Leandro Hernandez Bermudez x Banco Inter S.A
Número do Processo:
0718319-39.2024.8.07.0009
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TJDFT
Classe:
RECURSO INOMINADO CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
Primeira Turma Recursal
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
-
30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: Primeira Turma Recursal | Classe: RECURSO INOMINADO CíVELJUIZADO ESPECIAL CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. SERVIÇOS BANCÁRIOS. CARTÃO VIRTUAL. CARTEIRA DIGITAL. ROUBO DO APARELHO CELULAR. TRANSAÇÕES FINANCEIRAS CONSECUTIVAS E DE VALORES FORA DO PERFIL DO CONSUMIDOR. FALHA NA SEGURANÇA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. RECURSO DO RÉU CONHECIDO E IMPROVIDO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Tratam-se de recursos inominados apresentados tanto pelo AUTOR como pelo RÉU em face da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da inicial para condenar "a ré a RESTITUIR R$ 2.023,45 (dois mil e vinte e três reais e quarenta e cinco centavos), corrigidos monetariamente desde os descontos, com juros de mora a contar da citação". 2. Recursos próprios e tempestivos (ID 71709560 e 71709567). Tendo em vista os documentos apresentados pelo autor/recorrente, defiro o requerimento de gratuidade judiciária. Custas e preparo recolhidos pelo réu/recorrente. 3. Em suas razões recursais, o AUTOR alega, em síntese, que o cartão não estava habilitado para uso internacional. Informa que foram realizadas transações atípicas e em poucos minutos durante a madrugada. Aduz que houve falha no dever de segurança pelo Banco (Súmula 479 do STJ). Afirma que há responsabilidade objetiva da instituição financeira. Argumenta que os fatos causaram abalo psicológico e insegurança causados, existindo jurisprudência reconhece danos morais em casos similares. 4. Já o RÉU argumenta pela inexistência de falha na prestação do serviço, diante da ausência de nexo causal entre sua conduta e o dano. Afirma que as compras foram realizadas através de carteira digital "Apple Pay", com tecnologia de pagamento por aproximação devidamente habilitada, sendo necessária autenticação biométrica, PIN ou leitura de íris. Argui que não houve acesso indevido ao sistema interno do banco e que o sistema de segurança funcionou adequadamente. Afirma que o Banco nunca solicita dados pessoais por telefone. Aduz que o cliente agiu sem a devida cautela, pois demorou dias para comunicar o crime às autoridades e não acompanhou as notificações no aplicativo, faltando com boa-fé objetiva. Defende a ocorrência de caso fortuito externo, excludente de sua responsabilidade 5. O réu apresentou contrarrazões ao recurso do autor, requerendo o não provimento do recurso (ID 71709572). O autor não apresentou contrarrazões ao recurso do réu. II. Questão em discussão 6. Cinge-se a controvérsia acerca da existência de falha ou não na prestação de serviços por parte da instituição financeira, e se houve culpa exclusiva da vítima ou de terceiros quanto à realização das transações financeiras não reconhecidas pela consumidor. III. Razões de decidir 7. A relação entabulada entre as partes é nitidamente de consumo, porquanto presentes as figuras do consumidor e do fornecedor de serviços, nos termos dos artigos 2º e 3º da Lei 8.078/90, estando, portanto, sujeita às disposições do Código de Defesa do Consumidor. 8. Narra o autor que "no dia 07/09/2024, estava visitando sua família na Colômbia, quando durante um passeio de Táxi, o mesmo foi roubado a mão armada, os quais levaram o seu aparelho celular. Durante a madrugada, os criminosos conseguiram desbloquear o iPhone do requerente e utilizaram todo o limite do cartão de crédito, apenas usando o cartão virtual do celular, totalizando um prejuízo considerável. Por estar sem celular e em outro País, somente alguns dias depois, que o autor conseguiu contato com uma amiga no Brasil para que ela emprestasse seu número de celular para ele poder assim autenticar e mudar a senha do banco, e só a partir daí descobriu que, poucas horas após o roubo, teve seu limite totalmente utilizado. Já que o banco não permitia acesso sem autenticação via SMS. Destaca-se, que as referidas compras, ocorreram horas após o incidente, por volta das 5h da manhã, foram realizadas três transações indevidas no cartão da ré, de valores altíssimos, conforme extratos que seguem em anexo, transações essas, usando apenas o cartão virtual no aparelho. É de suma importância Excelência, ressaltar que o autor em nenhum momento liberou o cartão Inter para compras no exterior, e para agravar a situação, os meliantes, conseguiram utilizar um limite maior do que o disponível, TUDO ISSO SEM PEDIR A SENHA DO CARTÃO, apenas com a aproximação. Somente no cartão Inter, foi gasto R$ 4.046,90 (Quatro mil e quarenta e seis reais e noventa centavos), cartão o qual o requerente estava se quer usando. Assim que o requerente conseguiu um aparelho celular, o Autor prontamente entrou em contato com a requerida, solicitando o estorno das compras fraudulentas". 