Ministerio Publico Do Estado Do Rio De Janeiro e outros x Gabriel Da Silva Da Costa

Número do Processo: 0800935-14.2025.8.19.0038

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJRJ
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Grau: 1º Grau
Órgão: 1ª Vara Criminal da Comarca de Nova Iguaçu
Última atualização encontrada em 30 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 30/06/2025 - Intimação
    Órgão: 1ª Vara Criminal da Comarca de Nova Iguaçu | Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
    Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca de Nova Iguaçu 1ª Vara Criminal da Comarca de Nova Iguaçu Avenida Doutor Mário Guimarães, 968, Centro, NOVA IGUAÇU - RJ - CEP: 26255-230 SENTENÇA Processo: 0800935-14.2025.8.19.0038 Classe: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) AUTOR: RIO DE JANEIRO SECRETARIA DE EST. DE SEGURANCA PUBLICA, MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RÉU: GABRIEL DA SILVA DA COSTA I – RELATÓRIO 1.Ação penal pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro em face de GABRIEL DA SILVA DA COSTA(réu acautelado por estes autos, D.N. 12/01/2005 e com 20 anos de idade na data dos fatos), qualificado nos autos, imputando-lhe a prática das condutas descritas no art. 157, §2º, inciso II, §2º-A, inciso I, e §3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II; art. 180 e art. 311, §2º, inciso III, todos do Código Penal (CP), além do art. 15 da Lei 10.826/2023 (Estatuto do Desarmamento – ED), todos em concurso material, em razão do seguinte enunciado fático contido em seu ADITAMENTO: “No dia 09 de janeiro de 2025, por volta das 18h, na Rua Machado Coelho, altura do nº 61, Vila São Luís, nesta Comarca, o denunciado e outros dois indivíduos não identificados, com vontade livre e consciente, em comunhão de ações e desígnios, mediante grave ameaça exercida com o emprego de uma arma de fogo e através de palavras de ordem, além de violência consistente em efetuar disparos de arma de fogo na direção das vítimas WASHINGTON KUNZEL DA SILVA e seu filho Gustavo Franco Kunzel da Silva, de 17 anos,tentou subtrair, para si ou para outrem, a motocicleta Triumph/Tiger Sport, de cor branca, placa SRG5I85,da vítima WASHINGTON, conforme termos de declaração das testemunhas policiais aos IDs 165310837 e 165310839, além do termo de declaração da vítima ID 165310836 Apesar dos disparos de arma de fogo realizados pelos autores na direção das vítimas, o resultado morte não se consumou diante da reação de Washington, bombeiro militar que estava com arma cujo porte era autorizado, não sendo, também, seus bens subtraídos. DO CRIME DE DISPARO DE ARMA DE FOGO (art. 15, da Lei nº 10.826/2003) Nas mesmas circunstâncias de tempo e de local, o DENUNCIADO, em comunhão de ações e desígnios com dois comparsas não identificados, de forma consciente e voluntária, disparou arma de fogo em lugar habitado. DO CRIME DE RECEPTAÇÃO (art. 180, caput, do Código Penal) Em data e local não precisados nos autos, sendo certo que a constatação delitiva se deu em 09 de janeiro de 2025, por volta de 17 horas e 30 minutos, na Rua Machado Coelho, altura do nº 61, Vila São Luis, nesta Comarca, o DENUNCIADO, agindo de forma livre, consciente e voluntária, recebeu e conduziu, em proveito próprio ou alheio, a motocicleta HONDA, placas de identificação originais RJP7G45, chassi nº 9C2PC4920PR000603, ostentando a placa RJA7I86, veículo que sabia ser produto de crime de roubo, conforme resultado de consulta à base de dados BIN (laudo de exame em veículo automotor de id. 166948126). DO CRIME DE ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO (art. 311, §2º, III, do Código Penal) Em data, horário e local não precisados nos autos, sendo certo que a constatação delitiva se deu nas mesmas circunstâncias de tempo e de local descritas no parágrafo anterior, o DENUNCIADO, de forma livre, consciente e voluntária, suprimiu, em proveito próprio ou alheio, a placa de identificação a motocicleta HONDA, placa de identificação original RJP7G45, uma vez que esta fora substituída pela placa RJA7I86, conforme laudo pericial de id. 166948126. Por ocasião dos fatos, a vítima trafegava pela via acima informada com seu filho na garupa da motocicleta Triumph/Tiger Sport, momento em que foi abordada pelo denunciado e seus comparsas, de modo que o denunciado estava sozinho a bordo da motocicleta CB 500X, PRATA ostentando a PLACA RJA-7I86 e seus dois comparsas em outra motocicleta. Ato contínuo, o denunciado emparelhou com o veículo da vítima e o fechou, ocasião em que anunciou o assalto, tendo então reconhecido a vítima como bombeiro militar. Em seguida, alertou os seus comparsas, que efetuaram disparos de arma de fogo na direção de Washington e de seu filho.A vítima, temendo por sua vida e a vida de seu filho que estava na garupa, revidou a injusta agressão e efetuou disparos com a sua arma de fogo, evitando a consumação do resultado morte e da subtração de seus bens, momento em que os agentes empreenderam fuga. Logo em seguida, a vítima passou pela rua Machado Coelho e avistou o denunciado sozinho com uma arma de fogo em seu poder e logrou rendê-lo, detendo-o no local até a chegada da polícia militar. Então, os policiais abordaram denunciado e todos foram conduzidos à apreciação da Autoridade Policial. Em consulta aos dados veiculares, foi constatado que a motocicleta é produto de roubo ocorrido em data anterior, bem como que a placa que ostentava divergia da original.” 2.Ao final, requer a condenação do réu nas sanções penais e “seja fixado um valor a título de indenização mínima pelos danos de qualquer natureza sofridos pela vítima, inclusive moral, em valor não inferior a um salário-mínimo”. 3.A denúncia (id 169197341)está instruída com o procedimento policial nº 052-00333/2025, a qual contém: auto de prisão em flagrante (id 165310834); registro de ocorrência (id 165310835); termo de declaração da vítima Washington K. da Silva (id 165310836); termo de declaração da testemunha PMERJ Marcos Escramozino (id 165310837); termo de declaração do suposto autor do fato Gabriel (id 165310838); termo de declaração da testemunha PMERJ Roberto M. M. Ribeiro (id 165310839); auto de apreensão da arma de fogo, do carregador, das munições e da motocicleta (id 165310840); auto de encaminhamento do carregador portátil (id 165310841); auto de encaminhamento de 100 reais em espécie (id 165310849); guia de recolhimento de presos (id 165310850); decisão do flagrante (id 165316602); auto de apreensão de 100 reais em espécie (id 165316603); auto de infração (id 165316604) e peças correlatas. 4.Auto de exame de corpo de delito - AECD (ids165400093 e 165536206). 5.Folha de antecedentes criminais – FAC do réu (id 165492057), em que consta a seguinte anotação: Anotação 1 de 1– Estes autos. 6.Cópia de documentos pessoais do flagranteado (id 165493792). 7.Assentada da audiência de custódia realizada em 11/01/2025 (id 165498648), em que a prisão em flagrante foi convertida em preventiva e para que o acusado seja encaminhado para avaliação médica. 8.Petição da Defesa Tecnica requerendo a revogação da prisão preventiva (id 166825095). 9.Habilitação nos autos (id 166825100). 10.Laudo de exame de pericial de adulteração de veículos / parte de veículos (id 166948126). 11.Decisão de recebimento da denúncia proferida em 03/02/2025, oportunidade em que foi determinada a citação e mantida a prisão preventiva do réu, bem como designada a AIJ (id 170081368). 12.Resposta à acusação apresentada pelo réu, por meio de Defesa Técnica (id 173695539). 13.Laudo de exame em munições (ids 180186548 e 185660676). 14.Laudo de exame em arma de fogo, atestando capacidade para produzir tiros (ids 180186549 e 185660677). 15.Assentada da audiência de instrução e julgamento(AIJ) realizada em 07/04/2025 (id184309280), oportunidade em que foi proferida decisão ratificando o recebimento da denúncia. A vítima foi ouvida, as testemunhas foram inquiridas e o réu, interrogado. O MP apresentou aditamento à denúncia, que, após manifestação da defesa, foi recebido. Por fim, foi reavaliada a necessidade da prisão do acusado, deferido expedição de ofício a 52ª DP para informar o número do RO relacionado ao roubo da motocicleta apreendida e periciada no id 166948126, encaminhando cópia do referido RO, e deferido prazo para apresentação de alegações finais. 16.RO n. 021-03817/2024 relacionado ao roubo da motocicleta apreendida (id 188301682). 17.O Ministério Público, em suas ALEGAÇÕES FINAIS, apresentadas na forma de memoriais em 04/05/2025 (id 189585989), requer a condenação do réu pela prática dos crimes previstos no artigo e 157, §3º, inciso II, e §2º, II, e §2ºA, I, c/c art. 14, inciso II; artigos 180 e 311, §2º, inciso III, todos do Código Penal, n/f do art. 69 do CP. Por outro lado, requer a absolvição do acusado em relação ao crime do artigo 15 da Lei 10.826/03, por estar absorvido pelo delito de tentativa de latrocínio. 18.A defesa, em suas ALEGAÇÕES FINAIS, apresentadas na forma de memoriais em 06/06/2025 (id 198763554) requer: “I – Preliminarmente, o reconhecimento da inexistência de concurso de pessoas, afastando-se qualquer imputação de coparticipação ou coautoria, tendo em vista a total ausência de elementos que comprovem a atuação conjunta com outros indivíduos. II – No mérito, a absolvição do acusado quanto ao crime do artigo 157, §2º, I, do Código Penal, especialmente pelo fato de que o laudo pericial demonstrou a não utilização efetiva da arma de fogo, inexistindo disparo ou qualquer ameaça concreta. III – Igualmente, a absolvição quanto aos crimes dos artigos 180 e 311, §2º, III, do Código Penal, diante da ausência de dolo, não restando comprovado que o acusado tinha ciência da origem ilícita do veículo ou de eventual adulteração dos sinais identificadores. IV – Subsidiariamente, na remota hipótese de eventual condenação: a) Que sejam afastadas as causas de aumento previstas no artigo 157, §2º, I e II, considerando não haver emprego efetivo de arma de fogo nem concurso de pessoas; b) Que a pena-base seja fixada no mínimo legal, diante das circunstâncias judiciais favoráveis (art. 59 do CP); c) Que, sendo aplicada pena privativa de liberdade, seja ela substituída por penas restritivas de direitos, nos termos do artigo 44 do Código Penal, considerando que o réu preenche os requisitos legais (primariedade, bons antecedentes, não emprego efetivo de violência e circunstâncias favoráveis); d) Na hipótese de não ser acolhida a substituição da pena, que seja fixado o regime inicial semiaberto, em observância aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade, bem como às circunstâncias do caso concreto, que não demonstram maior gravidade; e) Que, se entendida a subsistência dos crimes dos artigos 180 e 311, seja aplicado o princípio da consunção, uma vez que a posse do veículo adulterado ocorreu exclusivamente para viabilizar o suposto cometimento do fato principal. V – Requer, ainda, a concessão dos benefícios da gratuidade de justiça, com fulcro na hipossuficiência econômica do réu, que não possui condições financeiras para arcar com as custas processuais e honorários sem prejuízo de sua própria subsistência e de sua família, nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal e da Lei nº 1.060/50.” 