Rognelo Morais Dantas x Banco Bradesco S/A

Número do Processo: 0803679-93.2024.8.20.5112

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRN
Classe: APELAçãO CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Gab. Des. Amilcar Maia na Câmara Cível
Última atualização encontrada em 16 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 16/06/2025 - Intimação
    Órgão: Gab. Des. Amilcar Maia na Câmara Cível | Classe: APELAçãO CíVEL
    PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0803679-93.2024.8.20.5112 Polo ativo ROGNELO MORAIS DANTAS Advogado(s): BRUNO RAFAEL ALBUQUERQUE MELO GOMES Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): CARLOS AUGUSTO MONTEIRO NASCIMENTO EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DESCONTOS REALIZADOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO A TÍTULO DE TARIFA BANCÁRIA DENOMINADA “GASTO C CRÉDITO”. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL. INAPLICABILIDADE DOS INSTITUTOS DA SUPRESSIO E SURRECTIO NO CASO EM TELA. INÉRCIA DO CONSUMIDOR QUE NÃO PODE SER INTERPRETADA COMO AQUIESCÊNCIA, EM DECORRÊNCIA DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA CONFIANÇA ENTRE AS PARTES QUE REGEM AS RELAÇÕES DE CONSUMO. DESCUMPRIMENTO DO ÔNUS DA PROVA. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, INCISO II, DO CPC. CONTRATAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. ILEGALIDADE NOS DESCONTOS EFETUADOS NA CONTA BANCÁRIA DA PARTE CONSUMIDORA. DANO MORAL. CONSTATAÇÃO. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE, PORÉM EM VALOR MENOR DO QUE FOI PLEITEADO. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas: Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso e dar a ele provimento parcial, nos termos do voto do relator que integra o presente acórdão. RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por ROGNELO MORAIS DANTAS contra a sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Apodi/RN, que julgou improcedente a pretensão formulada nos autos da ação ordinária ajuizada em desfavor do BANCO BRADESCO S.A., com fundamento na presunção de contratação válida, reforçada pela ausência de manifestação do autor por longo período, e inexistência de provas robustas da ilicitude das cobranças ou da ocorrência de dano moral indenizável. Em suas razões, alega a parte autora, em suma, que: i) os descontos foram efetuados sem autorização ou contratação válida, sendo o ônus da prova do banco, que não apresentou instrumento contratual assinado; ii) restou caracterizado o dano moral, em razão dos descontos indevidos sobre verba alimentar, sendo inadequado o entendimento da sentença de que não houve lesão extrapatrimonial; iii) o banco não demonstrou prova da contratação válida, tampouco autorizou os débitos, impondo-se o reconhecimento da abusividade e a repetição do indébito nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. Ao final, requer o conhecimento e provimento do recurso para reformar a sentença, declarando a inexistência do débito, condenando o recorrido à restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente e ao pagamento de danos morais, conforme parâmetros sugeridos. Sem contrarrazões. Ausentes às hipóteses legais a ensejar a intervenção ministerial. É o relatório. VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso. O cerne meritório do presente recurso reside em verificar o acerto ou não da sentença que julgou improcedente a pretensão autoral com fundamento na presunção de contratação válida, reforçada pela ausência de manifestação do autor por longo período, e inexistência de provas robustas da ilicitude das cobranças ou da ocorrência de dano moral indenizável. Defende o autor, em suas razões, que foi surpreendido por descontos mensais, identificados nos extratos sob a rubrica “Gasto c Crédito”, que, segundo alega, foram realizados sem sua autorização expressão ou anuência contratual. Por fim, sustenta que tais descontos atingiram sua única fonte de sustento, o que lhe causou prejuízos de ordem moral e material. Requereu, por consequência, a declaração de inexistência dos débitos, a restituição em dobro dos valores descontados e a condenação do banco ao pagamento de indenização por danos morais. Pois bem. Como cediço, tratando-se de relação de consumo, não se pode deixar de aplicar as normas de ordem pública previstas na Lei n. 