Maria Das Vitorias Nunes Silva Lourenco x Wagner Soares Ribeiro De Amorim
Número do Processo:
0804294-47.2023.8.20.5103
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRN
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
2ª Vara da Comarca de Currais Novos
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 2ª Vara da Comarca de Currais Novos | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 2ª Vara da Comarca de Currais Novos Rua Manoel Lopes Filho, 1210, Walfredo Galvão, CURRAIS NOVOS - RN - CEP: 59380-000 Contato: (84) 36739582 - Email: csssecuni@tjrn.jus.br Processo: 0804294-47.2023.8.20.5103 SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS, ajuizada por MANOEL RIBEIRO DA SILVA e ANA LÚCIA GOMES DA SILVA, em face de FORÇA EÓLICA DO BRASIL S. A, todos qualificados nos autos, pelos fatos e fundamentos referidos na exordial. Os Autores, casados e proprietários do imóvel rural Sítio Baixa Verde, localizado na zona rural de Lagoa Nova/RN, alegam que a ré ergueu duas torres de geração de energia nas proximidades da residência dos Autores. A torre SII-03, encontra-se a 320 metros da casa dos Autores. A outra torre, cuja identificação está apagada, está situada a 270 metros do imóvel. Após a instalação e funcionamento, os autores relatam rachões e danos na casa em que moram, indicando nexo causal com a requerida, além disso, alegam também interferências prejudiciais à saúde e ao sossego das partes devido ao barulho supostamente ocasionados pelo funcionamento das torres. Em despacho de Id 111027915 foi recebida a inicial e deferida a gratuidade da justiça. A parte requerida apresentou contestação no Id 114874383. Os autores apresentaram réplica à contestação no Id 115543774. Em despacho de Id 118131064 foi determinada a realização de perícia no imóvel dos autores. Laudo pericial colacionado aos autos em documento de Id 132262000. A requerida apresentou impugnação ao laudo pericial sob Id 139959601. Os autores se manifestaram sobre a impugnação ao laudo feito pela requerida (Id 140471140). Em despacho de Id 142498481 foi determinada a intimação do perito para complementar as informações ao laudo com a indicação de valor dos danos verificados. Laudo pericial complementar colacionado aos autos em documento de Id 151121634. As partes se manifestaram sobre o laudo em Id’s 151928162 e 153020495. É o relatório. DECIDO. Inicialmente, presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, e não existindo necessidade de produção de outras provas, passo ao julgamento do mérito. DO DANO MATERIAL – DANOS ESTRUTURAIS NO IMÓVEL Conforme verifica-se da prova pericial produzida nos autos, restou comprovado que existe nexo causal entre os danos existentes na edificação dos autores e a presença das torres eólicas instaladas no entorno do imóvel. Contudo, concluiu o perito que “após diversas apreciações técnicas, foi constatada a EXISTÊNCIA de um nexo causal entre os danos existentes no imóvel e a presença do aerogerador, ambos objetos da lide; Recomenda-se que os danos existentes no imóvel objetivado, devem ser de responsabilidade de AMBOS os envolvidos, pelos seguintes motivos (…)”. O perito indicou que os danos no imóvel podem ser atribuídos da seguinte forma: Requerentes: ausência de projetos técnicos de Engenharia e/ou acompanhamento de um profissional da área, além de um método construtivo rudimentar, com falhas no dimensionamento estrutural observadas no local. Requerida: impacto da Turbina Eólica, devido ao seu peso e maquinários durante o transporte e montagem, agravando a degradação do imóvel, verificando também que todos os níveis de ruídos aferidos in loco, estão em desconformidade normativa, sendo excessivos. Dessa forma, cabe a atribuição de parcela dos danos materiais também aos autores, ou seja, o dano estrutural deve recair na proporção de 50% (cinquenta por cento) para os demandantes e 50% (cinquenta por cento) para o demandado. Levando em consideração o valor de R$ 83.000,00 (oitenta e três mil reais) quantificado pelo perito, o valor a ser pago pelo demandado pelos danos materiais causados deverá ser fixado em R$ 41.500,00 (quarenta e um mil e quinhentos reais), sendo a outra metade de responsabilidade dos próprios autores. Registre-se que não obstante a impugnação ao laudo pericial, vislumbra-se que o perito nomeado esclareceu de forma satisfatória as possíveis divergências indicadas pelas partes impugnantes, além de ter respondido aos quesitos formulados pelas partes. Nesse sentido, cumpre ressaltar que embora o Juízo não esteja vinculado ao laudo pericial, podendo embasar sua decisão em outros elementos de prova, a prova pericial assume extrema relevância em casos como o presente. Ademais, verifica-se