Phelipe Lourenco Silva x Aguas Do Rio 1 Spe S.A
Número do Processo:
0802368-58.2025.8.19.0004
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJRJ
Classe:
PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
4ª Vara Cível da Comarca de São Gonçalo
Última atualização encontrada em
24 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
24/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 4ª Vara Cível da Comarca de São Gonçalo | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVELPoder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca de São Gonçalo 4ª Vara Cível da Comarca de São Gonçalo Rua Doutor Getúlio Vargas, 2512, 4º Andar, Barro Vermelho, SÃO GONÇALO - RJ - CEP: 24416-000 SENTENÇA Processo: 0802368-58.2025.8.19.0004 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: PHELIPE LOURENCO SILVA RÉU: AGUAS DO RIO 1 SPE S.A PHELIPE LOURENCO SILVA ajuizou ação em face de ÁGUAS DO RIO 1 SPE S.A sob alegação de que a ré passou a realizar cobranças a título de esgotamento sanitário a partir de novembro de 2024 sem que haja a devida prestação do serviço. Pretende o cancelamento da cobrança da taxa de esgoto; que a ré se abstenha de fazer novas cobranças; devolução em dobro do valor pago a título de esgoto; indenização por danos morais. Deferida gratuidade de justiça no id 170926989. Em contestação apresentada no index 192058359, alega que as cobranças realizadas são feitas com base no cadastro da CEDAE e que não houve oposição por parte do autor até o ajuizamento desta ação. Que não houve cobrança indevida. Que retirou a cobrança de esgoto da fatura do autor assim que questionada. Que agiu rápido e sem má-fé. Que estão disponíveis as etapas de coleta e transporte de esgoto na região onde reside o autor, havendo legalidade da cobrança da tarifa. Refuta a existência dos danos morais aduzidos na inicial e pugna pela improcedência dos pedidos. Consta réplica nos autos, na qual aponta que as cobranças pelo serviço de esgotamento sanitário persiste (id 193800190). As partes afirmaram não haver outras provas a produzir, pugnando pelo julgamento antecipado do feito. É o relatório, passo a decidir. A lide comporta julgamento antecipado, posto que é desnecessária a produção de prova em audiência, na forma do art. 355, inciso I do CPC. Portanto, suficientes as provas apresentadas para a prolação de sentença. As partes se subsumem aos conceitos de consumidor e fornecedor previstos nos arts. 2º e 3º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, sendo este o diploma legal aplicável à espécie. Inicialmente, ressalto que a ré apresentou defesa com alegações controversas, haja vista que, em um primeiro momento, afirma que a cobrança de esgoto foi suspensa assim que questionada. Porém, mais adiante, sustenta que a cobrança está correta e que estão disponíveis as etapas de coleta e transporte de esgoto na região onde reside o autor, havendo legalidade da cobrança da tarifa. Todavia, não comprova que, de fato, existe quaisquer das etapas da prestação do serviço. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou, por ocasião do julgamento do Resp 1.339.313/RJ, em sede de recurso repetitivo, firmando entendimento acerca da legitimidade da cobrança, ainda que apenas uma das etapas do serviço esteja sendo cumprida, in verbis: ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SERVIÇO DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COLETA E TRANSPORTE DOS DEJETOS. INEXISTÊNCIA DE REDE DE TRATAMENTO. TARIFA. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. 1. Não há violação do artigo 535 do CPC quando a Corte de origem emprega fundamentação adequada e suficiente para dirimir a controvérsia. 2. À luz do disposto no art. 3º da Lei 11.445/2007 e no art. 9º do Decreto regulamentador 7.217/2010, justifica-se a cobrança da tarifa de esgoto quando a concessionária realiza a coleta, transporte e escoamento dos dejetos, ainda que não promova o respectivo tratamento sanitário antes do deságue. 3. Tal cobrança não é afastada pelo fato de serem utilizadas as galerias de águas pluviais para a prestação do serviço, uma vez que a concessionária não só realiza a manutenção e desobstrução das ligações de esgoto que são conectadas no sistema público de esgotamento, como também trata o lodo nele gerado. 