9. Das provas coligidas nos autos, verifica-se que foram realizadas no dia 07/09/2024, 3 compras, em valor elevado, em sequência às 05:59, 05:52 e 06:23 (ID 71709550),as quais não foram reconhecidas pelo autor (ID 71709516 - pág.2) . 10. No caso, a fraude resta incontroversa, posto que foram realizadas transações desconhecidas, sucessivas, em curto período, e fora do perfil do consumidor, logo após o roubo do aparelho celular. 11. O banco requerido alega que a transação financeira foi regular, mas não apresenta qualquer elemento de prova que indique que o lançamento referente às compras impugnadas ocorreram com anuência da parte autora (art.373, II, CPC). 12. O conjunto probatório dos autos revela indícios consistentes de ato fraudulento, sugerindo que a fraude tenha se originado de mecanismos, ou falhas internas do sistema do banco requerido, principalmente porque restou comprovado que as compras foram realizadas durante a madrugada, em sequência, e valor incompatível com o perfil do consumidor. 13. A alegação de culpa exclusiva do consumidor deve ser efetivamente comprovada, não podendo ser presumida com base apenas na alegação de que as operações bancárias foram realizadas por meio da carteira digital e mediante token e senha pessoal de responsabilidade do portador. 14. Ressalte-se, ainda, que o uso da carteira digital com token e senha não afasta, por si só, o risco de fraude, pois a segurança presumida das transações feitas com esses cartões não é infalível, cabendo à instituição financeira comprovar sua ausência de responsabilidade. 15. No caso, a comunicação tardia, 03 dias após o fato, não elide a responsabilidade da instituição financeira, pois é irrelevante o fato do autor somente ter comunicado a instituição financeira o roubo do celular 03 dias após o fato, diante da sua responsabilidade objetiva e pelo fato das compras contestadas teriam ocorrido logo após o roubo. 16. "Cabe às administradoras, em parceria com o restante da cadeia de fornecedores do serviço (proprietárias das bandeiras, adquirentes e estabelecimentos comerciais), a verificação da idoneidade das compras realizadas com cartões magnéticos, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido roubo ou furto."( RECURSO ESPECIAL Nº 1.058.221 - PR (2008/0104709-0 - RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI - STJ )) 17. Precedente das Turmas Recursais: (Acórdão 1959942, 0706119-18.2024.8.07.0003, Relator(a): ANTONIO FERNANDES DA LUZ, PRIMEIRA TURMA RECURSAL, data de julgamento: 24/01/2025, publicado no DJe: 07/02/2025.); (Acórdão 1932190, 0725112-92.2023.8.07.0020, Relator(a): FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, PRIMEIRA TURMA RECURSAL, data de julgamento: 11/10/2024, publicado no DJe: 17/10/2024.); (Acórdão 1886014, 0701566-16.2024.8.07.0006, Relator(a): RITA DE CÁSSIA DE CERQUEIRA LIMA ROCHA, PRIMEIRA TURMA RECURSAL, data de julgamento: 28/06/2024, publicado no DJe: 16/07/2024.) 18. Assim, impõe-se a reforma da sentença para determinar o ressarcimento integral dos valores pagos indevidamente pelo autor (ID 71709517). 19. O direito à compensação por dano moral surge de condutas que ofendam direitos da personalidade, bens tutelados que, embora não tenham conteúdo patrimonial, mas possuem extrema relevância conferida pelo ordenamento jurídico, quais sejam: higidez física e psicológica, vida, liberdade (física e de pensamento), privacidade, honra, imagem, nome, direitos morais do autor de obra intelectual (REsp. 1.406.245/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 24/11/2020, DJe 10/02/2021). 20. Na lição de Sérgio Cavalieri Filho, "dano moral é a lesão de bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima" (in Programa de Responsabilidade Civil, 2ª Edição, Malheiros Editores, p. 78). 21. Embora, no caso seja inegável a falha na prestação dos serviços por parte do réu, a situação vivenciada pelo autor, ora recorrido, não ultrapassou as fronteiras do mero aborrecimento, não havendo falar em dano moral. 22. Com efeito, a recusa inicial em cancelar as compras realizadas fraudulentamente não é suficiente, por si só, para caracterizar ofensa extrapatrimonial. O inadimplemento contratual não enseja compensação por dano moral in repsa. 23. Para que restasse caracterizado o dano moral, necessária seria a prova do sofrimento, da dor, em razão de eventual repercussão na honra e boa fama do autor, o que não foi demonstrado. IV. Dispositivo e tese 24. Recurso do autor conhecido e parcialmente provido para determinar a restituição da quantia de R$ 4.046,90, corrigidos monetariamente desde o pagamento, com juros de mora a contar da citação. Vencedor o recorrente, mesmo que em parte, não há condenação ao pagamento das custas e honorários de sucumbência. 25. Recurso do réu conhecido e improvido. Custas recolhidas. Sem condenação em honorários, ante a ausência de contrarrazões. 26 A súmula de julgamento servirá de acórdão, conforme regra do art. 46 da Lei n. 9.099/95.