que o trabalho pericial encontra-se devidamente fundamentado, contendo elementos suficientes para esclarecer o deslinde da demanda, tendo o perito respondido de forma satisfatória as questões alegadas pelas partes. Assim, constatada a existência do nexo causal entre o dano material e a conduta praticada pelas partes rés, a procedência em parte do pedido de danos materiais é medida que se impõe. DOS DANOS MORAIS DECORRENTES DE POLUIÇÃO SONORA A Constituição Federal, em seu art. 225, assegura a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado prevendo a responsabilização civil, penal e administrativa de quem causar lesão a esse direito difuso, erigido à categoria de direito fundamental. O artigo 23, inciso VI, de nossa Carta Magna outorgou competência comum à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. Por sua vez, a Lei Estadual nº 6.621/94, dispõe sobre o controle da poluição sonora em todo o Estado do Rio Grande do Norte. Nesse sentido, veja a disposição do artigo 1º da referida Lei: Art. 1º. É vedado perturbar a tranquilidade e o bem estar da comunidade norte-riograndense com ruídos, vibrações, sons excessivos ou incômodos de qualquer natureza emitidos por qualquer forma em que contrariem os níveis máximos fixados nesta Lei. TIPO DE ÁREA DIURNO NOTURNO Sítios e Fazendas 40 dBA 35 dBA Mista (predominantemente residencial) 55 dBA 50 dBA Industrial 70 dBA 60 dBA No caso dos autos, consta laudo técnico pericial ratificando que os ruídos sonoros produzidos pelo funcionamento das torres de energia eólica captados na residência dos autores são superiores ao permitido em Lei, e de acordo com a tabela anexada em Id 132262000 - Pág. 47, a aferição constatou níveis de ruídos em desconformidade aos critérios normativos exigidos, gerando incômodo sonoro aos autores. Nesse compasso, resta comprovado que os sons provenientes das turbinas eólicas gerenciadas pelos demandados geram incômodos na vizinhança. Nesse sentido: EMENTA: CONSTITUCIONAL E AMBIENTAL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POLUIÇÃO SONORA. CULTO RELIGIOSO. PERTURBAÇÃO DO SOSSEGO. ILÍCITO COMPROVADO. DOCUMENTOS QUE DEMONSTRAM QUE O DEMANDANTE TENTOU SOLUCIONAR POR VÁRIAS VIAS O PROBLEMA, SEM OBTER RESPOSTA POR PARTE DA DEMANDADA. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. QUANTUM INDENIZATÓRIO CONDIZENTE COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.A CF/88 expressamente prevê, em seu art. 225, caput, que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para usufruto desta e das futuras gerações. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas. Acordam os Desembargadores da Segunda Turma da Terceira Câmara Cível, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste. (REMESSA NECESSáRIA CíVEL, 0809007-27.2016.8.20.5001, Dr. JOAO BATISTA RODRIGUES REBOUCAS, Gab. Des. João Rebouças na Câmara Cível, ASSINADO em 04/05/2021) EMENTA: CONSTITUCIONAL, AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO SONORA. DIREITO AO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO. INTELIGÊNCIA DO ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ATIVIDADE QUE DEVE SE ADEQUAR AOS NÍVEIS DE POLUIÇÃO SONORA ADMITIDOS PELA LEGISLAÇÃO REGENTE. INTELIGÊNCIA DA RESOLUÇÃO Nº 01/1990 DO CONAMA C/C NBRs 10.151 E 10.152 DA ABNT. ADMISSÃO DE NÍVEIS VARIÁVEIS DE EMISSÃO SONORA, CONFORME A PARCELA DO SOLO URBANO OCUPADA. ORDENAÇÃO DO SOLO URBANO. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA DO MUNICÍPIO. ART. 30, VIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRECEDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PLANO DIRETOR DA CIDADE DO NATAL (LCM Nº 082/2007) QUE PERMITE A CONVIVÊNCIA DE MÚLTIPLAS FUNÇÕES E ATIVIDADES NA MESMA ZONA URBANA. ANÁLISE DO CASO CONCRETO. REGIÃO DE LOCALIZAÇÃO DO SESICLUBE. ÁREA MISTA, COM VOCAÇÃO COMERCIAL E ADMINISTRATIVA. PREDOMINÂNCIA DE EQUIPAMENTOS COM TAIS DESTINAÇÕES. FATO PÚBLICO E NOTÓRIO QUE PRESCINDE DA REALIZAÇÃO DE PROVA, CONFORME O ART. 374, I, DO CPC. MULTA DIÁRIA. INCOMPATIBILIDADE COM A TUTELA INIBITÓRIA DETERMINADA NA ESPÉCIE. MULTA POR CADA DESCUMPRIMENTO COMPROVADO E EVENTUAL COMANDO DE INTERDIÇÃO DO ESTABELECIMENTO. MEDIDAS QUE SE AFIGURAM MAIS ADEQUADAS AO PRESENTE CASO EM CONCRETO. ART. 536, CAPUT E § 1º, DO CPC. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O art. 225 da Constituição Federal assegura que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."2. O direito previsto no art. 225 da Magna Carta engloba também a dimensão urbanística, alusiva ao desenvolvimento das funções sociais da cidade e da garantia ao bem-estar de seus habitantes.3. O art. 3º, II, da Lei nº 6.938/81, define por "poluição" a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população, ou que criem condições adversas às atividades sociais econômicas ou lancem energias em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. 