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor, especialmente o disposto em seu art. 6º, inciso VIII, podendo o Juiz de primeiro grau imputar ao fornecedor de produtos e serviços o ônus da prova, principalmente quando a produção desta pode ser mais facilmente produzida por ele. Esta regra visa instrumentalizar o magistrado em casos de ausência de prova suficiente, não importando em abusividade. Sobre o tema discutido no processo, sabe-se que dizer que a abertura e a manutenção de contas bancárias são serviços prestados pelas instituições financeiras, estando sujeitas à fiscalização e à regulamentação pelo Banco Central do Brasil. O art. 1º da Resolução nº. 3.919/2010 do Banco Central permite a cobrança de remuneração pela prestação de serviços bancários, devendo, contudo, as tarifas estarem devidamente previstas no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço autorizado previamente ou solicitado pelo cliente usuário, se não vejamos: Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário. O art. 2º da mesma Resolução dispõe que não poderá haver cobrança sobre serviços essenciais prestados à pessoa física em conta corrente de depósito à vista como: fornecimento de cartão de débito e segunda via, realização de até 04 (quatro) saques por mês em guichê de caixa ou terminal de autoatendimento, realização de até duas transferências de recurso, fornecimento de até dois extratos por mês, realização de consulta mediante utilização de internet, fornecimento de extrato consolidado, compensação de cheques e fornecimento de até dez folhas de cheques por mês. No que tange aos pacotes de serviços, a Resolução nº 3.919/2010 estipula que é obrigatória a oferta de pacote padronizado de serviços prioritários para pessoas naturais, cujo valor será cobrado mensalmente, não podendo exceder o somatório do valor das tarifas individuais. Também estabelece a referida norma que a contratação de pacote de serviços deve ser feita mediante contrato específico. Vejamos: Art. 6º É obrigatória a oferta de pacote padronizado de serviços prioritários para pessoas naturais, na forma definida na Tabela II anexa a esta resolução. § 1º O valor cobrado mensalmente pelo pacote padronizado de serviços mencionado no caput não pode exceder o somatório do valor das tarifas individuais que o compõem, considerada a tarifa correspondente ao canal de entrega de menor valor. Art. 8º A contratação de pacotes de serviços deve ser realizada mediante contrato específico. Desta forma, por ser mais vantajoso ao consumidor cliente, a resolução do Banco Central do Brasil permite o oferecimento pelas instituições financeiras de pacotes padronizados de serviços a serem prestados aos seus clientes, com tarifa unificada pela remuneração do serviço, cobrada mensalmente mediante desconto em conta bancária. Logo, a contratação do pacote de serviço, deverá ser realizada mediante contrato específico, exigindo-se a autorização e anuência do cliente, o que não ocorreu no caso concreto, mostrando-se abusivos os descontos realizados na conta bancária da parte autora. Outrossim, entendo ser inaplicável a teoria da supressio e surrectio no caso em tela, porquanto ainda que a cobrança referente à tarifa bancária não contratada tenha sido realizada durante longo período de tempo, esta decorreu de ato ilícito da ré, ante a inexistência de prova de regular contratação. A inércia do consumidor não pode ser interpretada como aquiescência, em decorrência do princípio da boa-fé objetiva e da confiança entre as partes que regem as relações de consumo. Tais institutos podem ser aplicados em contratos onde se tem paridade na relação jurídica, o que não é o caso dos autos, já que se trata de uma relação consumerista, sendo o consumidor sempre é parte vulnerável. Ademais, a cobrança de serviço não solicitado se mostra prática abusiva da instituição financeira e não pode ser revertida a seu favor. Esse é o entendimento que vem sendo adotado pela jurisprudência pátria no sentido de que a supressio não pode ser invocada contra o consumidor hipossuficiente, sobretudo, para convalidar ilegalidades ou abusividades. Relevante citar a existência de firme jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça afastando a aplicação da supressio aos casos relacionados a tarifas bancárias não contratadas, tais como: AREsp 828683, REsp 1565556, AREsp 694183 e REsp 1540889. Nesse contexto, havendo ilicitude na cobrança de serviços bancários não contratados, não tendo a instituição financeira apresentada documentação suficiente para infirmar as alegações defendidas na exordial, afigura-se correta a declaração de inexistência do pacote bancário em discussão, bem como a condenação do banco na compensação moral e repetição de indébito efetivadas na sentença. Outrossim, independentemente da utilização efetiva de outros serviços bancários além dos que seriam cabíveis para a conta-salário, tem-se que a cobrança de tarifas bancárias deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário. No caso concreto, verifica-se que foram realizados descontos indevidos na conta da parte demandante decorrentes de uma relação jurídica inexistente, o que gerou transtornos e constrangimentos, estando presentes os caracteres identificadores da responsabilidade civil e o nexo de causalidade entre eles. O dano moral decorrente da realização de contrato sem o consentimento da titular da conta, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é presumido ou in re ipsa, dispensando a prova do prejuízo, bastando para sua configuração a ocorrência dos descontos indevidos, como podemos verificar do julgado a seguir: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. FRAUDE DE TERCEIRO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANO IN RE IPSA. DANO MORAL. REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO. INVIABILIDADE. RAZOABILIDADE NA FIXAÇÃO DO QUANTUM. DECISÃO MANTIDA. 