Maria Neusa Da Conceicao x Banco Daycoval S/A e outros

Número do Processo: 0031011-78.2021.8.17.2001

📋 Detalhes do Processo

Tribunal: TJPE
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Grau: 1º Grau
Órgão: Seção A da 26ª Vara Cível da Capital
Última atualização encontrada em 17 de junho de 2025.

Intimações e Editais

  1. 17/06/2025 - Intimação
    Órgão: Seção A da 26ª Vara Cível da Capital | Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
    Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção A da 26ª Vara Cível da Capital Avenida Desembargador Guerra Barreto - Fórum do Recife, S/N, Ilha Joana Bezerra, RECIFE - PE - CEP: 50080-900 - F:(81) 31810228 PROCESSO Nº 0031011-78.2021.8.17.2001 AUTORA: MARIA NEUSA DA CONCEICAO RÉUS: JC PROMOTORIA DE VENDAS LTDA, BUSINESS PROMOTORA E ASSISTENCIA FINANCEIRA LTDA, BANCO DAYCOVAL S/A, CLAUDIO LUIS SANTOS DA CONCEICAO SENTENÇA Relatório MARIA NEUSA DA CONCEIÇÃO, devidamente já qualificada nos autos, aforou AÇÃO ORDINÁRIA em face de JC PROMOTORIA DE VENDAS LTDA, BUSINESS PROMOTORA E ASSISTÊNCIA FINANCEIRA LTDA e BANCO DAYCOVAL S/A, também qualificadas, dizendo-se com fulcro no Código Civil e na Lei Consumerista. Reza a inicial que a Autora, na qualidade de pensionista, foi induzida a celebrar um contrato de empréstimo consignado com o Banco Daycoval S/A, no valor de R$ 49.216,12 -, a ser adimplido em 96(noventa e seis) parcelas mensais de R$ 1.205,00 -, debitadas diretamente de seu benefício previdenciário. Relata que, seguindo orientação da primeira Ré, JC Promotoria de Vendas LTDA, repassou a integralidade do valor do empréstimo para a segunda Ré, Business Promotora e Assistência Financeira LTDA, sob a promessa de que receberia pagamentos mensais que não apenas quitariam as parcelas do empréstimo, mas também lhe proporcionariam um lucro. Sustenta que, a partir de maio de 2020, as empresas Rés cessaram os pagamentos prometidos, enquanto os descontos do empréstimo consignado continuaram a ser efetuados em sua pensão, causando-lhe graves prejuízos financeiros e abalo moral. Com isso, requereu, em sede de tutela provisória de urgência, a suspensão imediata dos descontos em sua folha de pagamento, pugnando, no mérito, pela rescisão do contrato de empréstimo, pela condenação das Rés na devolução em dobro dos valores descontados, na assunção da dívida perante o Banco Daycoval S/A e no pagamento de indenização por danos morais. O pleito antecipatório de tutela de urgência foi indeferido sob o ID de nº 80326059. Citado, o BANCO DAYCOVAL S/A apresentou contestação (ID de nº 85596434), arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva e, no mérito, sustentou a regularidade da contratação do empréstimo consignado, afirmando que o crédito foi devidamente liberado na conta de titularidade da Autora, não tendo participado de qualquer negociação subsequente entre aquela e as demais Corrés. Alegou que a transferência de valores a terceiros foi ato de exclusiva responsabilidade da Autora, tendo o Banco cumprido integralmente sua obrigação contratual. Citada pela via postal, a Corré BUSINESS PROMOTORA E ASSISTÊNCIA FINANCEIRA LTDA deixou de apresentar defesa. A seu turno, as tentativas de citação da Corré JC PROMOTORIA DE VENDAS LTDA restaram infrutíferas, razão por que deferido o pedido de inclusão de seu sócio CLÁUDIO LUIS SANTOS DA CONCEIÇÃO no polo passivo, sucedendo-se com sua citação por edital. Transcorrido o prazo legal sem manifestação do Corréu pessoa física, foi decretada a sua revelia e nomeada a Defensoria Pública como sua Curadora Especial, a qual apresentou contestação por negativa geral (ID de n° 199807483). Autos conclusos. É o que importa relatar. Julgamento Antecipado O processo em questão comporta o julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inc. I, do Código Procedimental Cível, haja vista que a prova documental coligida aos autos é suficiente para dirimir a controvérsia. Não é demais dizer que vigora no Direito Processual pátrio o princípio da persuasão racional, segundo o qual a análise da conveniência e necessidade de instrução probatória cabe ao magistrado, que somente autorizará a produção desta ou daquela prova se por outros meios não estiver convencido da verdade dos fatos, o que não é o caso dos autos, conforme adiante se demonstrará. Passo, portanto, ao julgamento. Preliminar A preliminar de ilegitimidade passiva 'ad causam' arguida pelo Banco Daycoval S/A merece acolhimento. Afirmo isso porque a própria narrativa autoral, corroborada pelos documentos juntados, evidencia que a relação jurídica entre a Demandante e o Banco Daycoval S/A se limitou à celebração de um contrato de empréstimo consignado, tendo a instituição financeira Ré cumprido sua parte na avença, liberando o crédito solicitado. Não vislumbro nos autos, contudo, qualquer elemento de prova que demonstre a participação, anuência ou conluio do Banco Daycoval