúvidas quanto à sua efetiva celebração. Nesse aspecto, conforme entendimento do STJ, “a análise da vulnerabilidade do contratante é um “bom caminho” para uma decisão mais justa nas demandas envolvendo os analfabetos, haja vista que, embora sejam plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, necessitam, ao menos no que perquire à forma de declarar sua vontade, de serem protegidos de maneira especial”(REsp 1907394/MT). Assim, diante da irregularidade na contratação do empréstimo, tem-se que os descontos efetuados no benefício da apelante são indevidos, pelo que deverão ser ressarcidos. Os danos morais restaram caracterizados, haja vista que o apelado submeteu o apelante ao pagamento de empréstimo que não contratou. Promoveu descontos no benefício previdenciário da apelante, pessoa idosa e analfabeta, de valores que não lhe foi autorizado a cobrar, o que acarretou a diminuição dos seus parcos recursos, configurando, assim, conduta abusiva, pela qual deve responder. No que respeita ao valor dos danos morais, sua fixação deverá atender aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. O valor não deverá ser demasiado elevado, sob pena de incorrer-se em enriquecimento ilícito. Em contrapartida, não poderá ser fixado em valor irrisório, pois incentivaria a recalcitrância do ofensor. Tenho que a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) é adequada para a reparação do dano moral perpetrado pelo apelado, na extensão do sofrimento experimentado pela parte apelante, sendo razoável e proporcional às circunstâncias do caso concreto, não enseja enriquecimento ilícito de qualquer das partes, bem como cumpre o caráter pedagógico da indenização por dano moral. No que diz respeito ao pedido de restituição dobrada dos valores descontados indevidamente, tenho que o pleito deve ser acolhido. Dispõe o parágrafo único do art. 42 do CDC que “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”. A norma legal impõe a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente como regra, que somente pode ser afastada em caso de engano justificável. Na espécie, não constato ter havido engano justificável, já que os descontos referentes ao empréstimo questionado nos autos se deram sem a necessária comprovação da contratação desse serviço, devendo o apelado adotar as medidas necessárias no seu âmbito de atuação para evitar, tanto quanto possível, a ocorrência de situações como essas. Não restando, portanto, configurado o engano justificável, a restituição em dobro dos valores descontados é medida impositiva. Ante o exposto, conheço e dou provimento ao recurso de apelação sob análise, reformando a sentença recorrida para: 1) declarar nulo o contrato de empréstimo consignado nº. 545140452 discutido nos autos; 2) condenar o apelado a ressarcir a apelante os valores descontados do seu benefício previdenciário, referente ao empréstimo discutido, com juros de 1% ao mês e correção monetária desde a data dos descontos; 3) condenar o apelado em indenização por danos morais, que fixo em R$ 3.000,00 (três mil reais), com juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária a partir do arbitramento; 4) condenar o apelado no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Publique-se. Cumpra-se. São Luís (MA), data do sistema. Desembargador Tyrone José Silva Relator
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