19.Os autos vieram conclusos para sentença. É O RELATÓRIO. DECIDO. II – FUNDAMENTAÇÃO 20.De saída, verifico que o feito está em ordem. Isso porque a relação processual se instaurou e se desenvolveu de forma regular, estando presentes os pressupostos processuais e as condições da ação. Além disso, não se consumou nenhum prazo prescricional, como também não foram arguidas nulidades processuais. Assim, passo à análise do mérito. 21.Na denúncia, o Ministério Público imputa ao acusado a prática das condutas descritas no art. 157, §2º, inciso II, e §2º-A, inciso I; art. 180 e art. 311, §2º, inciso III, todos do Código Penal (CP), além do art. 15 da Lei 10.826/2023 (Estatuto do Desarmamento – ED), todos em concurso material. 22.No aditamento, o parquetimputa a prática dos delitos tipificados no art. 157, §2º, inciso II, §2º-A, inciso I, §3º, inciso II, c/c art. 14, inciso II, art. 180, art. 311, §2º, inciso III, todos do Código Penal, além do artigo 15da L. 10.826, todos em concurso material. 23.Já, em suas alegações finais, o parquetrequer a condenação do réu pela prática dos crimes previstos no art. 157, §3º, inciso II, e §2º, II, e §2ºA, I, c/c art. 14, inciso II; arts. 180 e 311, §2º, inciso III, todos do Código Penal, n/f do art. 69do CP, e a sua absolvição relação ao crime do art. 15da Lei 10.826/03, cujas condutas passo a analisar separadamente. - Do crime capitulado no artigo 157, §3º, inciso II, c/c artigo 14, inciso II, do Código Penal. 24.A materialidade do crime de latrocínio na forma tentada imputado aos réusestá demonstrada por meio doauto de prisão em flagrante nº 052-00333/2025 (id 165310834); registro de ocorrência (id 165310835); termo de declaração do suposto autor do fato Gabriel (id 165310838); auto de apreensão da arma de fogo, do carregador, das munições e da motocicleta (id 165310840); auto de encaminhamento do carregador portátil (id 165310841); auto de encaminhamento de 100 reais em espécie (id 165310849); guia de recolhimento de presos (id 165310850); decisão do flagrante (id 165316602); auto de apreensão de 100 reais em espécie (id 165316603); auto de infração (id 165316604); laudo de exame de pericial de adulteração de veículos / parte de veículos (id 166948126); laudo de exame em munições (ids 180186548 e 185660676); laudo de exame em arma de fogo, atestando capacidade para produzir tiros (ids 180186549 e 185660677); RO n. 021-03817/2024 relacionado ao roubo da motocicleta apreendida (id 188301682)e termos de declaração da vítima Washington K. da Silva (id 165310836) e das testemunhas PMERJ Marcos Escramozino (id 165310837) e Roberto M. M. Ribeiro (id 165310839) em sede policial e em juízo. 25.Igualmente, a autoriadelitiva está provada pelos elementos acima mencionados, acrescidos da prova oralproduzida em juízo, sob o crivo das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, bem como pelo reconhecimento inequívoco realizado no momento da prisão-captura. Vejamos: 26.A vítima WASHINGTON, nas fases inquisitiva e judicial,foi retilíneaao descrever a ação delituosa, sendo peremptória ao afirmar quetrês indivíduos, em duas motocicletas, atuaram em comunhão de desígnios na tentativa de subtração de sua motocicleta, que, apenas não se consumou, em razão de ter reagido, trocando tiros com os roubadores, que conseguiram se evadir do local dos fatos. 27.Segundo o ofendido, voltava com seu filho de 17 anos de idade da natação, quando foi surpreendido por duas motocicletas, sendo uma delas conduzida pelo acusado e na outra havia dois comparsas. Narrou que acusado anunciou o roubo mediante emprego de arma de fogo, contudo, ao perceber que a vítima estava armada seguiu, mas seus comparsas efetuaram disparos em sua direção, tendo revidado à injusta agressão. Contou que saiu em perseguição dos roubadores e encontrou o acusado em uma rua próxima ao local dos fatos e efetuou sua prisão em flagrante, ainda na posse da arma de fogo e da motocicleta utilizadas na empreitada criminosa. 28.Confira-se o teor de suas declarações prestadas em Juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa: Respostas às perguntas formuladas pelo Ministério Público: “que eu fui buscar meu filho na aula de natação; que ao retornar para casa, bem perto da minha residência, percebi umas motocicletas; que um rapaz anunciou o assalto; que eu saquei minha arma para me defender; que outros dois que vinham atras efetuaram disparos contra mim e meu filho; que um foi para um lado e outros dois para o outro; que, mais na frente, me deparei com o primeiro rapaz e eu efetuei a prisão dele ali; que ele se rendeu; que estava com meu filho numa moto; que ele tem 17 anos; que eram duas motos me perseguindo; que o que anunciou o assalto estava sozinho; que na moto de trás tinham dois; que o que anunciou o assalto estava armado; que eu estava armado por ser militar; que não conseguiram levar nada; que o primeiro, quando percebeu que eu estava de arma em punho, seguiu; que os ocupantes da moto de trás efetuaram disparos na nossa direção; que efetuei disparos; que não atingi ninguém; que os três conseguiram fugir nesse momento; que não foram identificados porque estavam com roupa de chuva; que não deu para observar o rosto; que menos de um minuto encontrei o primeiro que anunciou o assalto; que ele foi para uma rua sem saída; que tem uma barricada de ferro que ele ficou preso; que não tive dúvidas que era a mesma pessoa; que estava com a arma em punho; que ele estava em comunicação com os outros dois; que ele estava de capacete aberto, com o rosto bem amostra; que a arma era uma pt 58s; que ela estava municiada, mas não estava com a capacidade máxima; que tinha munição; que não reparei se tinha numeração; que eu acredito que estava com numeração suprimida; que os policiais chegaram depois que ele estava abordado; que não o conhecia; que a moto, pelo que soube na delegacia, era produto de roubo; que não sei se era roubo recente; que não soube se a moto tinha sinal adulterado; que estava com placa; que meu filho não ficou com trauma maiores; que ficou nervoso, mas segue normal; que não tive prejuízo financeiro.” Respostas às perguntas formuladas pela Defesa: “que ele não resistiu à prisão; que, quem estava no chão, foi o primeiro que anunciou o assalto; que os outros dois eu não tive contato; que os outros dois que efetuaram disparos; que não sei precisar se em algum momento ele efetuou disparos também; que ele estava com arma em punho no momento da prisão; que ele não resistiu quando ele estava sem saída; que eu pedi para ele largar a arma, por duas vezes; que na segunda vez ele disse: ‘_ Perdi, perdi’; que não cheguei a passar nenhum bem para ele; que a intenção dele era roubar a minha moto; que não teve a inversão da posse de qualquer bem; que a princípio quem atirou foram os dois meninos; que nunca vi os antes.” Respostas às perguntas formuladas pelo Juízo: “que meu filho tem 17 anos, que ele nasceu em 20/09/2007; que estava de férias; que ele estava se utilizando de mim para as rotinas; que optei por comprar uma scooter elétrica para que ele não andasse comigo; que algumas pessoas do bairro por serem dependentes químicos; que eu tive que evitar sair de casa; que na áreas ninguém sabia que eu era militar; que agora preciso tomar cuidado com a minha segurança; que no dia para dormir meu filho ficou com dificuldade; que ele se chama Gustavo ” (transcrição da ouvida da vítima que não é literal, nem integral). 29.No mesmo sentido, a vítima declarou na fase inquisitiva. Confira-se o que constou em seu termo de declaração prestada em sede policial: “QUE no dia 09JAN2025, por volta das 18h, pela RUA CARLOS ALBERTO, PRÓXIMO A ACADEMIA DO MARCO, BAIRRO CRUZEIRO DO SUL; QUE foi vítima de uma tentativa de roubo; QUE ao olhar pelo retrovisor a vítima notou 02 motos e que ia acontecer um assalto; QUE uma motocicleta CB 500X, PRATA ostentando a PLACA: RJA-7I86; QUE o indivíduo ora sabe-se chamar GABRIEL DA SILVA DA COSTA, RG: 258478429, o ‘fechou’; QUE GABRIEL anunciou o assalto; QUE ao perceber a reação da vítima, que se trata do BOMBEIRO MILITAR WASHINGTON KUNZEL DA SILVA, CPF: 098709267-70, falou algo para os comparsas que estava em outra motocicleta e acelerou em fuga; QUE essa outra motocicleta tinha 02 indivíduos que pareciam estar com capa de chuva; QUE após a fala de GABRIEL fizeram retorno com a motocicleta na mesma rua e atiraram; QUE ao ouvir o estampido a vítima desceu da moto; QUE reagiu a agressão; QUE efetuou 03 disparos com a PISTOLA TAURUS 9MM, MODELO: GX4, Nº DE SERIE: ADG442918 para repelir a injusta agressão e resguardar sua vida e de seu filho; QUE a motocicleta da vítima se trata da TRIUMPH/TIGER SPORT, BRANCA de PLACA: SRG5I85; QUE esse estava com seu filho de 17 anos na garupa; QUE após o fato subiu em sua motocicleta e seguiu sentido a RUA MACHADO COELHO; QUE os indivíduos das 02 motocicletas se evadiram em sentidos opostos; QUE a dupla de roubadores fugiu pela RUA CLARA DE ARAUJO, SENTIDO JARDIM TROPICAL; QUE na RUA MACHADO COELHO avistou GABRIEL parado e com uma pistola na mão; QUE passou dele e parou a moto mais a frente; QUE desceu da motocicleta em que estava; QUE deu ordem para que ele largasse a arma dizendo ‘LARGA A ARMA, LARGA A ARMA’; QUE GABRIEL largou a arma e obedeceu a ordem para deitar no chão sendo contido e preso; QUE logo em seguida ligou para polícia militar via 190; QUE todos foram conduzidos para esta UPAJ. E nada mais disse.” (id 165310836) 30.Como é sabido, nos crimes patrimoniais, a palavra da vítima e o respectivo reconhecimento são decisivos para a condenação do acusado, principalmente quando corroborada por outros elementos de prova, tal como no caso em julgamento. 