4. O tratamento final de efluentes é uma etapa posterior e complementar, de natureza sócio-ambiental, travada entre a concessionária e o Poder Público. 5. A legislação que rege a matéria dá suporte para a cobrança da tarifa de esgoto mesmo ausente o tratamento final dos dejetos, principalmente porque não estabelece que o serviço público de esgotamento sanitário somente existirá quando todas as etapas forem efetivadas, tampouco proíbe a cobrança da tarifa pela prestação de uma só ou de algumas dessas atividades. Precedentes: REsp 1.330.195/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJe 04.02.2013; REsp 1.313.680/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJe 29.06.2012; e REsp 431121/SP, Rel. Min. José Delgado, Primeira Turma, DJ 07/10/2002. 6. Diante do reconhecimento da legalidade da cobrança, não há o que se falar em devolução de valores pagos indevidamente, restando, portanto, prejudicada a questão atinente ao prazo prescricional aplicável as ações de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto. 7. Recurso especial provido, para reconhecer a legalidade da cobrança da tarifa de esgotamento sanitário. Processo submetido ao regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.339.313 - RJ (2012/0059311-7) RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES). Julgado em 12 de junho de 2013). Todavia, há que se considerar o julgamento do REsp nº 1.801.205/RJ, datado de 03/12/2019, quando a Segunda Turma do Colendo Superior Tribunal de Justiça entendeu pelo descabimento da cobrança da tarifa de esgoto, quando não coletados os dejetos ou despejados in natura nas galerias pluviais, conforme segue a emenda do Acórdão: ADMINISTRATIVO. TARIFA DE ESGOTO. DIREITO SANITÁRIO. DIREITO AMBIENTAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PRESTAÇÃO PARCIAL DE SERVIÇOS. COBRANÇA DE TARIFA. TEMA JULGADO PELO RITO DO ART. 543-C DO CPC (RECURSOS REPETITIVOS). RESP 1.339.313/RJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. ART. 42 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 1. Trata-se, na origem, de Ação de Repetição de Indébito decorrente da cobrança, pela recorrida, da tarifa de tratamento de esgoto, apesar de, na localidade, não existir a prestação de serviço público de esgotamento.2. Não se configura a ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil/1973, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, em conformidade com o que lhe foi apresentado. 3. No julgamento do REsp 1.339.313/RJ, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC, o STJ fixou o entendimento de que se afigura legal a cobrança de tarifa de esgoto, ainda quando detectada a ausência ou deficiência do tratamento dos resíduos coletados, se outros serviços, caracterizados como de esgotamento sanitário, forem disponibilizados aos consumidores. 4. Na ocasião, firmou-se a tese de que "a legislação que rege a matéria dá suporte à cobrança da tarifa de esgoto mesmo ausente o tratamento final dos dejetos, principalmente porque não estabelece que o serviço público de esgotamento sanitário somente existirá quando todas as etapas forem efetivadas, tampouco proíbe a cobrança da tarifa pela prestação de uma só ou de algumas dessas atividades" e de que "tal cobrança não é afastada pelo fato de serem utilizadas as galerias de águas pluviais para a prestação do serviço, uma vez que a concessionária não só realiza a manutenção e desobstrução das ligações de esgoto que são conectadas no sistema público de esgotamento, como também trata o lodo nele gerado". 