1. "As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno" (REsp n. 1.199.782/PR, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 24/8/2011, DJe 12/9/2011 - julgado sob a sistemática do art. 543-C do CPC/1973). 2. Consoante a jurisprudência desta Corte, "nos casos de protesto indevido de título ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, isto é, prescinde de prova" (REsp n. 1.059.663/MS, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Dje 17/12/2008). 3. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ). 4. O valor fixado a título de indenização por danos morais só pode ser revisto em recurso especial quando irrisório ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso. 5. Agravo interno a que se nega provimento (AgInt no AREsp 859.739/SP, Relator Ministro Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 01.09.2016). Nesse sentido, colaciono jurisprudência dessa Câmara Cível: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. PRETENDIDO RECONHECIMENTO DA NULIDADE DA COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA SOB A RUBRICA “CESTA B. EXPRESSO1”. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECONHECIMENTO DA ILEGALIDADE DOS DESCONTOS QUESTIONADOS, COM A DETERMINAÇÃO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DEVIDA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO POR PARTE DO FORNECEDOR. DANOS MORAIS IN RE IPSA. CONFIGURAÇÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO DA PARTE AUTORA (TJRN, Apelação Cível nº 0801220-84.2021.8.20.5125, rel. juíza Martha Danyelle Barbosa (convocada) substituindo desembargador Amílcar Maia, Terceira Câmara Cível, assinado em 16/02/2023). EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DE DESCONTOS INDEVIDOS. TARIFA BANCÁRIA “CESTA B. EXPRESSO”. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EVIDENCIADA. DESCONTOS CONSIDERADOS INDEVIDOS. LESÃO CONFIGURADA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. ART. 42, CDC. DESCONSTITUIÇÃO DA DÍVIDA E RESSARCIMENTO EM DOBRO DOS VALORES RETIRADOS DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. VIABILIDADE. DANO MORAL IN RE IPSA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INCIDÊNCIA DO VERBETE 479 DA SÚMULA DO STJ. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR. REFORMA DA SENTENÇA. MAJORAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO CONSOANTE OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES (TJRN, Apelação Cível nº 0800436-65.2022.8.20.5160, rel. desembargador João Rebouças, Terceira Câmara Cível, assinado em 10/03/2023). Configurada está a responsabilidade da instituição financeira pelos transtornos causados à parte demandante e, muito embora não existam critérios legais para o arbitramento do dano moral, "(a) indenização a título de dano moral inegavelmente há que se dar numa faixa dita tolerável. Se o dano causado, injustamente a outrem, integra uma faixa da ruptura das relações sadias, a reparação do mesmo não pode servir de motivo para se gerar mais uma espécie de desagregação social" (RT 758/51), impondo-se ao julgador a obrigação de zelar pelo correto arbitramento da indenização, sempre proporcional à lesão sofrida pela vítima, visando não provocar enriquecimento ilícito de quem a recebe e também desestimular pretensões indenizatórias desmotivadas. In casu, a parte autora passou por situação vexatória ao sofrer descontos em seus rendimentos, indevidamente, como se devedora fosse, sendo ainda levada a resolver o litígio pelas vias recursais, prolongando e criando gastos outros ao deslinde do problema. Assim, em atenção aos parâmetros acima delineados, bem assim, em consonância com o quantum arbitrado por esta Câmara em situações semelhantes, tenho por razoável a aplicação de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) a título de indenização por danos morais, e não no valor pretendido pela parte autora. Tenho que tal quantia encontra-se dentro dos patamares usualmente fixados por esta Câmara Cível em circunstâncias semelhantes (arbitramento de R$ 2.500,00 para cada desconto indevido decorrente de pacote de tarifa