31.Afinal, é evidente que sua intenção é, exclusivamente, o de apontar o verdadeiro responsável pela ação delituosa que sofreu. Não há motivo para acusar terceiro inocente. Isso porque não se pode presumir que a vítima, que não conhecia o acusado, incriminaria falsamente tal indivíduo. 32.Na realidade, deve-se considerar que o reconhecimento pelo lesado representa o exercício do dever de colaboração com a Justiça, mormente quando não há nos autos qualquer indício apto a afastar sua credibilidade (ut TJ/RJ, AC nº 0277126-28.2009.8.19.0001, Des. Marcus Basílio, j. 19.07.2011). 33.Nesse sentido, acerca da importância das palavras das vítimas nos delitos como os da espécie, JORGE HENRIQUE SCHAEFER MARTINSdiscorre: “A vítima é quem poderá, em certos casos, esclarecer verdadeiramente a ocorrência do fato em todos os seus elementos, e de seu depoimento poderá advir a possibilidade de se concluir pela culpabilidade ou inocência do infrator. Indicando ser o acusado o autor do fato, definindo como ele ocorreu, quais as atitudes empregadas, trará condições de reconhecimento da infração penal.” (MARTINS, Jorge Henrique Schaefer. Prova criminal. Modalidades, valoração. Curitiba: Juruá, 1996. p. 60). 34.A título exemplificativo, confiram-se as ementas dos acórdãos abaixo transcritas: “APELAÇÃO. ARTIGOS 157, § 2º, INCISO II DO CP E 244-B DA LEI 8.069/90, EM CONCURSO MATERIAL. RECURSO DEFENSIVO QUE PRETENDE A ABSOLVIÇÃO DO ACUSADO OU, SUBSIDIARIAMENTE, QUE SEJA ABRANDADA A PENA BASE EM RAZÃO DA ATENUANTE DA MENORIDADE. COMO PLEITO ALTERNATIVO, REQUER A FIXAÇÃO DO REGIME ABERTO, COM APLICAÇÃO DA DETRAÇÃO, BEM COMO SEJA A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. (...) Ressalte-se que, nos crimes de roubo, a palavra da vítima é decisiva para a condenação, em especial, quando as pessoas envolvidas... não se conheciam anteriormente, não havendo motivos para imputar ao ora apelante tão grave crime. Ademais, a única intenção do lesada, ao indicar o agente como autor, é colaborar na realização da Justiça, e não incriminar terceiro inocente. Deste modo, correto o juízo de censura, consubstanciado no farto conjunto probatório apurado ao longo da instrução, eis que as circunstâncias em que ocorreram os crimes foram perfeitamente delimitadas, não só pelos elementos indiciários, como, igualmente, pelos depoimentos colhidos em fase judicial. (...)” (TJRJ – Apelação Criminal nº 0040428-57.2016.8.19.0002 – 8ª Câmara Criminal – Rel. Des. Claudio Tavares de Oliveira Junior – DJe 10/2/2017). * * * “APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO DO RÉU PELA PRÁTICA DO DELITO DE ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS, NA FORMA TENTADA, DESCRITO NO ARTIGO 157, PARÁGRAFO 2º, INCISO II, COMBINADO COM ARTIGO 14, INCISO II, TODOS DO CÓDIGO PENAL, ÀS PENAS DE 03 (TRÊS) ANOS, 06 (SEIS) MESES E 20 (VINTE) DIAS DE RECLUSÃO, E 08 (OITO) DIAS-MULTA, NO VALOR MÍNIMO LEGAL. (...) NO MÉRITO, O PLEITO ABSOLUTÓRIO NÃO MERECE PROSPERAR. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS SUFICIENTEMENTE PROVADAS NOS AUTOS, EM ESPECIAL, PELO DEPOIMENTO DA VÍTIMA, QUE NARROU DE FORMA UNÍSSONA E COESA A DINÂMICA DELITIVA QUE RESULTOU NA TENTATIVA DE SUBTRAÇÃO DE UMA MOCHILA. RECONHECIMENTO REALIZADO PELA VÍTIMA ANTES E DURANTE A INSTRUÇÃO PROCESSUAL EVIDENCIA QUE A CONDENAÇÃO ESTÁ ANCORADA EM SUPORTE PROBATÓRIO SUFICIENTEMENTE ROBUSTO. COMO SABIDO, NOS CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO, COMO VEM... SENDO REITERADAMENTE DECIDIDO PELOS TRIBUNAIS, A PALAVRA DO LESADO E O RECONHECIMENTO REALIZADO NA FASE POLICIAL E EM JUÍZO CONSTITUEM RELEVANTE VALOR PROBATÓRIO, SUFICIENTES PARA ESCORAREM UM JUÍZO DE REPROVAÇÃO, EIS QUE A EXCLUSIVA VONTADE DA VÍTIMA NO MOMENTO É A DE APONTAR O VERDADEIRO AUTOR DA AÇÃO DELITUOSA QUE SOFREU. (...)” (TJRJ – Apelação Criminal nº 0014853-42.2011.8.19.0028 – 1ª Câmara Criminal – Rel. Des. Luiz Zveiter – DJe 9/2/2017). 35.Acresça-se que a versão da vítima foi corroborada pelas declarações prestadas, em sede judicial, pelas testemunhas policiaisque realizaram a condução do acusado, quando já capturado pela vítima, logo depois da prática dos delitos apurados nestes autos. Os brigadianos relataram como foram acionados, encontraram o acusado já capturado pela vítima, o que foi relatado pelo ofendido acerca da dinâmica delitiva, a apreensão dos objetos ilícitos encontrados na posse do acusado e que a motocicleta conduzida pelo réu estava com a placa inidônea e, pelo chassi, verificaram que se tratava de produto de roubo. 36.Vejamos o teor do seu depoimento sob o crivo do contraditório e da ampla defesa: TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO ROBERTO MARTINS M. RIBEIRO (PMERJ) Respostas às perguntas formuladas pelo Ministério Público: “que a gente foi chamado por Maré Zero; que a prisão de fato já teria acontecido; que um bombeiro militar reagiu à tentativa de assalto; que a vítima estava no local; que o acusado era um dos autores do roubo; que ele estava com outros indivíduos; que teve disparo de arma de fogo; que a vítima ao perceber que ia ser roubada reagiu e houve disparos contra a vítima; que a vítima disparou também; que não me recordo o modelo da arma apreendida, mas foi uma pistola; que no momento do roubo estava com o réu; que a moto ficou aprendida; que era produto de roubo e estava com a placa trocada; que a placa não batia com o chassi; que, com base no chassi, identificamos que era produto de roubo; que o roubo da moto tinha acontecido em abril ou maio do ano passado; que o acusado não apresentou documentação da moto; que ele não falou uma justificativa da moto; que ele só informou que era de Belford Roxo, não me recordo direito; que todos eram oriundos do mesmo local; que não conhecia o acusado; que não conheci a vítima” Respostas às perguntas formuladas pela Defesa: “sem perguntas” (transcrição do depoimento da testemunha que não é literal, nem integral). * * * TESTEMUNHA DE ACUSAÇÃO MARCOS DE SOUZA ESCRAMOZINO (PMERJ) Respostas às perguntas formuladas pelo Ministério Público: “que participei da condução do acusado; que não presenciei o roubo; que a população segurou ele; que conduzi a parte até a delegacia; que, quando cheguei, ele já estava abordado; que tinha uma pistola 380; que estava com uma moto roubada também; que o bombeiro não chegou a mencionar se houve troca de tiro; que na verdade eu não me recordo muito bem; que ele não chegou a falar de comparsas; que não olhei se a arma estava municiada; que não me recordo; que a moto estava com ele; que estava com a placa trocada; que eu já cheguei a puxar no local dos fatos; que foi verificado que era roubada; que não tenho informação do roubo anterior; que o réu não apresentou documentação da moto nem habilitação; que não apresentou nota fiscal; ele não falou nada dos comparsas; que o bombeiro falou que sofreu uma tentativa de roubo.” Respostas às perguntas formuladas pela Defesa: “que, quando chegou no local, o acusado já estava contido, não me lembro se estava ao solo; que acho que foi falado de disparos de arma de fogo; que a moto era produto de roubo; que a placa estava trocada; que o chassi era da moto que constava como roubada; que ele não resistiu; que ele tentou colaborar; que eu tirei ele logo dali por conta da população” (transcrição do depoimento da testemunha que não é literal, nem integral). 37.Tais declarações estão alinhadas com o que as testemunhas declararam na fase inquisitiva. À guisa de fundamentação, veja-se o que MARCOS DE SOUZA ESCRAMOZINO declarou na fase pré-processual: “QUE na data de hoje quinta-feira 09/01/25, por volta das 18h estava patrulhando juntamente com o SD ROBERTO MARTINS MACHADO RIBEIRO quando foram acionados através do MARÉ ZERO a fim de diligenciarem até a Rua Machado Coelho na altura do Nº 61 - Vila Operária - Nova Iguaçu; QUE se dirigiram até o local dos fatos e lá chegando encontraram o autor GABRIEL DA SILVA DA COSTA foi contido pela vítima; QUE o autor portava uma Pistola Taurus PT 58SS380 - KOH17607, 1 CARREGADOR e 10 MUNIÇÕES, bem como tinha em sua posse uma motocicleta objeto de roubo ostentando a placa RJA7I86; referente a motocicleta CHASSI 9C2PC4920PR00063, Nº motor: PC49E2P000606 PLACA RJP7G45; QUE conduziram o autor dos fatos a esta UPJA. E nada mais disse.” 38.A defesa não produziu prova oral. 39.O acusado exerceu seu direito constitucional de permanecer em silêncio, o que inclui os direitos de presença e de audiência. Tal fato não pode ser usado, de qualquer modo, em seu prejuízo (art. 186, parágrafo único,do CPP). 40.Contudo, na fase instrutória, o réu não logrou produzir qualquer prova capaz de refutar as sérias acusações que lhe são imputadas (art. 156, CPP), tendente a melhor esclarecer os fatos ou favorecer sua situação. 41.Desse modo, perdeua chance probatória de contradizer o que foi dito pela vítima que perseguiu e identificou o acusado como um dos autores do delito sofrido, realizando sua prisão cerca de 1 min depois após a prática delitiva, na posse de objetos ilícitos – arma de fogo e motocicleta - utilizados na empreitada criminosa, e pelos policiais que efetuaram sua condução em sede policial. 42.Por outro lado, as declarações da vítima e das testemunhas policiais são coerentes interna e externamente com os demais elementos probatórios, gerando, assim, lastro suficiente para o decreto condenatório, uma vez que não há nos autos qualquer elemento que traga dúvida acerca da idoneidade e imparcialidade dos depoentes. 