5. Sob o tríplice enfoque – do Direito Ambiental, do Direito Sanitário e do Direito do Consumidor –, descabe cobrar por esgoto não coletado ou despejado in natura nas galerias pluviais. Neste último caso, a questão deixa de ser de tratamento de resíduos e se transforma em poluição pura e simples, o que implica, para o Poder Público e suas concessionárias, responsabilidade civil ambiental, e não direito a pagamento por serviços inexistentes. Sem dúvida, não foi intuito do Recurso Repetitivo (REsp 1.339.313/RJ) transformar inadmissível ilícito antissanitário, antiambiental e anticonsumerista em lícito contratual remunerado, pois não se equivalem, de um lado, o uso das galerias pluviais para escoamento de esgoto tratado e, do outro, a poluição das galerias pluviais, dos rios e do mar com efluentes sem qualquer forma de tratamento, nem mesmo primário. Essa a (correta) leitura que se deve fazer do Repetitivo, no ponto em que alude à possibilidade de utilização de galerias pluviais. Em outras palavras, seu emprego se legitima somente quando os efluentes nelas lançados estão devidamente tratados, etapa fundamental do chamado saneamento básico, não bastando o mero recolhimento e descarte. 6. A questão da devolução em dobro foi, na hipótese dos autos, analisada à luz da prova e das peculiaridades do caso concreto. Incide, pois, neste caso, a Súmula 7/STJ. 7. Recurso Especial não provido. Fato é que o atual entendimento d E. Superior Tribunal de Justiça é no sentido da legalidade da cobrança, em que pese o serviço não seja prestado em sua integralidade. Todavia, a fim de se evitar o enriquecimento sem causa da autarquia e restabelecer o equilíbrio da relação consumerista, se não demonstrada a efetiva prestação do serviço em sua completude, o valor da tarifa não pode ser cobrado integralmente. Portanto, sendo possível a exigência da tarifa como contraprestação pela parcela do serviço, há de se reconhecer que tal exigência há de guardar proporcionalidade com o serviço efetivamente prestado. Não pode a concessionária ré exigir a cobrança integral da parcela de esgotamento sanitária, cujo serviço não é integralmente prestado. No caso em voga, não restou comprovado pela concessionária a existência das etapas de esgotamento, seja ela integral ou parcial. Ademais, tem prevalecido a ideia de que, sob o enfoque ambiental, é descabida a cobrança da tarifa cheia, se o serviço público de esgotamento sanitário é inexistente ou, ainda que coletado, é despejado in natura nas galerias pluviais. À ré cabe demonstrar a inexistência de defeito na prestação dos serviços, nos termos do art. 14, parágrafo 3º do CDC, ônus do qual não se desincumbiu. Há que ser ressaltado que a ré que efetua a prestação dos serviços e a consequente cobrança e é quem deve demonstrar a sua regularidade, posto que o consumidor não tem qualquer forma de constatar eventual erro ou de impedir a sua ocorrência. Portanto, tenho que a ré não se desincumbiu do seu ônus de demonstrar a regularidade na prestação do serviço de esgotamento sanitário em nenhuma de suas fases, na forma do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil, evidenciando a irregularidade da cobrança por serviço que não é prestado, o que caracteriza inegável enriquecimento sem causa. Faz jus a autora à restituição do valor pago pelo serviço de esgoto de forma indevida. Por fim, os danos morais pretendidos pela parte demandante existem in re ipsa, de tal forma que, demonstrado o fato, comprovados também os danos. O valor da indenização por danos morais deve ser apurado segundo o prudente arbítrio do magistrado, através de critérios de razoabilidade e proporcionalidade, de modo a ensejar uma compensação pelo dano produzido, mas também uma punição, e deve a indenização se revestir de um caráter pedagógico e profilático, de tal monta que iniba o ofensor de repetir seu comportamento. Isto posto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para condenar a ré a: I) Pagar à autora, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de mora e correção monetária desde a sentença. II) Cancelar a cobrança e restituir ao autor o valor efetivamente pago pelo serviço de esgotamento sanitário, o qual não foi prestado, acrescido de juros de mora e correção monetária a contar do desembolso. Em consequência, julgo extinto o feito, na forma do artigo 487, I, do CPC. Diante do princípio da causalidade, condeno a ré ao pagamento das despesas judiciais e honorários advocatícios, estes fixados em 15% sobre o valor da condenação. Com o trânsito em julgado, devidamente certificados, dê-se baixa e remetam-se os autos à Central de Arquivamento. P. R. I. SÃO GONÇALO, 23 de junho de 2025. FABIANO REIS DOS SANTOS Juiz Substituto