S/A no segundo e distinto negócio jurídico, celebrado pela Autora com as Corrés JC Promotoria de Vendas LTDA e Business Promotora e Assistência Financeira LTDA. Deveras, penso que foi por sua própria vontade, ainda que viciada por promessas enganosas, que a Requerente decidiu transferir os recursos a terceiros, assumindo o risco inerente a uma operação de "investimento" de altíssimo risco e de legalidade duvidosa. Assim, tenho que, agindo a instituição bancária como mero agente financeiro, não pode ela ser responsabilizada por atos e decisões posteriores e unilaterais de seus clientes. Acolho, portanto, a preliminar arguida, para julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, em relação ao Corréu Banco Daycoval S/A, com fundamento no art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil. Enfrento o mérito. Discussão Cuida-se de pretensão rescisória e reparatória de danos, fundada em ato ilícito, de conhecida possibilidade jurídica, aviada entre Partes com legitimidade ‘ad causam’ e interesse de agir, porquanto aforada por quem supostamente se houve lesado em face dos indigitados causadores do prejuízo. Pois bem. De logo, anoto a existência de relação de consumo na presente lide, uma vez que Autora e Réus se enquadram perfeitamente nos conceitos legais de consumidor e fornecedor de serviço, devendo a lide ser analisada à luz do diploma consumerista. Fixada essa premissa, observo que, de acordo com os fatos narrados na inicial e não infirmados por provas em sentido contrário, a Autora foi induzida a celebrar contrato de empréstimo com o Banco Daycoval, para então transferir a integralidade dos valores recebidos às Corrés, sob a promessa de que essas efetuariam pagamentos mensais suficientes para quitar o empréstimo e ainda gerar lucro. Nesse contexto, penso que a revelia dos Réus autorizam a presunção de veracidade dos fatos articulados na petição inicial, conforme reza o art. 344, do CPC, a qual é reforçada não só pelo teor verossímil da narrativa da Autora, mas também pela natureza do negócio jurídico documentado sob o ID de nº 79851658, claramente lesivo e desconforme com os princípios da boa-fé objetiva que devem nortear toda e qualquer relação contratual. Com efeito, o cenário descrito revela, com clareza, a prática de conduta ardilosa por parte das Demandadas, que se utilizaram da vulnerabilidade da Requerente, pessoa idosa, pensionista e provavelmente pouco familiarizada com operações financeiras complexas, para induzi-la à contratação de empréstimo consignado e, em seguida, obter dela a integralidade dos valores, sob o pretexto de operação vantajosa, cujos termos nunca se concretizaram. Deveras, é evidente a má-fé da parte Requerida, que abusou da confiança da Consumidora e induziu-a a erro mediante a promessa de quitação do empréstimo e lucro adicional, sem qualquer formalização contratual idônea e sem garantias efetivas, revelando, pois, um esquema de captação dolosa de recursos, cuja única finalidade foi o enriquecimento ilícito das empresas envolvidas. O caso, pois, é de patente vício de consentimento (erro substancial induzido por dolo), nos termos dos arts. 138 e 145, do Código Civil, o que acarreta a nulidade do negócio jurídico entabulado entre as Partes, além de configurar ato ilícito, nos termos do art. 186, do mesmo diploma legal. Ressalto, ademais, que, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, a conduta das Rés é ainda mais reprovável, já que constitui prática comercial abusiva, na medida em que se aproveitaram da ignorância da consumidora hipervulnerável, tendo em vista sua idade e conhecimento, para impor-lhe seus produtos e/ou serviços, o que é vedado pelo art. 39, inc. IV, daquele diploma protetivo. Destarte, em razão da conduta fraudulenta, penso que resta maculado o negócio jurídico, razão por que cabível a sua anulação e, como consequência, o retorno das Partes ao 'status quo ante', o que, no presente caso, implica a rescisão do contrato de empréstimo e a consequente restituição integral dos prejuízos experimentados pela Demandante. Entendo, contudo, que o ressarcimento deve ser realizado em sua forma simples, eis que, malgrado a conduta manifestamente contrária à boa-fé, a situação fática dos autos não se amolda à hipótese de cobrança indevida a que alude a norma estampada no art. 42, parágrafo único, do CDC. Ora, os valores cujo ressarcimento se busca não foram cobrados diretamente pelos Corréus (JC Promotoria, Business Promotora ou Cláudio Luís). Na realidade, os pagamentos foram efetuados pela Demandante ao Banco Daycoval S/A, sendo certo que, do ponto de vista da relação contratual com essa instituição financeira, a cobrança era, em si, devida, pois decorria de um contrato de mútuo válido e eficaz. Assim, a condenação ora imposta não tem como fundamento uma "cobrança indevida" perpetrada pelas Rés, mas sim o dever de reparar o dano material (perdas e