43.A prova produzida é firme no sentido de que a vítima trafegava com sua motocicleta quando foi surpreendida pelo acusado em uma motocicleta e os comparsas, em outra, tendo o acusado anunciado o assalto e, após ver que a vítima também portava arma de fogo, comunicou aos seus comparsas que efetuaram disparos de arma de fogo contra a vítima, que apenas não a atingiu por erro de pontaria. 44.É induvidoso o risco de morte experimentado pela vítima, a caracterizar o latrocínio tentado, já que foram efetuados disparos de arma de fogo contra ela e seu filho, que apenas não atingiram por circunstâncias alheias à vontade, dos autores. 45.Assim, diante de toda a prova produzida, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, ficou demonstrado, não há dúvidas de o acusado e seus comparsas deram início à conduta delitiva ao apontar a arma de fogo na direção do ofendido e os disparos efetuados contra a vítima se deram para assegurar a impunidade do delito, sendo certo que o resultado morte previsto para a caracterização do crime de latrocínio pode decorrer tanto da violência empregada para prática do roubo próprio (art. 157, caput, segunda figura, do Código Penal), como daquela empregada para prática do roubo impróprio (art. 157, §1º, do Código Penal). 46.Igualmente, considero que a prova produzida é suficiente para demonstrar o dolo (elemento subjetivo) do réu. Isso porque, diante da dificulta de se extrair o móvel do agente, uma vez que não há como demonstrar fisicamente o que se passa na mente do agente, o dolo é avaliado pela sua conduta, “depurada segundo as regras de experiência comum e à luz do que se observa no cotidiano forense” (ut TJ-RJ,Apelação Criminal nº 2223411-06.2011.8.19.0021, rel. Des.Carlos Eduardo Freire Roboredo, j. 22/03/2018). 47.Como consequência, rejeito a tese defensiva de que não há elementos probatórios suficientes para o decreto condenatório. 48.Igualmente, descabida a desclassificaçãopara o delito de roubo duplamente majorado. Isso porque ficou o caderno instrutório é firme no sentido de que foram efetuados disparo de arma de fogo na direção da vítima (bombeiro militar), com animus necandi, cujo resultado não foi atingido por circunstâncias alheias à vontade dos agentes. Assim, quem tenta roubar e tenta matar não conseguindo seu intento, responde pelo delito de latrocínio tentado, e não roubo. 49.Outrossim, em que pese o art. 158do CPP ser expresso no sentido de que “quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”, há possibilidade de comprovação da materialidade delitiva por outros meios de provas, tornando-se irrelevante a existência do exame de corpo de delito. 50.Ademais, diante do contexto narrado nos autos, é desimportante perquirirqual dos roubadores efetuou os disparos na tentativa de atingir a vítima, uma vez que “aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo, sobrevindo a morte da vítima, responde pelo crime de latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal ou que sua participação se revele de menor importância” (in STF – RHC 133.575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio – 1ª Turma, julgado em 21/2/2017). 51.Sobre o tema, confiram-se as lições de Cleber Masson: “Se, no contexto do roubo, praticado em concurso de pessoas, somente uma delas tenha produzido a morte de alguém – vítima da subtração patrimonial ou terceiro –, o latrocínio consumado deve ser imputado a todos os envolvidos na empreitada criminosa, como consectário lógico da adoção da teoria unitária ou monista pelo art. 29, caput, do Código Penal (...).” (MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. Vol. 2. Parte Especial. 3ª ed., São Paulo : Editora Método, 2011, p. 406). 52.Outrossim, cabe registrar que, embora a vítima não tenha sido atingida, configurou-se tentativa branca [ut STJ, AgRg no HC: 678017 PB2021/0207710-1, Data de Julgamento: 07/06/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/06/2022, e AgRg no HC: 657783 SP2021/0101318-4, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), Data de Julgamento: 24/08/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/09/2021], não havendo que se falar em desclassificação do delito. 53.Portanto, impõe-se o acolhimento da pretensão punitiva do Estado. - CAUSA DE DIMINIUIÇÃO DA PENA DA PARTE GERAL DO CP: tentativa 54.No caso dos autos, o acusado e seus comparsas não lograram consumar a subtração do veículo da vítima e atingi-la com disparo de arma de fogo realizado em sua em sua direção, uma vez que a vítima, bombeiro militar, conseguiu reagir revidando à injusta agressão e afastando os rapinadores. 55.Desse modo, o resultado morte somente não foi alcançado por circunstâncias alheias à vontade dos agentes, quais sejam, a reação da vítima e a falta de precisão dos disparos efetuados. 56.Logo, aplicável a norma de extensão prevista na parte geral do Código Penal. - CAUSA DE AUMENTO DA PENA DA PARTE ESPECIAL DO CP: Concurso de agentes e emprego de arma de fogo 57.Em que pese. no caso dos autos. tenham sido provadas as circunstâncias pertinentes ao concurso de agentes, uma vez que pelo menos 3 indivíduos concorreram para a prática delitiva, e o emprego de mais de uma arma de fogo, tais causas de aumento devem ser decotadas. 58.Isso porque “As majorantes do crime de roubo aplicam-se somente aos roubos próprios e impróprios. Os roubos qualificados pela lesão corporal grave (inciso I, do § 3.º do art. 157) e pelo resultado morte - latrocínio(inciso seguinte) constituem tipos derivados do roubo simples (próprio ou impróprio), com cominações particulares de penas mínimas e máximas (7 a 18 anos mais multa e 20 a 30 anos mais multa, respectivamente). Por isso, o Código Penal alocou esses tipos derivados do tipo básico no § 3.º do art. 157, após as majorantes (causasespeciais de aumento), previstas no § 2.º do referido artigo. Assim, não há, no Código Penal, a previsão do que seria o ‘roubo qualificado circunstanciado’" (STJ - HC: 554155 SP 2019/0383765-9, Relator.: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 16/03/2021, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/03/2021). 59.Nesse mesmo sentido: “Ao latrocínio roubo qualificado pelas lesões corporais de natureza grave não se aplicam as causas de aumento de pena prevista no § 2º do art. 157 do Código Penal, em virtude de sua localização topográfica. Imagine-se, por exemplo, que a vítima esteja a serviço de transporte de valores (inc. III), quando é interceptada por dois agentes (inc. I) que, munidos com arma de fogo (inc. I), contra ela atiram, querendo a sua morte, para que possam realizar a subtração. Por intermédio desse exemplo, podemos perceber a presença de três causas de aumento de pena. No entanto, nenhuma delas poderá ser aplicada ao latrocínio, a título de majorantes, uma vez que, se fosse intenção da lei penal aplicá-las às modalidades qualificadas, deveriam estar localizadas posteriormente ao § 3º do art. 157 do Código Penal. Assim, concluiu-se, as majorantes previstas pelo § 2º do mesmo artigo somente são aplicadas àquilo que as antecedem, isto é, às duas modalidades de roubo simples, seja ele próprio (caput) ou mesmo impróprio (§ 1º).” (GRECO, Rogério. Código Penal: comentado. 12. ed. Niterói: Impetus, 2018, p. 589-590). - NATUREZA HEDIONDA DO CRIME PATRIMONIAL 60.Registroaqui que o crime patrimonial apurado nestes autos tem natureza hedionda, conforme previsto expressamente noart. 1º, inciso II, alínea“c”, da Lei 8.072/90. - Do crime capitulado no artigo 180, caput, do Código Penal. 61.A denúncia narra a prática, pelo réu, do crime de receptação, previsto no artigo 180, caput, do Código Penal (CP), uma vez que conduzia, em proveito próprio ou alheio, uma motocicleta, com placa inidônea, que sabia ser produto de crime anterior, cuja conduta passo a analisar: 62.A materialidade e autoria do crime de receptação da motocicleta conduzida pelo acusado foi provada pelos elementos probatórios constantes dos autos, auto de prisão em flagrante, auto de apreensão, cópia do RO 021-03817/2024 referente à subtração da motocicleta apreendida; laudo de exame em veículo e declarações da vítima e testemunhas policiais prestadas em sede policial e em juízo., bem como pela prova oral produzida em juízo. 63.Veja-se que a vítima foi firme no sentido de que foi abordada pelo acusado que conduzia a motocicleta apreendida. Os policiais militares, responsáveis pela condução do acusado, afirmaram que o acusado estava na posse da motocicleta apreendida, que ostentava placa inidônea e, ao conferirem o chassi do veículo, apuraram se tratar de produto de roubo, o que se confirmou por meio da cópia do RO 021-03817/2024 do id 188301682, que demonstra que o veículo era produto de crime de roubo ocorrido em 16 de março de 2024, ou seja, poucos meses antes da prisão em flagrante. 64.O réu, em seu interrogatório, exerceu o direito ao silêncio, o que não pode ser interpretado em seu prejuízo. Contudo, durante a instrução, não demonstrou que recebeu licitamente ou de forma culposa a motocicleta que conduzia, ônus que lhe cabia. 65.Ao contrário, ele foi preso em flagrante delito, logo após a prática de crime patrimonial, na condução da referida moto e portando arma de fogo municiada. Tais circunstâncias evidenciam que o réu tinha conhecimento da origem ilícita do bem. 66.Logo, impossível compreender-se que o acusado tenha recebido de boa-fé aquele bem, ignorando a sua origem ilícita. Afinal, em hipótese diversa, com efeito, por certo o réu traria a Juízo a pessoa que lhe teria vendido ou emprestado o automóvel ou ao menos apresentaria informações básicas sobre esse indivíduo, permitindo sua identificação, assim como seu paradeiro, o que aqui jamais ocorreu 67.Nesse sentido: “PENAL. APELAÇÃO. RECEPTAÇÃO. CIÊNCIA DA ORIGEM ILÍCITA DO BEM DEMONSTRADA PELAS CIRCUNSTÂNCIAS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS JÁ REALIZADA EM SENTENÇA. NÃO CONHECIMENTO. 1. A materialidade do crime está demonstrada nos autos pelo Auto de Apreensão e Apresentação de p. 06, pelo Termo de Restituição de p. 12 e pelo Boletim de Ocorrências de p. 18. A autoria delitiva, por sua vez, pelas provas testemunhais. 2. Extrai-se das provas dos autos que a recorrente adquiriu um celular de uma pessoa que desconhecia o nome e o endereço, a qual passava na sua rua, por valor abaixo do usual, sem o recebimento de nota fiscal ou recibo. As circunstâncias da aquisição do aparelho celular, logo, evidenciam a ciência da apelante da origem ilícita do objeto. 