Processo nº 00304053220244058300
Número do Processo:
0030405-32.2024.4.05.8300
📋 Detalhes do Processo
Tribunal:
TRF5
Classe:
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Grau:
1º Grau
Órgão:
29ª Vara Federal PE
Última atualização encontrada em
30 de
junho
de 2025.
Intimações e Editais
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30/06/2025 - IntimaçãoÓrgão: 29ª Vara Federal PE | Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVELSENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de ação especial cível ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e do BANCO PAN S.A., com vistas à declaração de inexistência de débito oriundo do contrato de empréstimo consignado em seu benefício previdenciário, restituição das parcelas descontadas e reparação por danos morais. Narra a parte demandante que é beneficiária do INSS e descobriu que foi feito empréstimo consignado junto ao banco réu sem a sua autorização, cujas parcelas são descontadas diretamente no seu benefício, com as seguintes características: Contrato n.º 0229744345188 Modalidade: cartão de crédito consignado Data da contratação: 24/02/2021 Limite de cartão: R$ 1.760,00 Reserva atualizado: R$ 55,00 Tutela de urgência indeferida. Regularmente citados, os réus apresentaram contestação. Vieram-me os autos conclusos. II – FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARMENTE Da incompetência do JEF Suscita a parte demandada a incompetência do juízo, ante a necessidade de produção de prova pericial e a suposta incompatibilidade desta com o rito dos juizados especiais federais. Todavia, conforme remansosa jurisprudência, inexiste a alegada restrição à produção da prova pericial no JEF, motivo pelo qual rejeito a preliminar. Da ilegitimidade passiva do INSS Suscita a autarquia previdenciária preliminar de ilegitimidade passiva, ao argumento de que a contratação de empréstimos consignados é feita diretamente com a instituição financeira, de sorte que não é possível imputar-lhe qualquer responsabilidade pela atuação eventualmente irregular de tais entidades. Da narrativa da inicial, verifica-se que a parte autora imputa ao INSS, assim como à instituição financeira, a responsabilidade pelos danos morais e materiais que alega suportar. Ora, se a parte autora, ao expor a pretensão na exordial, sustenta a responsabilidade do INSS pelos fatos supostamente lesivos, a apreciação acerca da existência, ou não, dessa responsabilidade, é matéria afeta ao mérito da lide e não às condições da ação. Ademais, a TNU firmou a tese (Tema 183) de que “o INSS pode ser civilmente responsabilizado por danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, se demonstrada negligência, por omissão injustificada no desempenho do dever de fiscalização, se os “empréstimos consignados” forem concedidos, de forma fraudulenta, por instituições financeiras distintas daquelas responsáveis pelo pagamento dos benefícios previdenciários. A responsabilidade do INSS, nessa hipótese, é subsidiária em relação à responsabilidade civil da instituição financeira.” No caso, como a instituição credora é diversa daquela que paga o benefício, cumpre rejeitar a preliminar. Por essa razão, rejeito a preliminar arguida. Da inépcia da inicial Sustentou a parte demandada a inépcia da petição inicial. Argumentou que a parte demandante não formulara reclamações nos canais de atendimento. Afirmou que não foram apresentadas provas mínimas do seu direito. Afirmou ainda que, por se tratar de demanda que tem por objeto revisão contratual, o(a) demandante deveria descrever as obrigações contratuais que se pretenderia controverter. Pois bem. Observa-se que na petição inicial é possível identificar pedidos determinados e causa de pedir; verifica-se conclusão lógica da narrativa dos fatos; os pedidos são compatíveis entre si (art. 330, § 1º, do CPC). Nesse sentido, rejeita-se a argumentação de inépcia. Quanto à argumentação de ausência de prova, trata-se de questão a ser examinada no momento oportuno: exame de mérito. Por outra perspectiva, não se trata de revisional de contrato, mas de demanda que pretende a invalidação de contrato (o cancelamento), de sorte que somente a menção ou indicação da avença a ser invalidada é suficiente à apreciação dos pedidos. Rejeito, pois, a preliminar de inépcia. Da ausência de condição da ação Sustenta o banco réu que a parte não tem interesse de agir pois não tentou solucionar o problema na seara administrativa. Todavia, no caso concreto, o prévio requerimento administrativo não constitui requisito para a comprovação do interesse de agir, consoante o disposto no artigo 5º, inc. XXXV da Constituição da República, que resguarda o direito de ação, garantindo a todos o poder de deduzir pretensão em juízo para obtenção da tutela jurisdicional adequada. Outrossim, desnecessário tal requerimento visto que o banco réu contestou a ação, caracterizando, portanto, a pretensão resistida. Do pedido de gratuidade da justiça Para efeito de concessão do benefício da gratuidade judicial, na linha de precedentes deste juízo, por medida de coerência – considerados os objetos das ações que tramitam perante esta unidade jurisdicional – e como parâmetro moralizador, tem sido adotado o montante correspondente ao teto dos benefícios vinculados ao Regime Geral da Previdência Social – RGPS. No caso, aquele patamar não foi superado, de sorte que o deferimento da gratuidade processual se impõe. Ressalto, contudo, que, nos termos do disposto no art. 54 da Lei 9.099/95, em primeiro grau de jurisdição, o processo perante os Juizados Especiais Federais é isento de custas, taxas ou despesas, de modo que caberá ao douto juiz-relator a quem for distribuído eventual recurso inominado, o exame definitivo da questão. Prejudicial de mérito: prescrição Rejeito a prejudicial de ocorrência de prescrição, porque, pretendendo-se a declaração da inexistência de relação contratual referente a empréstimo consignado, o prazo prescricional, a teor da jurisprudência do STJ, tem início apenas após o desconto da última parcela, o que ainda não ocorreu no caso dos autos. Observe-se: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. FATO DO SERVIÇO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TERMO INICIAL APLICÁVEL À PRETENSÃO RESSARCITÓRIA ORIUNDA DE FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ÚLTIMO DESCONTO INDEVIDO. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de pretensão de repetição de indébito decorrente de descontos indevidos, por falta de contratação de empréstimo com a instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo prescricional do art. 27 do CDC. 2. O termo inicial do prazo prescricional da pretensão de repetição do indébito relativo a desconto de benefício previdenciário é a data do último desconto indevido. Precedentes. 3. O entendimento adotado pelo acórdão recorrido coincide com a jurisprudência assente desta Corte Superior, circunstância que atrai a incidência da Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.720.909/MS, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 26/10/2020, DJe de 24/11/2020) Aplica-se, portanto, a prescrição quinquenal do art. 27 do CDC às instituições financeiras. O mesmo prazo extintivo é aplicável à autarquia previdenciária, todavia, fundado no art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Nesse sentido, cumpre pronunciar a prescrição dos valores descontados anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da demanda. DO MÉRITO Julga-se o processo no estado em que se encontra, conhecendo diretamente dos pedidos, na medida em que a questão de mérito, sendo de fato e de direito, prescinde da produção de outras provas. O cerne da demanda consiste na análise da legitimidade do contrato questionado na inicial. Para tanto, a parte autora afirma não ter solicitado, nem usufruído, do cartão de crédito consignado questionado nesta demanda. Alega que foram efetuados descontos indevidos em seu benefício, referentes à suposta contratação de cartão de crédito, na modalidade RMC, a partir de 01/2023, que desconhece ou sequer forneceu autorização à instituição bancária. Nos casos de contrato de cartão de crédito consignado tem-se que a instituição financeira fornece um cartão de crédito ao cliente, por meio do qual é possível a realização de saques e compras e, para fins de pagamento da fatura, existe a consignação de um valor mínimo no benefício/contracheque do contratante. Saliente-se que o desconto da reserva de margem consignável apenas ocorre quando há consumo, devendo ser ressaltado, ainda, que é possível ao cliente efetuar pagamento complementar, a fim de evitar que os descontos perdurem por um período superior ao desejado. Para fins de comprovar a verossimilhança de suas alegações, apresentou documentação demonstrando os fatos narrados na inicial, a saber, histórico de crédito consignado, que aponta a inclusão de cartão de crédito – RMC, com valor reservado de R$ 42,73. A instituição financeira demandada, ao seu turno, acostou documentos que evidenciam a ocorrência da contratação, com a assinatura eletrônica da parte autora mediante selfie realizada presencialmente em posto de representação da instituição ora ré e documento de identificação pessoal (Id. 55350299 – fls. 2 e 3). Ainda, o banco juntou ao feito, além da cédula contratual, as faturas do cartão de crédito que originaram os descontos a título de reserva de margem consignável. De tais documentos é possível verificar o efetivo uso do cartão contratado, por meio de diversas compras (Id. 55350300) e realização de um saque no valor de R$ 1.166,00, conforme documento TED (Id. 55350304). Intimada a se manifestar, a parte autora juntou aos autos os extratos bancários de conta de sua titularidade dos meses de outubro a dezembro de 2022, onde no mês de novembro, no dia 23, é possível verificar o recebimento do valor de R$ 1.166,00 reais, o qual foi tranferido integralmente no mesmo dia (Id. 71195104). Além disso, ao examinar o contrato apresentado, vê-se que as cláusulas contratuais são claras e permitem a correta análise pelo contratante, não havendo que se falar em vício de vontade. Ademais, o uso do cartão pela parte autora evidencia a sua ciência da contratação, não sendo possível, agora, invalidar o contrato com base em alegado vício de consentimento, se houve a efetiva fruição dos serviços contratados. Desta feita, considerando o fato de que o banco réu comprovou a legitimidade dos descontos realizados, entendo que inexiste ilícito na conduta praticada pelo banco réu, e, por conseguinte, não há caracterização de dano moral ou material, não restando a este juízo outro caminho que não seja o da improcedência dos pedidos. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, nos termos do art. 487, I, do CPC. Defiro os benefícios da justiça gratuita. Sem custas e sem honorários advocatícios, verbas incabíveis na primeira instância dos Juizados Especiais Federais (art. 55 da Lei n.º 9.099/95). Transitada em julgado, arquivem-se com as cautelas de estilo. Registre-se. Publique-se. Intimem-se. Jaboatão dos Guararapes (PE), data da assinatura eletrônica. FLÁVIA TAVARES DANTAS Juíza Federal