danos) que sua conduta ilícita — a fraude e o subsequente inadimplemento — causou à Demandante. É dizer: a obrigação de restituir os valores das parcelas do empréstimo visa recompor o patrimônio da vítima e reconduzi-la ao 'status quo ante', como se o negócio fraudulento jamais tivesse existido, de modo que se trata de uma indenização por dano emergente, e não da sanção específica prevista no art. 42 do CDC. Por fim, no tocante à pretensão indenizatória calcada em dano moral, entendo que não assiste razão à Promovente. Isso porque, embora a situação vivenciada pela Autora seja, sem dúvida, fonte de frustração e transtornos financeiros, deve ser ponderado que ela, voluntariamente, aderiu a uma proposta de investimento de altíssimo risco, com promessas de lucros extraordinários e incompatíveis com o mercado financeiro regular. Deveras, ao contratar um empréstimo em seu nome para repassar os valores a terceiros, entendo que a Demandante assumiu um risco significativo, ainda que na expectativa de um ganho fácil, razão por que penso que a situação, embora lamentável, não se traduz em uma ofensa injusta à dignidade da Consumidora, mas sim na consequência de uma má decisão de negócio jurídico frustrado. Assim, por entender que o dissabor e a angústia decorrentes da perda financeira, neste contexto, configuram-se como percalços do negócio malsucedido, não ultrapassando a esfera do mero aborrecimento cotidiano, reputo injustificada a reparação pecuniária a título de danos morais. Decisão ISTO POSTO, na esteira da fundamentação supra e do mais visto nos autos, JULGO extinto o processo, sem resolução de mérito, relativamente ao Corréu Banco Daycoval S/A, o que FAÇO com arrimo no art. 487, inc. VI, do Código de Processo Civil. Pelo princípio da causalidade, CONDENO a Autora no pagamento de verba honorária, que FIXO no importe de 10%(dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com arrimo no art. 85, § 2º, da Lei de Ritos Cíveis, porém SUSPENDO a sua exigibilidade, por ter a Demandante litigado sob o benefício da justiça gratuita. Já em relação aos Corréus remanescentes, JULGO procedente em parte a pretensão embutida na atrial, precipuamente para: a) DECLARAR nulo o negócio jurídico controvertido (contrato de empréstimo de ID nº 79851658) e o débito dele originado; b) CONDENAR os Demandados, solidariamente, a restituir à Autora, na forma simples, a integralidade dos valores comprovadamente descontados de sua pensão para pagamento das parcelas do empréstimo consignado junto ao Banco Daycoval S/A, a partir do mês de maio de 2020 até a quitação, devendo sobre o montante incidir correção monetária pela Tabela ENCOGE desde a data do evento danoso (data de cada desconto) até o dia 27/08/2024, e, a partir do dia 28/08/2024, pelo IPCA, além de juros de mora pela Taxa SELIC, desde a citação, observado o disposto no art. 406, § 1º, do Código Civil. Com isso, DOU resolução de mérito ao processo, o que FAÇO com suporte no art. 487, inc. I, 1ª parte, do Código de Ritos Cíveis. Ante a sucumbência parcial e, uma vez vedada a compensação de honorários, CONDENO ambas as Partes no pagamento recíproco de tal verba e no rateio das custas processuais. Assim, CONDENO esses Réus, solidariamente, no pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da Autora, que FIXO em 10%(dez por cento) sobre o valor total da condenação (proveito econômico obtido), nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Outrossim, CONDENO a Parte autora no pagamento de honorários advocatícios em favor da Curadoria Especial (Defensoria Pública), que FIXO em 10%(dez por cento) sobre o valor do proveito econômico obtido pelos Réus (valor do pedido de dano moral indeferido, ou seja, R$ 20.000,00), mas que SOBRESTO a exigibilidade em razão do benefício da justiça gratuita que lhe foi concedido. IMPONHO, ainda, aos Promovidos, de forma 'pro-rata', o recolhimento de metade das custas processuais, isso no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de comunicação ao Comitê Gestor de Arrecadação para providências legais, estando, de logo, a Diretoria Cível autorizada a expedir o respectivo ofício na hipótese de inércia do devedor. ADVIRTO as Partes, desde já, de que a oposição de embargos de declaração manifestamente protelatórios, em especial os que visem unicamente a reanálise de provas e/ou o rejulgamento da causa e/ou arbitramento de honorários, será alvo de sanção, na forma do art. 1.026, § 2º, do CPC, haja vista o dever de cooperação e lealdade imposto a todos os atores processuais pelo art. 6º, da Lei de Ritos. DETERMINO que, transitada em julgado, arquivem-se os autos, ressalvada eventual manifestação executória. P.R.I.C. Recife, 16 de junho de 2025. Dia de São Ciro. Bel. DAMIÃO SEVERIANO DE SOUSA Juiz de Direito
Entre na sua conta ou crie uma para continuar usando o site
Faça login para continuar navegando gratuitamente.
Google Entrar com Google

ou