3. Uma vez que a recorrente foi presa em flagrante na posse do bem fruto de furto, cabia àquela comprovar a sua origem lícita ou a sua conduta culposa, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal, o que não ocorreu; sem que se trate de indevida inversão do ônus da prova. Esse é o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça. 4. Assim, entendo haver provas suficientes para a condenação da recorrente pelo fato típico do art. 180 do Código Penal. 5 (...)” (TJ-CE - APR: 02008099720198060001 CE 0200809-97.2019.8.06.0001, Relator: MARIA EDNA MARTINS, Data de Julgamento: 27/07/2021, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 27/07/2021) 68.Nesse contexto probatório robusto, concluo que o réu agiu de forma livre e consciente na realização da condutadescrita no tipo penal que lhe é imputado, uma vez que ficou demonstrado que ele recebeu e conduzia a motocicleta apreendida, em proveito próprio ou alheio, veículo que tinha ciência da origem ilícita; do resultadoe do nexo de causalidade. 69.Igualmente, considero que a prova produzida é suficiente para demonstrar o dolo (elemento subjetivo) do réu, consistente na vontade receber e conduzir veículo que sabe ser produto de crime. Isso porque, diante da dificuldade de se extrair o móvel do agente, o dolo é avaliado pela sua conduta. 70.No mesmo sentido, decidiu este Tribunal de Justiça, ao apreciar caso semelhante ao ora analisado, no julgamento da Apelação Criminal nº 2223411-06.2011.8.19.0021, em 22/03/2018, de relatoria do Desembargador Carlos Eduardo Freire Roboredo, in verbis: “Apelação criminal defensiva.Receptaçãodolosa. Recurso que argui, preliminarmente, a nulidade da sentença (valoração negativa da revelia, comprometendo o ampla defesa e o contraditório) e, no mérito, persegue a solução absolutória, a readequação da pena-base no mínimo legal, a redução da pena pela atenuante da menoridade, o abrandamento de regime e a concessão de restritivas. Preliminar que não reúne condições de acatamento. Opção do Acusado em tornar-se revel, uma vez regularmente citado/intimado, que não expressa qualquer nulidade. Sentença que promoveu narrativa circunstanciada sobre a contumácia do Apelante, promovendo o seu devido cotejo frente aos elementos produzidos na instrução criminal e sustentando a condenação diante do caderno de provas, na linha do permissivo do art. 155 do CPP. Inexistência de error in procedendo. Preliminar superada. Mérito que se resolve parcialmente favor da Defesa. Materialidade e autoria inquestionáveis. Conjunto probatório apto a suportar a versão restritiva. Apelante flagrado na posse de uma motocicleta Honda Fan 125, proveniente de roubo, trafegando com a mesma, semdocumentaçãoouplacaidentificadora, em conhecido antro de traficância. Ausência de qualquer justificativa que viabilize afastar os hígidos depoimentos policiais. Crime dereceptaçãoque se classifica como infração de natureza autônoma, a qual não reclama a identificação e responsabilização do agente do injusto primitivo, do qual proveio a coisa ilícita. Injusto que, na sua forma dolosa, pressupõe a certeza de que o agente sabia da origem delituosa da coisa recebida, adquirida ou ocultada.Prova do elemento subjetivo que se aperfeiçoa a partir da análise dos dados objetivos, sensíveis, do fato concreto, depurada segundo as regras de experiência comum e à luz do que se observa no cotidiano forense. Hipótese concreta que bem se amolda ao tipo do art. 180 do CP, reunidos que foram, no fato concreto, todos os seus elementos constitutivos. Juízos de condenação e tipicidade que não merecem censura. Dosimetria que merece revisão. Readequação da pena-base para o patamar mínimo. Insinuação de estar o Apelante integrado, em alguma medida, ao tráfico local (por estar trafegando com a motocicleta em localidade por este conflagrada) que tende a retratar crime em tese (Lei n. 11343/06), diante do qual não foi o mesmo formalmente acusado (nulla poena sine judicio) (...).” (grifei) 71.Nesse contexto, é inviável a desclassificaçãopara o crime de receptação culposa. Isso porque, a receptação culposa, cuja circunstância elementar está firmada no "deve presumir-se", é aplicada no contexto em que não é possível se extrair a ciência do agente acerca da origem ilícita do bem, havendo provas, no entanto, de que a conduta foi imprudente em relação à utilização de veículo de origem espúria. Não é o caso quando a conduta do réu aponta, acima de qualquer dúvida razoável, para a conclusão de que tinha ciência acerca da ilicitude da origem do veículo. 72.Na hipótese, como já fundamentado, não se vislumbra a modalidade culposa, pois os elementos constantes dos autos demonstram o conhecimento do réu acerca da origem espúria do veículo. Afinal, como já visto, não é crível, no caso dos autos, que o acusado não soubesse da origem ilícita do bem. - Do crime capitulado no artigo 311, §2º, inciso III, do Código Penal. 73.Nesse ponto, o aditamento à denúncia, em que pese tenha classificado a conduta naquela descrita noartigo 311, §2º, inciso III, do CP. Imputou ao réu a conduta de SUPRIMIRsinal de identificação de veículo automotor, substituindo a placa de identificação. Confira-se: “[...] Em data, horário e local não precisados nos autos, sendo certo que a constatação delitiva se deu nas mesmas circunstâncias de tempo e de local descritas no parágrafo anterior, o DENUNCIADO, de forma livre, consciente e voluntária, suprimiu, em proveito próprio ou alheio, a placa de identificação a motocicleta HONDA, placa de identificação original RJP7G45, uma vez que esta fora substituída pela placa RJA7I86, conforme laudo pericial de id. 166948126. [...]” 74.Veja-se que a Lei n. 14.562/2023 estabilizou o entendimento de que a adulteraçãopode se dar por meio de modificação, substituição, acréscimo e, até mesmo, supressão, na medida em que todas essas condutas violam a intangibilidade de sinal a que a lei atribui valor jurídico. Logo, não é exigido que essa modificação da placa ocorra de forma definitiva ou duradoura, bastando que seja impedida, ainda que de forma temporária, a visualização de suas reais características externas.Nesse sentido: STJ - HC: 816458, Relator.: LAURITA VAZ, Data de Publicação: 20/04/2023. 75.Contudo, no caso dos autos, encerrada a instrução criminal, não foi produzida qualquer prova de que o acusado tenha substituído a placa da motocicleta. Veja-se que a prova, ao contrário, é no sentido de que ele foi flagrado na conduçãoda motocicleta já com a placa de identificação substituída, conduta diversa da imputada, não sendo possível, aqui, a condenação do réu por fato diverso, sob pena de violação ao princípio da congruência e, como consequência, do contraditório e da ampla defesa. 76.Assim, diante da especificidade do caso dos autos, concluo que o Ministério Público não se desincumbiu do ônus de produzir as provas que demonstrem que o réu praticou a conduta de adulterar e suprimir o sinal identificador – placa de licenciamento – da referida motocicleta, como expresso na denúncia. 77.Afinal, não basta mera conjectura para o decreto condenatório. Deve o MP fazer prova da conduta que imputa, haja vista que "Nas hipóteses em que o Estado se omite e deixa de produzir provas que estavam ao seu alcance, julgando suficientes aqueles elementos que já estão à sua disposição, o acusado perde a chance - com a não produção (desistência, não requerimento, inviabilidade, ausência de produção no momento do fato etc.) -, de que a sua inocência seja afastada (ou não) de boa-fé. Ou seja, sua expectativa foi destruída"(ROSA, Alexandre Morais da; RUDOLFO, Fernanda Mambrini. A teoria da perda de uma chance probatória aplicada ao processo penal. Revista Brasileira de Direito, v. 13, n. 3, 2017, p. 462). 78.É como decidiu a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no AgREsp 1.940.381/AL, na relatoria do Ministro Ribeiro Dantas. Confira-se: “PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO A HOMICÍDIO TENTADO. TESE DE LEGÍTIMA DEFESA. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA PARA SUA REJEIÇÃO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. TESTEMUNHO INDIRETO (HEARSAY TESTIMONY) QUE NÃO SERVE PARA FUNDAMENTAR A CONDENAÇÃO. OFENSA AO ART. 212 DO CPP. AUSÊNCIA DE IDENTIFICAÇÃO, PELA POLÍCIA, DAS TESTEMUNHAS OCULARES DO DELITO, IMPOSSIBILITANDO SUA OUVIDA EM JUÍZO. FALTA TAMBÉM DO EXAME DE CORPO DE DELITO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 6º, III E VII, E 158 DO CPP. DESISTÊNCIA, PELO PARQUET, DA OUVIDA DE DUAS TESTEMUNHAS IDENTIFICADAS E DA VÍTIMA. GRAVES OMISSÕES DA POLÍCIA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO QUE RESULTARAM NA FALTA DE PRODUÇÃO DE PROVAS RELEVANTES. TEORIA DA PERDA DA CHANCE PROBATÓRIA. DESCONSIDERAÇÃO DO DEPOIMENTO DO REPRESENTADO. EVIDENTE INJUSTIÇA EPISTÊMICA. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL, A FIM DE ABSOLVER O RECORRENTE. 1. O representado foi condenado em primeira e segunda instâncias pela prática de ato infracional análogo a homicídio tentado. 2. Como relataram a sentença e o acórdão, a namorada grávida e um amigo do recorrente foram agredidos por J F DA S A após este ter consumido bebida alcoólica, ao que o representado reagiu, golpeando o agressor com um paralelepípedo. Segundo as instâncias ordinárias, constatou-se excesso na legítima defesa, com base nos depoimentos indiretos do bombeiro e da policial militar que atenderam a ocorrência quando a briga já havia acabado. Esses depoentes, por sua vez, relataram o que lhes foi informado por "populares", testemunhas oculares da discussão que não chegaram a ser identificadas ou ouvidas formalmente pela polícia, tampouco em juízo. 3. O testemunho indireto (hearsay testimony) não se reveste da segurança necessária para demonstrar a ocorrência de nenhum elemento do crime, mormente porque retira das partes a prerrogativa legal de inquirir a testemunha ocular dos fatos (art. 212 do CPP). 