bancária não contratada): EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DESCONTOS EFETUADOS NA CONTA BANCÁRIA DO CONSUMIDOR SOB AS RUBRICAS DE “PACOTE PRIORITÁRIO” E “GASTOS CARTÃO CRÉDITO”. CONTRATAÇÕES SEM SOLICITAÇÃO OU ANUÊNCIA DA PARTE AUTORA. RELAÇÃO NEGOCIAL NÃO COMPROVADA PELO BANCO. ILEGALIDADE DOS DESCONTOS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL. INSURGÊNCIA CONTRA A AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM DANOS MORAIS E REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO DEVIDO. DEVOLUÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO (APELAÇÃO CÍVEL, 0801480-65.2024.8.20.5123, Des. Amílcar Maia, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 12/02/2025, PUBLICADO em 13/02/2025). No tocante à discussão se a repetição dos valores indevidamente adimplidos devem ser na forma simples ou em dobro, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça, ao concluir o julgamento dos Embargos de Divergência 1.413.542, uniformizou o entendimento do tribunal sobre a questão no Tema 929, sedimentando que, mediante cobrança indevida do consumidor, a repetição do indébito em dobro prevista no art. 42 do CDC não carece mais da demonstração da má-fé, mas, apenas, da configuração de conduta contrária a boa-fé, nos termos do aresto que destaco a seguir: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC. REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015. [...] TESE FINAL 28. Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29. Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão. RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 30. Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada. Impõe-se a devolução em dobro do indébito. CONCLUSÃO 31. Embargos de Divergência providos (STJ - EREsp: 1413542 RS 2013/0355826-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 21/10/2020, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 30/03/2021). Nesse sentido, afastando a necessidade de comprovação de má-fé, o STJ fixou a seguinte tese: “A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo”. Desse modo, verifica-se que a repetição do indébito em dobro se demonstra cabível independentemente da demonstração de má-fé por parte do fornecedor, desde que consubstanciada cobrança indevida advinda de conduta contrária à boa-fé objetiva. Contudo, o citado paradigma teve seus efeitos modulados para a repetição do indébito em dobro, independente de má-fé, somente para as cobranças realizadas após a data da publicação do acórdão, que se deu em 30/03/2021. Sendo assim, conclui-se que, para as cobranças indevidas anteriores à publicação do supratranscrito acórdão subsiste a necessidade da demonstração da efetiva violação da boa-fé objetiva. Na hipótese dos autos, o banco demandado não comprovou que o erro ocorrido no caso concreto é justificável, tendo em vista que não apresentou instrumento contratual para afastar referida alegação, ônus que lhe competia, evidenciando a existência de defeito na prestação do serviço bancário em tela, materializado na cobrança abusiva de serviço não contratado, de modo que aplica-se o parágrafo único, do art. 42, do CDC, para condenar a instituição bancária a restituir em dobro os valores pagos indevidamente ao consumidor. Ante o exposto, dou provimento parcial ao apelo, reformando a sentença, para: a) DECLARAR a inexistência da relação contratual que ensejou a cobrança da tarifa bancária sob a rubrica impugnada “GASTO C CREDITO”; b) CONDENAR o banco demandado a restituir, em dobro, os valores descontados indevidamente em conta bancária, cuja apuração ocorrerá em sede de cumprimento de sentença, com correção monetária, pelo INPC, desde o efetivo prejuízo, e juros de mora de 1% ao mês (art. 406 do CC), desde o evento danoso (Súmula 54/STJ), observada a prescrição quinquenal; c) CONDENAR o banco demandado ao pagamento de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), a título de danos morais em favor da parte autora, acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso, e correção monetária, pelo INPC, contada a partir da publicação do acórdão. Outrossim, a partir da vigência da Lei nº 14.905/2024, a quantia devida será atualizada pela variação do IPCA, nos termos do art. 389, parágrafo único, do Código Civil, e acrescida de juros de mora, na forma do art. 406, § 1º, também do Código Civil (SELIC com dedução do índice de atualização monetária de que trata o art. 389, parágrafo único, do Código Civil). Estabeleço, por fim, que o ônus sucumbencial fixado na origem será suportado de forma exclusiva pelo banco, contudo, o percentual dos honorários advocatícios incidirá sobre o valor atualizado da condenação. É como voto. Natal/RN, 2 de Junho de 2025.
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