3. Demonstrado que o exercício de atividade propaga sons e ruídos acima do permitido pelas normas de regência, impõe-se a limitação da poluição sonora aos parâmetros estabelecidos nas NBRs 10.151 e 10.152 da ABNT, nos termos da Resolução nº 01/1990 do CONAMA. 4. Plano Diretor da Cidade do Natal (Lei complementar nº 082, de 21 de Junho de 2007) admite a convivência de múltiplas funções e atividades, segundo parâmetros gerais de ocupação, em duas das três macrozonas do Município, circunstância que exige a análise das condições fáticas em cada caso concreto. 5. Área de localização do SESICLUBE deve ser tomada, para fins de medição da poluição sonora estabelecidos pela NBR 10.151, como “Área mista, com vocação comercial e administrativa” dada predominância de equipamentos com tais características, coexistindo com prédios e condomínios residenciais. 6. Em se tratando de obrigação de não fazer, relacionada à observância de normas ambientais, a fixação de multa diária se revela inadequada e excessiva. Isso porque a fiscalização regular do estabelecimento, pelas autoridades competentes, não se dá em periodicidade diária, bem como a fiscalização extraordinária ocorre, em regra, mediante provocação. 7. Se revelam mais adequadas ao caso em concreto as medidas de multa por cada descumprimento (atestado pelas autoridades competentes ou mediante prova técnica a ser produzida na fase de cumprimento), e interdição do estabelecimento, esta última a ser eventualmente decretada pelo juízo da fase de cumprimento da sentença, nos termos do art. 536, caput e § 1º, do CPC.8. Conhecimento e parcial provimento da apelação cível. ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em dissonância com o parecer ofertado pela 16ª Procuradoria de Justiça, conhecer e dar provimento parcial à Apelação Cível, reformando parcialmente a sentença a quo, nos termos do voto do Relator. (APELAÇÃO CÍVEL, 0827436-76.2015.8.20.5001, Dr. CORNELIO ALVES DE AZEVEDO NETO, Gab. Des. Cornélio Alves na Câmara Cível, ASSINADO em 28/08/2019). No caso dos autos, em especial, atenta-se para o fato de que ao estabelecer o local de instalação do parque eólico a demandada deveria ter levado em consideração as residências das proximidades já construídas e habitadas, de modo a se precaver com uma distância mínima que permita o funcionamento regular do parque sem que gere incômodo sonoro aos habitantes da vizinhança. Destarte, a procedência da ação é medida de rigor. Dessa forma, verifica-se que a responsabilidade dos réus é evidente. E uma vez evidenciada a conduta ilícita dos réus, presente está o dever de indenizar. Trata-se do chamado dano in re ipsa, que “deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum”. (CAVALIERI Filho, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Atlas: 2009, p. 86.) DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PROCEDENTE EM PARTE os pedidos autorais, nos termos do art. 487, I, do CPC, para: a) CONDENAR a empresa NEOENERGIA RENOVAVEIS S.A., ao pagamento, em favor dos autores, do montante de R$ 41.500,00 (quarenta e um mil e quinhentos reais), a título de indenização por danos materiais, com base no valor estipulado pelo laudo pericial em Id 151121634. b) CONDENAR a empresa NEOENERGIA RENOVAVEIS S.A., ao pagamento, em favor dos autores, do montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), a título de indenização por danos morais decorrentes do excesso de som produzido. Em relação aos danos morais, o valor deve ser corrigido monetariamente pelo IPCA, a contar da data do arbitramento do valor na sentença, nos termos da Súmula 362 do STJ e artigo 389, § 1º, do Código Civil, acrescido de juros de mora pela taxa SELIC, deduzido o índice de atualização monetária, a partir da citação. No que toca ao dano material, deverão ser acrescidos juros de mora correspondente à Taxa Selic deduzida do IPCA ao mês, nos termos do art. 406, do Código Civil e correção monetária, ambos a partir da citação. Considerando a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, na proporção de 30% (trinta por certo) para os requerentes e 70% (setenta por cento) para a requerida, nos termos do §2º do art. 85 do Código de Processo Civil. Todavia, fica suspensa a cobrança dos autores em virtude de serem beneficiários da gratuidade judiciária. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Após o trânsito em julgado, efetuada a cobrança das custas processuais, ARQUIVE-SE. CURRAIS NOVOS/RN, data da assinatura no PJe. RICARDO ANTONIO MENEZES CABRAL FAGUNDES Juiz(a) de Direito