4. A imprestabilidade do testemunho indireto no presente caso é reforçada pelo fato de que a polícia, em violação do art. 6º, III, do CPP, nem identificou as testemunhas oculares que lhes repassaram as informações posteriormente relatadas pela policial militar em juízo. Por outro lado, a vítima, a namorada do recorrente e seu amigo - todos conhecidos da polícia e do Parquet - não foram ouvidos em juízo, tendo o MP/AL desistido de sua inquirição. 5. Para além da falta de identificação e ouvida das testemunhas oculares, a vítima não foi submetida a exame de corpo de delito, por inércia da autoridade policial e sem a apresentação de justificativa válida para tanto (na forma do art. 167 do CPP), o que ofende os arts. 6º, VII, e 158 do CPP. Perda da chance probatória configurada. 6. ‘Nas hipóteses em que o Estado se omite e deixa de produzir provas que estavam ao seu alcance, julgando suficientes aqueles elementos que já estão à sua disposição, o acusado perde a chance - com a não produção (desistência, não requerimento, inviabilidade, ausência de produção no momento do fato etc.) -, de que a sua inocência seja afastada (ou não) de boa-fé. Ou seja, sua expectativa foi destruída’ (ROSA, Alexandre Morais da; RUDOLFO, Fernanda Mambrini. A teoria da perda de uma chance probatória aplicada ao processo penal. Revista Brasileira de Direito, v. 13, n. 3, 2017, p. 462). 7. Mesmo sem a produção de nenhuma prova direta sobre os fatos por parte da acusação, a tese de legítima defesa apresentada pelo réu foi ignorada. Evidente injustiça epistêmica - cometida contra um jovem pobre, em situação de rua, sem educação formal e que se tornou pai na adolescência -, pela simples desconsideração da narrativa do representado. 8. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial e absolver o recorrente, com a adoção das seguintes teses: 8.1: o testemunho indireto (também conhecido como testemunho de ‘ouvir dizer’ ou hearsay testimony) não é apto para comprovar a ocorrência de nenhum elemento do crime e, por conseguinte, não serve para fundamentar a condenação do réu. Sua utilidade deve se restringir a apenas indicar ao juízo testemunhas referidas para posterior ouvida na instrução processual, na forma do art. 209, § 1º, do CPP. 8.2: quando a acusação não produzir todas as provas possíveis e essenciais para a elucidação dos fatos, capazes de, em tese, levar à absolvição do réu ou confirmar a narrativa acusatória caso produzidas, a condenação será inviável, não podendo o magistrado condenar com fundamento nas provas remanescentes. (AREsp 1940381/AL, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 14/12/2021, DJe 16/12/2021, grifei) 79.Dessa maneira, impõe-se a absolvição do acusado. Afinal, no Direito Processual brasileiro, vige o princípio do in dubio pro reo, segundo o qual, em caso de provas conflitantes ou ausentes elementos aptos a confirmarem a autoria, caberá a absolvição do réu. 80.Logo, diante da inexistência de provas suficientes de que o acusado praticou a conduta delitiva imputada, impõe-se a sua absolvição. - Do crime do artigo 15 da Lei 10.826/03 81.Neste ponto, tal como bem lançado na manifestação do Ministério Público em suas alegações finais, que adoto aqui como razão de decidir, o crime de disparo de arma de fogo deve ser absorvido pelo crime de latrocínio, uma vez que aquele foi praticado como meio para a execução do latrocínio. Confira-se: “Em relação ao crime do artigo 15 da Lei 10826/03, em que pese a prova produzida demonstre que, de fato, os disparos foram realizados em via pública pelo réu em comunhão de ações e desígnios com seus comparsas, entende o Ministério Público que se trata de delito expressamente subsidiário. No caso, os disparos teriam sido efetuados no contexto do crime de tentativa de latrocínio, com os autores demonstrando a intenção de atingir a vítima para garantir o sucesso da empreitada delitiva e a impunidade, o que configura o crime do art. 157, §3º, II, c/c 14, II, do CP, conforme exaustivamente demonstrado no tópico anterior. Assim, os disparos foram meio para realização de outro delito, de modo que fica absorvido por aquele crime mais grave, impondo-se a absolvição. Contudo, de maneira subsidiária, caso o juízo não entenda que os disparos não foram suficientes para configuração do crime de tentativa de latrocínio, o que não se espera e nem confia, o crime de disparo deve subsistir, já que a vítima assegurou que o grupo efetuou disparos, em via pública, no momento do assalto, sendo certo que a atuação do acusado foi em comunhão de ações e desígnios com os demais.” - Da ilicitude e culpabilidade 82.Observa-se, ainda,que o acusado era plenamente imputávelpor ocasião dos fatos, tendo pela capacidade de entender o caráter ilícitode sua conduta e de determinar-se segundo tal entendimento. 83.Não há dúvida de que o réu estava ciente do seu modo agir e dele se poderia exigir, naquelas circunstâncias, conduta compatível com a norma proibitiva implicitamente contida no tipo penal em análise. 84.Dessa forma, o réu não demonstrou a existência de causas que pudessem justificar sua reprovávelconduta, excluir culpabilidadeou isentar a inflição de uma pena. Portanto, impõe-se o acolhimento da pretensão punitiva do Estado. - Do concurso de crimes 85.In casu, há concurso material de crimes, nos termos do artigo 69 do Código Penal, uma vez que o réu, mediante mais de uma ação, cometeu crimes que não são da mesma espécie. III – DISPOSITIVO 86.Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTEa pretensão punitiva estatal para, com fundamento no artigo 386, incisos III e VII, absolver o acusado GABRIEL DA SILVA DA COSTAda imputação dos crimes do art. 15 do ED e art. 311, §2º, inciso III, do CP. Por outro lado, com fundamento no art. 387 do CPP, CONDENO o réu como incurso nas penas do art. 157, §3º, inciso II, c/c art. 180, caput, na forma do art. 69, todosdo Código Penal n/f art. 1º, inciso II, alínea“c”, da Lei 8.072/90. 87.Como consequência, passo à fixação da pena, observando o artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição República e os artigos 59e 68,ambos do Código Penal. IV- DO PROCESSO DOSIMÉTRICO DA PENA (a) Artigo 157, §3º, inciso II, c/c artigo14, inciso II, do Código Penal 88.Inicialmente, registro que o ponto de partida para a fixação da pena serão as balizas estabelecidas no preceito secundário do artigo 157, §3º, inciso II,do Código Penal – reclusão, de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos, e multa. 1ª fase do processo dosimétrico (circunstâncias judiciais do art. 59, CP). 89.Segundo o art. 59do Código Penal, o juiz fixará a pena base levando em consideração a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, bem como o comportamento da vítima. 90.A culpabilidadedo condenado, ou seja, o quão reprovável foi a conduta do agente,in casu, não excedeu ao normal do tipo penal imputado. 91.O condenado não temmaus antecedentes. 92.Não há elementos para desvalorar a conduta socialdo apenado perante os membros de sua família ou convívio com seus vizinhos e colegas de trabalho. 93.Igualmente, não há elementos para avaliar a personalidade (retrato psíquico) do condenado. Afinal, essa circunstância judicial “não pode ser valorada de forma imprecisa ou objetivamente desamparada porquanto, através de considerações vagas e insuscetíveis de controle, a sua utilização acarretaria a ampla e inadequada incidência do Direito Penal do Autor” (in STJ, REsp 513.641/RS, DJ 01/07/2004). Logo, tal circunstância não é sopesada negativamente. 94.Não ficou demonstrado que os motivos do crimeextrapolam ao normal do tipo. 95.As circunstâncias do crime revelam-se desarrazoadas, pois evidenciado o concurso de agentes, já que o delito foi praticado por três indivíduos em clara comunhão de esforços e vontades. Além disso, restou demonstrado o emprego de, ao menos, duas armas de fogo, o que acentua o grau de intimidação exercido contra a vítima e eleva significativamente o risco à sua integridade física. Uma das armas foi apreendida em poder do réu, enquanto a vítima foi firme ao relatar que os disparos foram efetuados pelos comparsas do acusado, reforçando a gravidade do modus operandi. 96.Aqui, importante destacar que, apesar de tais circunstâncias, como já explicado, não poderem ser utilizadas como majorantes, ante a localização topográfica delas, podem ser reconhecidas como circunstâncias judiciais desfavoráveis na primeira fase da dosimetria da pena, conforme o art. 59 do Código Penal. 97.Nesse mesmo sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. LATROCÍNIO CONSUMADO. DOSIMETRIA . PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME ESPECIALMENTE MAIS GRAVOSAS. CONCURSO DE PESSOAS. IMPOSSIBILIDADE DE REAÇÃO DA VÍTIMA . LESÕES PRATICADAS AGRAVADAS. FUNDAMENTOS IDÔNEOS PARA A EXASPERAÇÃO. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. VIOLAÇÃO . AUSÊNCIA. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS E JUDICIAIS DIVERSAS DO CORRÉU. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1 . A prática delitiva por meio de concurso de agentes pode ser elemento apto a justificar a exasperação da pena-base do crime de latrocínio. Além de não constituir elemento inerente ao tipo penal, é modo de execução que foge ao comum para o delito em questão, justificando o aumento da pena neste aspecto. Precedentes.2 . Afastada também no caso a alegação violação do princípio da isonomia, porquanto, as circunstâncias fáticas e judiciais a serem valoradas não são idênticas, a teor do art. 59 c/c 49 do Código Penal, na medida em que o paciente não possui a mesma situação do corréu, além de ter permanecido foragido por mais de 16 anos. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ - AgRg no HC: 601845 SC 2020/0190911-7, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 23/02/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/03/2021) 98.Posto isso, elevo a pena em 2 anos e 6 meses de reclusão e 2 dias-multa. 99.As consequências do crimenão ultrapassaram aquelas naturais, já decorrentes da ação delituosa. 100.Por fim, cabe anotar que a circunstância judicial referente ao comportamento da vítimaé neutra. 101.Desse modo, fixo a pena-baseem 22 anos e 6 meses de reclusão e 12 dias-multa. - 2ª fase do processo dosimétrico (circunstâncias atenuantes e agravantes dos artigos 61 a 66, CP). 102.Na segunda fase do processo dosimétrico, não há circunstâncias agravantes aplicáveis ao caso. 103.Por outro lado, reconheço a incidência da atenuante da menoridade relativa, nos termos do art. 65, inciso I, do Código Penal, uma vez que o réu era menor de 21 anos ao tempo dos fatos. 104.Posto isso e observando o teor da S. 231 do STJ, atenuo a pena intermediáriapara 20 anos de reclusão e 10 dias-multa. - 3ª fase do processo dosimétrico (causas de aumento e de diminuição da pena). 105.Não há causa de aumentoda pena a ser reconhecida. 106.Presente, no entanto, a causa geral de diminuição da pena da tentativa. Em razão do iter criminis, tenho que o patamar a ser reduzido deve ser de 2/3, uma vez que não houve inversão da posse do bem e os disparos de arma de fogo, apesar de direcionados à vítima, não chegaram a atingi-la, tratando-se, portanto, de tentativa incruenta de latrocínio. 107.Posto isso, fixo areprimenda penal definitiva em 6 anos e 8 meses de reclusão, e 3 dias-multa. (b) Artigo 180, caput, do Código Penal 1ª fase (circunstâncias judiciais do art. 59, CP) 108.A culpabilidadedo condenado não excedeu o grau de reprovabilidade inerente ao tipo penal imputado. 109.O apenado não tem maus antecedentes. 110.Não há elementos para desvalorar a conduta sociale a personalidadedo apenado. 111.Os motivos do crime, que impulsionaram o atuar do apenado, não extrapolaram ao normal do tipo. 112.As circunstâncias do crimeforam desarrazoadas, uma vez que se trata de veículo, com alto valor de mercado. Afinal, “o valor econômico dos bens receptados constitui fundamento idôneo para exasperar a pena-base do crime de receptação, por denotar maior reprovabilidade da conduta” (ut STJ, AgRg no HC: 777708 SP 2022/0327801-2, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 28/08/2023, SEXTA TURMA, DJe 30/08/2023). 113.Assim, exaspero a pena-base em 1 mês e 15 dias de reclusão, e 1 dia-multa, para todos os apenados. 114.As consequências do crime, por sua vez, não se revestem de elementos que indicam a necessidade de recrudescimento da pena. 115.Por fim, cabe anotar que a circunstância judicial referente ao comportamento da vítimaé neutra. 116.Desse modo, elevo a pena-basepara 1 ano, 1 mês e 15 dias de reclusão, e 10 dias-multa. - 2ª fase (circunstâncias atenuantes e agravantes dos artigos 61 a 66, CP) 117.Não há agravantes a serem considerados nesta etapa. Por outro lado, como visto, deve ser reconhecida a atenuante da menoridade relativa. 118.Posto isso, atenuo a pena intermediária para 1 ano de reclusão e 10 dias-multa. - 3ª fase (causas de aumento e de diminuição da pena) 119.Não há causas de aumento e de diminuição da pena aplicáveis ao caso. 120.Assim, torno definitiva a pena em 1 ano de reclusão e 10 dias-multa. – Do concurso de crimes 121.Conforme já reconhecido, deve ser aplicada a regra do concurso material, observando-se o disposto no artigo 69do Código Penal. 122.Assim, fixo a seguinte pena definitivapara o apenado: 7anos e 8 meses de reclusão, e 13 dias-multa. - Fixação do valor do dia-multa e prazo para pagamento 123.Considerandoa situação econômica do apenado, fixo o valor do dia-multa em 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, devendo ser monetariamente atualizado a partir de então, conforme artigo 49, §2º, do Código Penal. 124.Ademais, registro que a multa deverá ser paga em 10 (dez) dias, a contar do trânsito em julgado, nos termos do artigo 50do Código Penal. V- REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA 125.Considerando o quantumda sanção aplicada e as circunstâncias desfavoráveis reconhecidas, bem como o teor da S. 381 do TERJ, que exigem maior rigor, determino o cumprimento da pena no REGIME FECHADO, nos termos do artigo 33, §2º, alínea “a”,e§3º, do Código Penal. 126.Registro aqui que a Segunda Turma do Eg. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso em Habeas Corpus (RHC) nº 138.936, reforçou a discricionariedade conferida ao Magistrado para a fixação do regime inicial de cumprimento de pena, por ser etapa da individualização da pena. Assim, o regime inicial de cumprimento de pena deve refletir as circunstâncias do crime avaliadas nas três fases do processo dosimétrico, e não apenas na primeira delas. VI - DETRAÇÃO PENAL 127.Deixo de realizar a detração para fins de regime prisional, prevista no artigo 387, § 2º, do CPP, relegando esta análise ao Juízo da Execução Penal, uma vez que, em se tratando de cálculo que vise à modificação do regime inicial de cumprimento de pena, este deve levar em consideração outros critérios além dos meramente aritméticos, tal como o mérito do apenado, conforme exige o artigo 112 da LEP. 128.Isso porque, tal como decidiu Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg no HC 705.307/SP, de relatoria do Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, em 23/11/2021, a modificação para um regime prisional mais brando necessita de um olhar mais cauteloso, a fim de se evitar que a sociedade seja posta em risco com uma reinserção prematura. VII- ANÁLISE DE BENEFÍCIOS 129.Deixo de determinar a substituição ou a suspensão condicional da pena privativa de liberdade aplicada, em razão da quantidade da pena aplicada e pelo fato de o crime ter sido praticado com grave ameaça à pessoa, o que desaconselha a aplicação de qualquer medida descarcerizadoraprevistas nos art. 44 e 77 do Código Penal. 130.Afinal, por meio de uma interpretação sistemática dos dispositivos que regulam o tema, “é possível observar a intenção do instituto é beneficiar o infrator de baixa periculosidade que possua bons antecedentes e não o que comete delitos em sequência” (in TJRJ, AC 0002970-79.2016.8.19.0204, j. 26/10/2017). 131.Nessa linha, confira-se no STJ: HC 250554/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis, 6ª T., julg. em 18.03.2014, e HC 261977/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, 5ª T., julg. em 17.12.2013. VIII-ANÁLISE DA PRISÃO PREVENTIVA 132.Nego ao condenado o direito de apelar em liberdade (art. 387, §1º, do CPP). Senão vejamos: 133.Note-se que o sentenciado permaneceu preso durante a instrução criminal, visando a garantir a ordem pública e a aplicação da lei penal. Este último fundamento permanece abrasador após a prolação desta sentença não havendo qualquer razão para soltá-lo agora que foi condenado ao cumprimento de pena de reclusão em regime fechado. A gravidade em concreto do delito praticado informa a necessidade de manutenção da custódia cautelar. 134.Aplica-se, aqui, a orientação do STF no sentido de que, se “o réu permaneceu preso durante toda a instrução criminal, não se afigura plausível, ao contrário, revela-se um contrassenso jurídico, sobrevindo sua condenação, colocá-lo em liberdade para aguardar o julgamento do apelo” (in HC 118.551, Relator: RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 01/10/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-205 DIVULG 15-10-2013 PUBLIC 16-10-2013). 135.Não se pode perder de vista, ainda, que o apenado foi preso pela prática de crime de roubo, com emprego de arma de fogo e concurso de pessoas.O crime é grave e a forma como foi praticado é preocupante à ordem pública, disseminando o caos, o pânico e temor social. 136.In casu, além de buscar evitar a reiteração delitiva, a garantia da ordem pública também busca acautelar o meio social, resguardando a integridade das instituições, sua credibilidade e o aumento da confiança da população nos mecanismos oficiais de repressão às diversas formas de delinquência (“ut” STJ, RHC 26.308/DF, j. 08/09/2009, DJe 19/20/2009 e STF, HC 89.090/GO, DJe 05/10/2007). 137.Nesse contexto, as medidas cautelares substitutivas da prisão, previstas no artigo 319 do CPP, ainda que cumulativamente, mostram-se insuficientes à garantia do provimento final ou inadequadas. IX- EFEITO EXTRAPENAL OBRIGATÓRIO DA CONDENAÇÃO: obrigação de reparar o dano (art. 91, inciso I, do CP). Indenização mínima em favor da vítima (artigo 387, inciso IV, do CPP) 138.Inicialmente, reconheço a legitimidade do Ministério Públicopara requerer tal condenação. Vejamos: 139.O artigo 387, inciso IV, do CPP, com o advento da Lei nº 11.719/08, passou a ser expresso ao determinar que na própria sentença condenatória seja fixada verba indenizatória mínima em favor da vítima para reparação dos danos sofridos em razão da conduta delituosa. Contudo, não foi estabelecido procedimento para tanto. 140.O Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o tema, consolidou sua jurisprudência no sentido de cabe ao juiz penal fixar indenização, visando à reparação dos danos materiais e morais sofridos pela vítima, desde que haja pedido específico formulado pelo ofendido ouMinistério Público. Isso porque, diante da mens legis, se deve promover maior eficácia ao direito da vítima em ser ressarcida do dano sofrido. 141.Nesse sentido, veja-se a decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.585.684-DF(Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 9/8/2016, DJe 24/8/2016), publicada no Informativo de Jurisprudência daquela Corte nº 0588 (Período: 17 a 31 de agosto de 2016). 142.Por outro lado, a 3ª Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.986.672/SC, de relatoria do Ministro Ribeiro Dantas (julgado em 8/11/2023, DJe de 21/11/2023), estabeleceu que somente será possível a fixação de indenização por dano moral quando a inicial acusatória trouxerpedido expresso e indicar o valor atribuído àreparação da vítima, sob pena de violação ao princípio da congruência, além dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa e do sistema acusatório. Confira-se a ementa do referido julgado: “PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DE ESTELIONATO. FIXAÇÃO DE VALOR INDENIZATÓRIO MÍNIMO. INCLUSÃO DO NOME DA VÍTIMA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. DANO MORAL IN RE IPSA. DESNECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA, NO CASO CONCRETO. EXIGÊNCIA, PORÉM, DE PEDIDO EXPRESSO E VALOR INDICADO NA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO, NA PEÇA ACUSATÓRIA, DA QUANTIA PRETENDIDA PARA A COMPENSAÇÃO DA VÍTIMA. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO, PARA EXCLUIR A FIXAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO MÍNIMO. 1. A liquidação parcial do dano (material ou moral) na sentença condenatória, referida pelo art. 387, IV, do CPP, exige o atendimento a três requisitos cumulativos: (I) o pedido expresso na inicial; (II) a indicação do montante pretendido; e (III) a realização de instrução específica a fim de viabilizar ao réu o exercício da ampla defesa e do contraditório. Precedentes desta Quinta Turma. 2. A Quinta Turma, no julgamento do AgRg no REsp 2.029.732/MS em 22/8/ 2023, todavia, adotou interpretação idêntica à da Sexta Turma, no sentido de que é necessário incluir o pedido referente ao valor mínimo para reparação do dano moral na exordial acusatória, com a dispensa de instrução probatória específica. Esse julgamento não tratou da obrigatoriedade, na denúncia, de indicar o valor a ser determinado pelo juiz criminal. Porém, a conclusão foi a de que a indicação do valor pretendido é dispensável, seguindo a jurisprudência consolidada da Sexta Turma. 3. O dano moral decorrente do crime de estelionato que resultou na inclusão do nome da vítima em cadastro de inadimplentes é presumido. Inteligência da Súmula 385/STJ. 4. Com efeito, a possibilidade de presunção do dano moral in re ipsa, à luz das específicas circunstâncias do caso concreto, dispensa a obrigatoriedade de instrução específica sobre o dano. No entanto, não afasta a exigência de formulação do pedido na denúncia, com indicação do montante pretendido. 5. A falta de uma indicação clara do valor mínimo necessário para a reparação do dano almejado viola o princípio do contraditório e o próprio sistema acusatório, por na prática exigir que o juiz defina ele próprio um valor, sem indicação das partes. Destarte, uma medida simples e eficaz consiste na inclusão do pedido na petição inicial acusatória, juntamente com a exigência de especificar o valor pretendido desde o momento da apresentação da denúncia ou queixa-crime. Essa abordagem reflete a tendência de aprimoramento do contraditório, tornando imperativa a sua inclusão no âmbito da denúncia. 6. Assim, a fixação de valor indenizatório mínimo por danos morais, nos termos do art. 387, IV, do CPP, exige que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, com a indicação do valor pretendido, nos termos do art. 3º do CPP c/c o art. 292, V, do CPC/2015. 7. Na peça acusatória (apresentada já na vigência do CPC/2015), apesar de haver o pedido expresso do valor mínimo para reparar o dano, não se encontra indicado o valor atribuído à reparação da vítima. Diante disso, considerando a violação do princípio da congruência, dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa e do sistema acusatório, deve-se excluir o valor mínimo de indenização por danos morais fixado. 8. O entendimento aqui firmado não se aplica aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, que continuam regidos pela tese fixada no julgamento do tema repetitivo 983/STJ. 9. Recurso especial provido para excluir a fixação do valor indenizatório mínimo.” 143.Feitas essas considerações, passo à análise dos pedidos indenizatórios formulados pelo Parquetna inicial acusatória. 144.No caso dos autos, o MP formulou pedido de condenação do acusado ao pagamento de indenização à vítima na INICIAL acusatória, o valor mínimo pretendido a título de reparação (um salário-mínimo), possibilitando ao réu contestar, produzir contraprova, durante toda a instrução. Desse modo, foram garantidos o contraditório processuale a ampla defesa. 145.Assim, como preconiza o art. 387, inciso IV, do CPP, condeno os apenados, solidariamente, a reparar os danos moraiscausados ao ofendido. Senão vejamos: 146.In casu, os danos morais são in re ipsa. Isso porque o réu e seus comparsas tentaram subtrair os bens da vítima e efetuaram contra ela e seu filho disparos de arma de fogo, que apenas não os atingiram por circunstâncias alheias à vontade dos criminosos. Tais fatos são mais que suficientes para violar os direitos à personalidade do lesado, na sua vertente da integridade psíquica, justificando a necessidade da reparação ao dano causado. 147.Aqui, não há que se exigir prova do dano imaterial pela vítima da violência, com fundamento no artigo 156do CPP, pois não se deve confundir prejuízo material com danos morais. 148.Isso porque, uma vez provada a ofensa ao direito da personalidade - o que, no caso dos autos, é evidente pelo simples fato de ter sido empregado arma de fogo contra a vítima e disparos na sua direção e de seu filho -, está provado o dano, que é presumido, ou seja, basta a prova da prática do ato ilício para configurar o dano, não sendo necessária a demonstração de que a pessoa, v.g., ficou envergonhada ou com dor na alma. 149.Sobreo tema, confiram-se as lições do ilustre desembargador e professor MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO: “6. PROVA E CONFIGURAÇÃO DO DANO MORAL Admitindo-se como prova os mecanismos legítimos utilizados pelo interessa para demonstrar a veracidade de um fato previamente alegado em juízo, como ‘comprovação da verdade de uma proposição’ consoante lições de Carnelutti, ou, ainda, nas palavras de Alexandre Câmara, como ‘todo o elemento que contribui para a formação da convicção do juiz a respeito de determinado fato’, e mantendo-nos fiel ao conceito de dano moral é um agravo a direito da personalidade, provada estará a ocorrência de tal dano quando houver prova da referida ofensa. (...) No caso da prova, o posicionamento majoritário caminha na direção de que o dano moral se faria presente em razão do próprio ato danoso, o que comumente tem se chamado de dano moral in re ipsa. Não se trata de propriamente de dispensa da prova do dano moral, pois o agravo à dignidade humana deverá ser demonstrado pelo interessado na reparação. Na realidade, significa dizer que eventual sofrimento que possa advir da ofensa não precisa ser demonstrado. (...)” (MELO, Marco Aurélio Bezerra de, “Responsabilidade civil” - São Paulo: Atlas, 2015 - coleção curso de direito civil -, v. 4, p. 147, grifei) 150.Estabelecida a existência de dano moral e o dever de indenizar (art. 16do Código Civil e o art. 5º, inciso X, da Constituição da República), impõe-se o arbitramento do valor da indenização. 151.Para a quantificação da indenização por prejuízos extrapatrimoniais, devem ser utilizados critérios geraiscomo o prudente arbítrio, o bom senso, a equidade e a proporcionalidade ou razoabilidade. 152.Além desses, consideram-se os critérios específicos, que são: o grau de culpado ofensor, o seu potencial econômico, a repercussão social do ato lesivo, as condições pessoais do ofendido e a natureza do direito violado. 153.Nesse contexto, observando tais critérios, fixo como indenização mínima o valor de R$ 1.518,00 (mil quinhentos e dezoito reais) em favor da vítima. 154.Por fim, tal valor deverá ser corrigido monetariamente pelo índice estabelecido pela Corregedoria do TJERJ, a contar desta decisão, e acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, desde a data do evento danoso. 155.Por outro lado, deixo de fixar a reparação por danos materiais, uma vez que não há prova efetiva do quantum debeatur(art. 403, CC). 156.Contudo, isso não impedirá a vítima de buscar o ressarcimento de eventuais prejuízos materiais sofridos no juízo cível contra o autor do crime. X- PROVIDÊNCIAS E COMUNICAÇÕES FINAIS 157.Condeno, ainda, o apenado ao pagamento das despesas processuais, com fundamento no artigo 804do CPP. Eventual pedido de isenção deverá ser efetuado na fase de execução, conforme Súmula nº 74do TJ/RJ. 158.Deixo de determinar o lançamento do nome do condenado no rol dos culpados, uma vez que o art. 393do CPP foi expressamente revogado pela Lei 12.403/2011. 159.Expeça-se, ainda, carta de execução provisória da pena, nos termos da Resolução nº 113/2010 do CNJ e da Resolução TJ/OE/RJ nº 07/2012. 160.Recomendoa manutenção do sentenciado na prisão em que está. Oficie-se à SEAP, nos exatos termos do AVISO CGJ nº 149/2021. 161.Após o trânsito em julgado, adotem-se as seguintes providências: I - lançar o trânsito em julgado no sistema informatizado para cada parte do processo, conforme o caso (código 54 – Trânsito em Julgado; código 54 – Trânsito em Julgado MP). II – procederàs comunicações previstas no artigo 259, incisos XXVII a XXX, do novo Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça, certificando-se. III – caso mantido o regime inicial fechado, expedir mandado de prisão; IV - expedircarta de execução definitiva, nos termos dos artigos 105da LEP e 674do CPP, com atendimento às formalidades do artigo 106da LEP, bem como dos artigos 277(regime semiaberto e aberto) e 278, §1º(regime fechado) do novo Código de Normas da CGJ do TJ/RJou, no caso de constar a execução provisória da sentença, comunicar à VEP a condenação definitiva, via malote digital, nos termos do artigo 279 do novo Código de Normas da CGJ do TJ/RJ. 162.Certifique o cartório se há nos presentes autos bem(ns) apreendido(s) que tenham(m) valor econômico (art. 3.º, §2.º, da Resolução n.º 63/2008, do Conselho Nacional de Justiça), devendo ser especificada na certidão toda e qualquer comunicação de localização e destinação dele. 163.Havendo bem(ns) apreendido(s) que tenham(m) valor econômico, cadastre(m)-se o(s) no Sistema Nacional de Bens Apreendidos. 164.Havendo bens de origem lícita, certifique-se quanto à propriedade. Havendo identificação positiva de propriedade, intime-se para devolução. Em caso negativo, transcorrido o prazo de 90 dias do trânsito em julgado da sentença, verificado que o(s) objeto(s) apreendidos não foram reclamados e que não há nos autos prova de propriedade, oficie-se autorizando a alienação na forma do artigo 123 do CPP, observando-se as formalidades legais. 165.Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se na forma do artigo 392, CPP, devendo o apenado ser intimado no local em que está acautelado. 166.Comunique-se a vítimadesta decisão, na forma do artigo 201, §2º, CPP, ficando autorizada a realização por meio do número do telefone com o aplicativo de mensagens WhatsApp constante na assentada da AIJ realizada nestes autos. 167.Após o cumprimento de todas as medidas, arquivem-se os autos. NOVA IGUAÇU, 29 de junho de 2025. ALINE ABREU PESSANHA Juiz Titular